Soberania Popular X Coronelismo Financeiro

José Antônio MoroniJosé Moroni

José Antônio MoroniMuito se fala na Reforma política, mesmo que de forma limitada, focando apenas no seu aspecto eleitoral. Nesta lógica não se discute como alicerçar o poder na soberania popular e não apenas no poder da representação. Nem como fortalecer mecanismos de deliberação direta pela população e a participação popular, como democratizar a informação e a comunicação, e muito menos a democratização do sistema de Justiça (Poder Judiciário, Ministério Público, Defensoria Pública, ouvidorias e os aparatos de segurança, especialmente as policias).

Mesmo assim, avançamos pouco no que diz respeito à democratização do processo eleitoral. Temos sim a liberdade partidária – que se confunde com a promiscuidade na fundação de partidos, com vistas as negociatas do tempo de TV e rádios – e eleições periódicas. Entretanto, se olharmos o nosso sistema eleitoral, percebemos que o poder emanado desse sistema é hereditário, vitalício, arcaico, machista, homofóbico e racista, para sustentar nos espaços de poder uma determinada classe, que entrega os anéis para não perder os dedos.

São três os fatores principais que inviabilizam a democratização do processo eleitoral: o poder econômico, a forma como escolhemos os/as representantes e o poder da mídia. Por democratização do processo eleitoral entendemos tornar mais equilibradas as condições, regras e normas das disputas eleitorais. Pelas regras atuais temos justamente o oposto.

O poder econômico não apenas distorce como também inviabiliza a soberania popular. Basta analisar o financiamento das campanhas eleitorais e a desigualdade abissal entre as candidaturas. Essa desigualdade é o que determina os resultados eleitorais (com cada vez menos exceções, que apenas confirmam a regra), comprometendo o caráter democrático das eleições. Nesse sentido, o processo eleitoral reproduz e perpetua a desigualdade presente na sociedade.

Nas eleições para deputados/as de 2010 e 2014, as candidaturas eleitas (9,89 % em 2010 e 8,84% em 2014) utilizaram 55,34% e 55,07% dos recursos totais de campanha, respectivamente. Em outras palavras: menos de 10% do total das candidaturas eleitas consumiram mais da metade de todos os recursos disponíveis. Com raras exceções, se elege quem tem muito dinheiro.

Outro elemento essencial da não democratização do processo eleitoral é a forma como elegemos os/as nossos/as representantes para o Parlamento. Temos um sistema de lista aberta, onde os partidos apresentam suas candidaturas (não se sabe ao certo quais os critérios usados na escolha) e o/a eleitor/a vota numa delas. Parece algo democrático, mas não é, por varias razões.

Uma delas é que as diversas candidaturas não têm as mesmas condições de disputas (cada candidato faz seus acordos com os financiadores privados, que apresentam a conta depois). Como cada candidatura busca seu próprio financiamento, a tendência é que este financiamento reproduza os preconceitos e as relações de poder existentes na sociedade.

Aí esta uma das explicações de porque “se muda” para manter as coisas onde sempre estiveram: se tirou da política o seu poder de transformações e lhe concedeu o poder de conservação. Desta forma, não há lugar para a representação dos sujeitos sociais e políticos que não estão no centro da engrenagem – mulheres, população negra, povos indígenas, juventude, pessoas homoafetivas -, a não ser que pertençam às famílias e grupos que sempre estiveram no poder, com as exceções de praxe.

Para radicalizar estas mazelas surgem as proposta do distritão, do distrital puro, do distrital misto. Piadas de mal gosto que beiram ao deboche, basta ver o que acontece nos países que implementaram. O distritão, por exemplo, existe em dois países, Afeganistão e Jordania.

Para essa engrenagem funcionar por tanto tempo, e sem grandes fissuras, é necessário que se tenha um aparato que a legitime e mantenha os questionamentos domesticados. Quem cumpre esse papel hoje no Brasil são as diferentes mídias, que por sua vez são controladas por oito famílias que se sustentam economicamente graças à publicidade do Estado e de grupos empresariais que financiam as eleições.

Temos alguma dúvida sobre quem está ganhando esse jogo de tensão entre a soberania popular e o coronelismo financeiro? Como desatar os nós de “nossa democracia”?

Com essa avaliação de como funciona o nosso sistema político e quais questões devem ser enfrentadas, os movimentos que se organizam de diferentes formas formularam duas grandes estratégias políticas que se complementam, mas apresentam horizontes políticos diversos. Uma é a Iniciativa Popular pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas e a outra é o Plebiscito Popular pela Convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político.

A Iniciativa Popular, organizada pela Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, se vale de um instrumento da democracia direta previsto na Constituição. Ela é uma estratégia que se propõe atuar em um tempo político mais curto, mobilizando a sociedade para forçar o Congresso a aprovar uma reforma política que responda aos anseios de amplos segmentos da sociedade. É possível conhecer a íntegra da proposta da Iniciativa Popular em www.reformapoliticademocratica.com.br.

Já o plebiscito popular abarca três estratégias: trabalho de base, formação política e discussão ampla com a sociedade. Busca-se debater a institucionalidade que temos e a que queremos (sistema político). O lócus político para se fazer esse debate é a convocação de uma Assembleia Constituinte Exclusiva e Soberana. Nesse sentido, o horizonte político do plebiscito popular é de longo prazo, para acumular forças na sociedade para poder provocar as rupturas que precisamos. Para ter acesso ao debate do plebiscito, ver http://plebiscitoconstituinte.org.br/.

Não vemos contradição entre as duas estratégias. Ambas procuram criar novas institucionalidades capazes de provocar as transformações estruturais que tanto precisamos. Ambas procuram mudar o resultado do jogo. Que ganhe a SOBERANIA POPULAR.

 

*José Antônio Moroni é membro do INESC e da Plataforma dos Movimentos Sociais da Reforma do Sistema Político.

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