20 de abril de 2024

A verdadeira recriação do Ministério da Cultura

Quem acompanha as políticas e os programas praticados pelo Ministério da Cultura desde o início do governo Lula -mesmo levando em conta os desvios de percurso entre 2011 e 2014 e a redução orçamentária dos últimos anos-, não se surpreendeu com as reações contra a extinção do MinC.

Tristemente, mais uma vez se subestimou a cultura e a credibilidade conquistada por seu ministério no Brasil e no exterior. Os desafios que ao MinC se impõem exigem a força institucional e a autonomia de gestão que só um ministério tem.

Desvalorizar a importância da cultura para o país e, com a extinção da pasta, intentar neutralizar manifestações contrárias ao golpe sofrido pela presidente Dilma Rousseff não surtiram o efeito desejado. Tanto que o governo ilegítimo teve que recuar e recriar o ministério.

A resposta para esse insucesso está nas reações ainda em curso pelo país. Tal fenômeno precisa ser explicado. Há um certo ineditismo que não nos pode escapar.

Impressiona o quão diverso é o universo dos que reivindicaram a volta do MinC. Não me recordo de ter visto tamanha reação à extinção de um órgão federal. Uma reação que vai muito além de um movimento que parte de dentro, como algo que representa apenas o desejo de servidores da pasta.

O MinC possui hoje um corpo técnico que, apesar dos baixos salários, tem compromisso e compreensão da relevância social da política pública que ajuda a desenvolver.

O movimento, entretanto, contou com uma participação muito mais ampla. Uma multidão está tomando conta de unidades do MinC em mais de 20 Estados. Atores culturais se manifestam em todo o Brasil e no exterior, contra o golpe e contra o recuo nas políticas postas em prática nos anos anteriores.

Trata-se de um fenômeno político muito curioso, especialmente quando se pensa nos parcos recursos investidos no MinC. A explicação para tal deve ser buscada na observação e análise das práticas do ministério nestes últimos 13 anos, no legado de seus projetos e ações.

O MinC nasceu em 1985, sob o signo da democracia. Não poderia ser diferente -apenas em solo democrático a política cultural pode vicejar. Quando há um golpe em curso, como agora, o setor se enfraquece.

O ministério amadureceu e se consolidou ao democratizar suas ações, pondo em prática uma postura republicana, sem partidarismo, sem interdições nem privilégios, buscando melhor atender as necessidades e demandas culturais em todo o território nacional. O MinC tornou-se o MinC de tanta gente pela abrangência e diversidade de suas políticas.

Por isso, artistas, trabalhadores, produtores, empreendedores e ativistas de todos os níveis e de todas as áreas estão mobilizados para defender a continuidade das políticas públicas construídas nesses anos.

A partir de 2003, o MinC foi adquirindo relevância para o desenvolvimento cultural e importância social. Alargou sua visão e seu escopo conceitual, ampliou sua compreensão acerca da arte e da diversidade cultural brasileira.

Com a gestão iniciada pelo ministro Gilberto Gil e pelo presidente Lula, o MinC superou sua condição de balcão de negócios e mecanismo de cooptação e passou a discutir políticas culturais fora dos gabinetes.

Foi somente nesse momento que as políticas públicas de cultura passaram a estar presentes nos pontos vitais da cultura brasileira. O MinC passou a incluir quem nunca havia tido acesso a políticas públicas de cultura.

Cultura e democracia são indissociáveis. Essa é a maior lição. Não por acaso, o campo da cultura tornou-se linha de frente da luta contra o golpe e contra o retrocesso político e social que uma minoria pretende impor ao país.

JUCA FERREIRA, sociólogo, foi ministro da Cultura (governos Lula e Dilma) e secretário municipal da cultura de São Paulo (gestão de Fernando Haddad)

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