Jurista fala sobre reformas, aplicação de leis e configuração do Legislativo

O Brasil vive atualmente um dos períodos de maior mudança na estrutura política, judiciária e econômica da nação. Em entrevista concedida à ContilNet na manhã de quarta-feira (11), o jurista, professor e advogado, Cícero de Oliveira Sabino, falou a respeito de tais reestruturações e as possíveis consequências no Estado do Acre e em todo país, a partir dessas novas configurações.

Tendo em vista o foco do Direito na aplicação das normas jurídicas e organização das relações entre indivíduos e grupos na sociedade, Sabino considera que o campo é favorável para a discussão de temáticas voltadas à reforma da previdência, trabalhista, tributária, política e eleitoral, além da corrupção sistêmica e a atuação do legislativo no Acre.

“O Direito deve se nutrir dessas discussões”, afirmou.

Oliveira é coordenador do curso de Direito da Faculdade da Amazônia Ocidental (FAAO) – local que define como berço de qualidade da formação profissional em Direito no Estado.

Cícero de Oliveira Sabino é analista do Ministério Público Federal e professor/Foto: Reprodução

Confira na íntegra a entrevista:

ContilNet: Sobre os rumos tomados pelo Brasil atualmente, com relação às mudanças nos diferentes poderes e reformas, você considera, com base no que é previsto no Direito, que estamos caminhando para o desenvolvimento, de uma forma geral?

Estamos passando por um turbulento momento no nosso País, em que nos deparamos diariamente com casos e mais casos de corrupção em várias instâncias do Estado. Também estamos vendo que as instituições competentes estão trabalhando para coibir tais práticas, fazendo com que o brasileiro acabe refletindo sobre os rumos que queremos para o Brasil. Acredito que todo esse processo pelo qual estamos passando certamente nos levará a uma evolução enquanto nação.

ContilNet: Como você avalia a atuação do judiciário no Acre? Quais são os principais desafios e problemáticas para a classe de juristas no Estado?

Como no restante do Brasil, o Poder Judiciário Acreano enfrenta problemas das mais variadas espécies, a exemplo da insuficiência de material humano (magistrados e servidores), e das deficiências na infraestrutura dos órgãos integrantes do Poder Judiciário, que fazem com que garantias constitucionais do jurisdicionado como a duração razoável do processo não sejam efetivamente atendidas.

Apesar desse cenário desfavorável, o Poder Judiciário Acreano, no meu sentir, presta um bom serviço à população do nosso Estado. O grande desafio para todos nós é buscar meios cada vez mais eficazes para que o cidadão brasileiro possa ter seus direitos e garantias respeitados, ainda que tenha que fazer valer seus direitos por intermédio do Poder Judiciário, a quem cabe ajustar os conflitos de interesses!

ContilNet: Com base no crescimento da onda de corrupção no Brasil e em todo o estado, você considera que há medidas suficientes para um possível equilíbrio?

Penso que as instituições que detém as atribuições para o enfrentamento à corrupção (Ministério Público, Poder Judiciário, dentre outros) têm um papel fundamental para que consigamos sair dessa crise econômica, política, moral e ética, que reflete diretamente na economia do Brasil, entendendo que a par de termos uma legislação que trate de temas vinculados à corrupção (Lei de Improbidade Administrativa, Crimes específicos no Código Penal), ainda temos que buscar melhorar ainda mais a nossa legislação, tanto para prevenir eventuais atos de corrupção, como para reprimir de forma eficiente os delitos efetivamente cometidos. Ações como “As 10 medidas contra a corrupção”, conduzida pelo Ministério Público Federal, é um bom exemplo de ações que procuram melhorar o combate à corrupção.

ContilNet: Se tudo que está previsto na legislação fosse seguido, o país teria “outra cara”? Seríamos uma nação pacífica?

A grosso modo, a nossa legislação é muito boa, se formos comparar com outros países. Normas como o Código de Defesa do Consumidor e o Estatuto do Idoso, têm sua qualidade reconhecida internacionalmente. No entanto, dar concretude aos preceitos legais que as leis estabelecem é o grande desafio.

Não adianta termos uma lei maravilhosa se ela acaba não sendo devidamente cumprida. Por isso, mais do que termos uma boa legislação, temos que ter a vontade de colocá-la em prática. Na minha opinião, precisamos de maiores e urgentes investimentos em educação, para que, a longo prazo – pois esse não é um processo rápido – busquemos mudar esse cenário tão desfavorável pelo qual o Brasil passa atualmente. Precisamos desse choque de cultura para que possamos dar uma guinada e fazer com que a nossa legislação nos traga efeitos concretos, saindo do papel e regulando de fato as relações sociais, acabando com as mazelas pelas quais atualmente estamos passando.

ContilNet: Sobre as reformas trabalhistas e da previdência, o Brasil ganha ou perde com as decisões? O que muda na relação empregador-empregado?

Em relação à reforma trabalhista, algumas mudanças se destacam, como a possibilidade de acordos entre empregadores e empregados, por intermédio dos sindicatos, possam prevalecer sobre a lei, mas com obediência à constituição, fracionamento de férias em até 3 períodos, possibilidade de negociação do intervalo de repouso ou alimentação, a inserção do trabalho remoto (home office), modalidade que não estava contemplada na regulação anterior. Mas foram muitas as alterações verificadas na reforma trabalhista. Já a reforma previdenciária, ainda em tramitação, busca em linhas gerais, fazer com que o trabalhador brasileiro trabalhe por mais tempo, com a limitação de valor, alcançando inclusive os servidores públicos. São várias as críticas feitas às duas reformas, em que muitos defendem que tais medidas

ContilNet: O que foi alterado a partir da reforma eleitoral sancionada? Quais as consequências, tendo em vista aspectos sociais e jurídicos?

Dentre as alterações principais alterações na reforma eleitora, destacam-se a criação do Fundo Especial de Financiamento de Campanha, em que algo em torno de 1,7 bilhões de reais deve ser destinado, para partilha entre os partidos, além da limitação de gastos para as campanhas. Essa foi a principal mudança da reforma aprovada para 2018, deixando de ser aprovado, pelo menos por enquanto, outras questões importantes como o sistema de votação (Proporcional ou o “Distritão”), por exemplo. Obviamente que a criação do fundo impactará diretamente no orçamento público de 2018, sendo que não está claro de onde sairá essa vultosa quantia. É aguardar para ver.

ContilNet: O Brasil e o Acre precisam de uma reforma tributária?

Penso que o nosso sistema tributário precisa de mudanças para corrigir várias distorções atualmente existentes. Temos um sistema tributário altamente complexo, outorgando aos Entes Federativos a competência para instituir inúmeros tributos, havendo uma grande concentração da tributação sobre o consumo em detrimento da tributação sobre a renda, que recai em grande parte, sobre a parte da população como menor renda. Essa sistemática acarreta uma carga tributária elevadíssima.

Para se ter uma ideia, o Brasil é o 14º país dentre os 30 que mais cobram tributos e o último dentre esses países, quando nos referimos à qualidade dos serviços públicos prestados à população. Uma reforma tributária tendente tornar menos complexa a sistemática dos tributos instituídos, bem como para repartir melhor o ônus de manter a estrutura do Estado com o pagamento de tributos é mais do que um desafio, é verdadeiramente necessário para o Acre e para o Brasil.

ContilNet: Quem precisa do Direito? Quem pode utilizar os serviços ofertados pelo Direito e para onde caminha essa área de atuação?

Não há como se pensar em viver em uma sociedade organizada sem que haja o Direito. As relações humanas necessitam de normas de condutas mínimas para que possamos conviver harmoniosamente. Nesse cenário, temos no Brasil uma série de Direitos e Garantias Fundamentais que permitem a todo cidadão o pleno exercício de direitos que são essenciais ao seu convívio em sociedade. Desse modo, todos temos direito à educação, à saúde, à inviolabilidade da sua casa, ao livre exercício de qualquer trabalho, dentre outros.

O cidadão em geral é o principal destinatário desses direitos, podendo, portanto, utilizá-los sempre que precisar, inclusive, por intermédio do Estado, que tem o dever de prover os meios para que o cidadão possa defender os seus direitos, como, por exemplo, o de disponibilizar um advogado público (defensor) para representá-lo em juízo, bem como o acesso gratuito ao Poder Judiciário para fazer valer os seus direitos.

ContilNet: Quais as áreas do Direito com mais atuação no Estado?

Na minha visão, o nosso Estado tem algumas searas de forte atuação. Podemos citar os ramos trabalhista, criminal, cível em geral, como as principais áreas de atuação no nosso Estado. Aliás, esses são ramos de forte atuação não só no Acre, mas no País.

Atualmente, algumas áreas de atuação estão em ascensão no País, até mesmo em razão do cenário político, social e econômico pelo qual estamos passando. Desse modo, a advocacia tributária, a de recuperação judicial e de crédito são exemplos de áreas que vêm crescendo no Brasil, inclusive, no nosso Estado.

FALA LIVRE

Gostaria de agradecer o convite para falar sobre assuntos tão importantes para o nosso Estado e para o nosso País, gostaria de aproveitar o espaço para convidar a todos para participarem de um evento internacional no nosso Estado, consistente na II Cimeira Brasil-Portugal de Direito da FAAO, no próximo dia 17/10, às 17h30, no Teatro da FAAO, que contará, dentre outros, com a participação da Juíza da Corte Constitucional de Portugal, a Dra. Maria Clara Sottomayor, além dos juristas lusitanos Drs. Pedro Ferreira de Sousa e Rui Manuel Pinto Soares P. Dias, bem como os Juízes de Direito do TJ/AC Drs. Maria rosinete dos Reis Silva e Daniel Gustavo Bonfim Araújo da Silva, concluiu.

PERFIL

Cícero de Oliveira Sabino é analista do Ministério Público Federal, professor adjunto do Curso de Direito da Universidade Federal do Acre (Ufac) e Professor Titular do Curso de Direito das Faculdades da Amazônia Ocidental (FAAO), sendo Coordenador do Curso de Direito e de CST em Serviços Jurídicos e Membro do Núcleo Docente Estruturante (NDE) e do CEPE da FAAO.

Possui Licenciatura Plena em Matemática pela Universidade Federal do Acre (1997), Bacharelado em Direito pela Universidade Federal do Acre (2006), Especialista em Docência do Ensino Superior (2002) pela Universidade Cândido Mendes, Especialista em Administração Pública (2005) pelas Faculdades Integradas Rio Branco, Especialista em Criptografia e Segurança em Redes de Computadores (2008) pela Universidade Federal Fluminense, Especialista em Direito Processual Civil (2008) pela Unisul e Mestrado pela Universidade Federal Fluminense (2009).

Tem experiência na áreas de Matemática Aplicada, com ênfase em Matemática Financeira e Estatística, e de Direito, com ênfase em Direito Tributário, Administrativo, Constitucional, Processo Civil, Teoria Geral do Processo.

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