Opinião: precisamos conversar sobre a Previdência

Cerca de 600 mil brasileiros foram às ruas no dia 15 de março, uma quarta-feira, para protestar contra as reformas da Previdência e trabalhista, propostas pelo governo de Michel Temer. Em diversas capitais, como São Paulo, onde o protesto reuniu 250 mil pessoas, os transportes públicos foram afetados e vias foram interditadas. Em outros estados, como Mato Grosso, professores e agentes prisionais pararam. Os atos mostram a preocupação legítima da população com o tema. A mobilização, no entanto, não pode frear o debate. Ao contrário, deve ser incorporada a ele, para que o Executivo e o Legislativo expliquem como as discussões avançam no Congresso Nacional.

Manifestação na Avenida Paulista. O radicalismo só atrapalha o debate (Foto: Marlene Bergamo/Folhapress)

A livre manifestação é uma das belezas da democracia. Mas a voz das ruas evidenciou um olhar turvo sobre o tema. Em diversas capitais, sindicalistas e servidores públicos empunhavam faixas com os dizeres: “Reaja ou morra de tanto trabalhar” ou “O déficit da Previdência é uma mentira inventada por Temer para ampliar o lucro dos bancos”. São frases típicas da “pós-verdade”, que mostram que o governo está perdendo a guerra para a desinformação. No ano passado, o rombo nas contas da Previdência dobrou e atingiu um recorde de R$ 150 bilhões.

A indisposição ao diálogo também preocupa. Os protestos foram palco para discursos  populistas, desonestos e intolerantes. “Nós não queremos discutir a proposta, nós queremos que o governo retire a proposta de reforma trabalhista, previdenciária e de terceirização”, disse Vagner Freitas, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), na Avenida Paulista. O ex-presidente Lula disse que, em vez de fazer a reforma, é preciso fazer a economia voltar a crescer – como se a reforma da Previdência não fosse a condição básica para a retomada do crescimento.

Lula aparentemente esqueceu que sua sucessora Dilma Rousseff levou o país à profunda recessão de hoje. Em outros tempos, a mesma Dilma se posicionou de maneira responsável sobre o tema. “O Brasil vai ter de encarar a questão da Previdência”, disse, em janeiro de 2016, quando ainda estava no poder. “Estamos envelhecendo mais e morrendo menos. Nossa expectativa de vida nos últimos anos aumentou talvez de forma bastante significativa”, avaliou.

Agora, porém, discursos lúcidos e ponderados sobre as reformas têm ficado a cargo de uma parcela seleta de especialistas. Os ecos de suas opiniões são limitados. Ao invés de avançar, o debate retrocedeu desde que o governo encaminhou sua proposta para equilibrar as contas da Previdência, em dezembro do ano passado. Três meses depois, investimos tempo e energia para questionar a existência ou não de um déficit no sistema previdenciário. Tal discussão é uma falácia. O déficit existe e o debate é sobre como evitar que aumente. Há anos, o gasto maior que a arrecadação resulta em crescimento da dívida pública, e o que o governo tem reforçado é que essa insustentabilidade ameaça o pagamento futuro das aposentadorias. É uma equação relativamente simples de finança básica, que independe da ideologia política.

Ninguém imaginou que mexer na Previdência seria uma discussão de fácil aceitação popular. É essencial, inclusive, que a sociedade civil esteja engajada, mas também bem informada. O governo tem uma enorme responsabilidade. Há uma notória falha de comunicação em explicar, de forma transparente, sistemática e didática, a gravidade do problema. É preciso expor a real situação da Previdência, e quais os caminhos possíveis para equacionar suas contas. A necessidade de reforma não é uma questão plebiscitária. Também não há uma fórmula única e pronta. Para contribuir, a população precisa estar munida de informações. Só assim avançaremos para chegar, juntos, à melhor solução.

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