O que tem motivado o surgimento de variados transtornos mentais, atualmente?

A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) realizou em 2013, em parceria com o instituto Ibope, uma pesquisa em vários estados do Brasil e deu conta de que o país é um dos que mais cresce no número de pessoas com Transtornos Mentais (TM). Entre os descritos, estatisticamente, destaca-se: Transtorno Depressivo, Transtorno de Ansiedade e Transtorno do Pânico.

Muito se fala a respeito dessa temática, por muitas vezes estigmatizada, mas de fato, pouco se sabe a respeito da sua complexidade e prejuízos que acarreta para o desenvolvimento humano.

A resistência na hora de procurar ajuda pode ser um dos maiores vilões da juventude /Foto: Reprodução

Partindo da definição, que nos traz a largada do caminho a ser trilhado, entende-se por Transtorno Mental, como cientificamente resume a Associação Psiquiátrica Americana, “síndrome ou padrão comportamental/psicológico que ocorre em um indivíduo que reflete uma disfunção psicobiológica”.

As padronizações importantes e funcionais para compreender os quadros clínicos nos fazem também hipotetizar alguns fatores que estão diretamente relacionados ao adoecimento das funções psíquicas. É importante saber que as origens das disfunções perpassam por mecanismos biológicos, sociais, culturais (aprendizagens) e etc.

Aqui, aprofundo-me nos fatores sociais e culturais (sem desconsiderar a importância de outros) que potencializam o surgimento dos sofrimentos relacionados ao adoecimento, apoiando-me nos comportamentos aprendidos.

Inseridos em uma onda de informações, relações objetais e desconhecimento da própria subjetividade, chegamos, certamente, às definições rasas, aos rótulos fugazes e no automatismo de viver, sem nos dar conta das coisas como são, de verdade.

Quando penso no surgimento de vários TM, inevitavelmente, levo minha atenção para o campo cultural, social e familiar que estamos inseridos. Todos nós, sem exceção, recebemos influências das relações que estabelecemos ao longo da vida. Ao pensar que para que um transtorno mental se configure, estímulos externos precisam potencializar esse aparecimento, algumas crises, sintomas e desordens estão diretamente voltados para a forma como encaramos o mundo, a vida, a nossa própria realidade.

Transtornos mentais podem ser considerados as maiores doenças do novo século /Foto: Reprodução

Não afunilo meu pensamento, no que se refere aos conteúdos aprendidos de forma disfuncional, apenas às pessoas que possuem transtornos mentais, mas também àquelas que não conseguiram sair das fases mais primitivas do desenvolvimento (os “infantis da fase adulta”). Percebi, caminhando por pouco tempo na estrada da vida, que não fomos ensinados, como veleiros no barco da vida, a apreciar as aguas que verdejamos, a aprender com as frustrações de nem sempre alcançar águas mais tranquilas, a silenciar para entender a própria confusão e a simplesmente decidir crescer, quando descobrir que ninguém mais pode fazer isso por nós mesmos.

Os sintomas que, como figura, descrevem o Transtorno Depressivo, são: Apatia (não sentir nada) e Tristeza (sentimento de vazio e desesperança). Quando ouço o discurso de pessoas inseridas nessa categoria, não me aprisionando a percepções depreciativas, tomo como foco o sentimento de “não sentir nada”. É notável que, na maioria dos casos, o “sentir”, para essa mesma parcela de pessoas, sempre foi muito difícil ao longo da vida. Evitar os sentimentos para dar vazão aos conceitos, definições, razão e exatidão, sempre foi mais fácil. Já ouvi certa vez: “Não tenho tempo e nunca tive para o lado emotivo. Dá muito trabalho”. Ao passar a aprender a lidar com as próprias emoções, deixar de evitar o que deve seguir o ritmo, sem negligenciar o “colorido afetivo”, alguns sintomas cessam na velocidade da disponibilidade e da aceitação dos vários “lugares de mim”.

Reagimos às tristezas, às decepções, à raiva, a angústia, muitas vezes, com os recursos que trouxemos dos nossos pais ou criadores. Quase sempre, com muito medo de arriscar ou sem suporte para criar outras formas. Criatividade é recurso indispensável para a cura, da mesma forma que aprendizagem é escada para o crescimento.

Pensar isso, não significa acreditar que as pessoas com transtornos mentais, são infantis. Mas, suponho que, não conseguiram encontrar, a partir da criatividade, outras formas de superar.

Sempre ofereça ajuda e ouça atentamente /Foto: Reprodução

Ao compreender o Transtorno de Ansiedade como um mal do século, vejo que ao mesmo tempo, distantes do “aqui-agora”, da realidade presente, tentando a todo custo adiantar o futuro, trazendo para o próprio corpo a energia dessa busca (sintomas físicos do Transtorno de Ansiedade), não aprendemos a ficar com o que temos. Deslocamos-nos da possibilidade de sermos quem somos, fugindo, sabotando, sem conhecimento dos próprios recursos.

A atenção plena (mindfulness) tem sido um recurso utilizado em vários tipos de psicoterapia, no intuito de levar o individuo a contatar sua experiência atual e os efeitos positivos encontrados a partir dessa experimentação, são incalculáveis. Inclusive, nesse mesma técnica, há remissão dos sintomas do Transtorno de Ansiedade.

Cito os dois tipos de transtorno, porque quantitativamente, são os que mais afetam a população brasileira e acreana. Mas, asseguro-me da crença de que os nossos padrões comportamentais do campo da aprendizagem, estereotipados (repetitivos), não nos servem em todas as situações da vida.

Precisamos ouvir as nossas próprias necessidades, ruminá-las e, em seguida, fazer algo por elas, à revelia dos medos “sem sentido”, das “obrigações de cada dia”, do viver para atender, sempre, as expectativas alheias.

Grande parte dos TM se dão em fases desenvolvimentais iniciais, quando começam a se estruturar nos extremos do excesso de apoio (não permitir que a criança cresça segura de si, mas, dependente dos cuidadores) ou no excesso polo da frustração (não oferecer apoio e acolhimento à criança). A educação infantil precisa sempre alcançar os dois modelos, em equilíbrio, para que o indivíduo alcance autonomia (vinda da frustração) e tenha suporte para viver na maturidade (fruto do apoio). Por isso, frustrem os seus filhos, deixem que eles, na medida do possível, possam assumir responsabilidades, construir os próprios caminhos e, também, acolham, para que assim, reconheçam a força da motivação e do amor.

Aprender e decidir dar pequenos passos muda muita coisa. Da mesma forma que, aprender e decidir a lidar saudavelmente com os próprios sentimentos e perdas, para benefício próprio, nos trazem muitos proveitos.

Por fim, parafraseando ilustríssimo Sartre, não creio que o mais importante seja o que fizeram de nós, mas aquilo que escolhemos fazer com o que fizeram de nós. Somos raízes, somos sangue, somos nossos pais e nossas mães, mas também somos a escolha, o direito e quem nós decidirmos ser.

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