Mâncio Lima, a cidade mais distante da capital via terrestre, tem beleza natural no local mais ocidental do Brasil

Mâncio Lima limita-se com os municípios de Cruzeiro do Sul e Rodrigues Alves, além do vizinho Peru/Foto: ContilNet.

Mâncio Lima originou-se de um povoado denominado Japiim, que é um pássaro de plumagem preta e amarela muito comum na região do Vale do Juruá. O município está localizado à margem direita do Paraná Japiim, numa área que se estende a 30 quilômetros da foz do Rio Moa, após aproximadamente um quilometro de restinga, no extremo oeste da Amazônia, no ponto mais ocidental do Brasil. Os manciolimenses são os primeiros a verem o nascer e o pôr do sol.

Limita-se com os municípios de Cruzeiro do Sul e Rodrigues Alves, além do vizinho Peru. Por ligação terrestre, é o município mais distante da capital (700 quilômetros). Mâncio Lima conta ainda com o Parque Nacional da Serra do Divisor (PNSD), que é o quarto maior do país. A unidade de conservação é destinada à preservação dos ecossistemas para fins científicos, culturais, educativos e recreativos. A região é detentora de uma das maiores biodiversidade do planeta.

Desde os seus primórdios, o município tem vocação agrícola, destacando-se as culturas da mandioca, milho, arroz e feijão. Como os demais municípios da região, o principal produto é a farinha.

Com uma população de aproximadamente 16.000 mil pessoas, onde 60% ainda vive às margens dos rios e igarapés, em pequenas comunidades, a realidade, apesar dos avanços alcançados nos últimos anos, apresenta um cenário social no qual persistem situações perversas do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH).

Jovens índias fazendo pinturas indígenas com urucum/Foto: Flaviano Shcneider.

Potencial para o turismo

Mâncio Lima tem potencial para o turismo natural. Possuir três povos indígenas (Puyanawa, Nukini e Naua) e o PNSD. Para se tornar um polo turístico, no entanto, precisa estar estruturado tanto na cidade como na zona rural, principalmente no que diz respeito às condições social, econômica e cultural de sua população.

“A criação de um centro cultural, onde os jovens participam de grupos de teatro, apresentações musicais, grupos de danças, resgate do folclore local, entre outras atividades, contribuirá para oferecermos algo a mais aos turistas”, disse o prefeito Cleidson Rocha (PMDB), destacando ainda a construção de um porto na cidade.
O município conta com vários trunfos para se tornar um endereço para a prática de ecoturismo e turismo de aventura: a parte mais bonita do PNSD e o Parque Ecológico do Japiim Pentecostes.

Segundo especialistas, algumas ideias podem ser implantadas, a custo baixo como a canoagem no Japiim, observação de fauna e flora no PNSD, tirolesa, arvorismo, asa delta e caminhadas que já são praticadas de forma amadora no parque. Uma delas, de meia hora, leva à cachoeira do Ar-Condicionado e outra, de 36 quilômetros, ida e volta, até a cachoeira Formosa.

A ameaça da exploração de petróleo e gás

Índios de todas as etnias do Acre e representantes de entidades socioambientais lutam para impedir a exploração de petróleo e gás de xisto no Vale do Juruá. Segundo eles, sem consulta alguma à sociedade, a Agência Nacional de Petróleo Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) autorizou a exploração “predatória e contaminante”, que ameaça o Aquífero Juruá. O local da exploração fica nos limites diretos de duas terras indígenas e o PNSD.

Por onde passou, o método de produção do gás de xisto, conhecido como fraturamento do solo ou Fracking, causou danos ambientais. “Essa exploração é considerada altamente arriscada para o meio ambiente e com consequências sociais e econômicas nefastas, que só agora começam a serem mensuradas em países como Estados Unidos, Argentina e França, Peru e Equador”, alertou a socioambientalista, Bárbara Figueiredo da Silva.

Ainda segundo ela, a ANP não fez um estudo de impacto ambiental, desrespeitando uma convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT), entidade da qual o Brasil é signatário. “Após explodirem as rochas, é utilizada uma enorme quantidade de água com milhares de produtos químicos para liberar o gás. É certo o risco trazido pela injeção dessa água misturada no subsolo, com a possibilidade de se contaminar os aquíferos”, alertou a ativista.

Mâncio Lima não possui aterro sanitário e lança o que “não serve mais” em um lixão/Foto: reprodução.

Lixão e educação deficiente

Uma das maiores frustrações do prefeito, que é professor-doutor da Universidade Federal do Acre (Ufac), é não ter cumprido a lei que extingue os lixões, cujo prazo para as adequações expirou em 2014. Por ser uma região entrecortada por mananciais, Mâncio Lima, da mesma forma que os demais municípios do Vale do Juruá, não possui aterro sanitário e lança o que “não serve mais” em um lixão. Aliás, o local lembra o Inferno do livro “Divina Comédia”, do escritor italiano Dante Alighieri. Para piorar a situação, a passagem pelo local é obrigatória para alguns agricultores, posto que se localiza na Estrada do Batoque, que dá acesso a inúmeros ramais.

Ainda no mesmo local, o chorume (substância líquida resultante do processo de putrefação) é lançado num igarapé, onde, ao lado, existe um balneário muito utilizado pelos moradores. Por causa do forte odor e da presença ratos, baratas e urubus, um engenho de cana e uma casa de farinha tiveram que ser desativados.

Apesar dos recentes investimentos, oferecer educação de qualidade ainda é um desafio. A reportagem encontrou alunos voltando para casa porque o motorista de um ônibus não pareceu para leva-los à escola. Segundo o prefeito, os problemas são por causa de um convenio firmando entre o município e o governo estadual, que este não vem horando. Também é comum o atraso nos pagamentos de postos de combustíveis e de barqueiros.

O povo Puynawa, ou povo do sapo, compõe-se de 660 indivíduos, divididos entres as aldeias Barão e Ipiranga/Foto: Terry Aquino.

Puyanawas: uma resistência que já dura mais um século

O povo Puynawa, ou povo do sapo, compõe-se de 660 indivíduos, divididos entres as aldeias Barão e Ipiranga e seu território, de 24.499 há, está localizado na margem direita do rio Moa, entre os Igarapés Bom Jardim e Generoso. A Língua Puyanawa ou Poyanawa, chamada pelos falantes Üdikuï, significa ‘língua verdadeira’ da família linguística Pano.

Na primeira década do século passado, os Puyanawas foram escravizados pelo seringalista Mâncio Agostinho Rodrigues Lima e proibidos falar sua língua. Obrigados a aprender português em uma escola, os homens eram separados das mulheres. Também foram forçados a trabalhar na extração do látex. As mulheres cultivaram roças grandes de mandioca, arroz, cana-de-açúcar e feijão.

A população, que era de aproximadamente 800 índios, caiu para 115 devido a conflitos e uma epidemia de sarampo. Somente em 1930, as mulheres deixaram de trabalhar nas roças e passaram a viver com os homens espalhados nos seringal. Este regime terminou com a morte de Mâncio Lima em 1950.
Somente em 1977, a Fundação Nacional do Índio (Funai) realizou os primeiros estudos para identificação do território Puyanawa, que foi demarcado em 2.000. O povo pretende solicitar a ampliação da terra devido da situação de escassez de recursos e da ocorrência de invasões, incluindo-se os territórios originais, que hoje pertencem ao empresário cruzeirense Alfredo Dene.

A vida nas aldeias

Com alto índice de índios miscigenados (existem apenas 30 índios puros), a terra indígena possui sistema elétrico público e, por isso, a maioria das casas têm geladeira e televisão, além de poços artesianos com uma grande caixa d’água que abastece as casas. As malocas antigas deram lugar a casas construídas com base de tijolos, paredes de madeira e o telhado de duas águas.

Controlam a derrubada de área de mata bruta, utilizando terras abertas há muito tempo para o plantio de mandioca. A produção de farinha é a principal atividade econômica, que tem o auxilio de arados e tratores. Também coletam buritis e vendem galinha, ovos e porcos.

Estilo de vida

O índio José Puwe Martins, 37 anos, que é formado em Biologia pela (Ufac), afirma que seu povo se relaciona com a humanidade e natureza. Acredita que não é possível viver melhor sacrificando outros que vivem pior. “Apesar da forte aculturação e miscigenação do nosso povo, estamos regatando as tradições e hoje somos um povo feliz”, afirma Puwe, que na língua Puyanawa significa forte, guerreiro.

O bem viver, segundo ele, é o equilíbrio entre os seres humanos e destes com os elementos da vida. É uma cosmovisão numa convivência de todos os seres humanos, com a mãe terra e todos os elementos do cosmos mais amplamente.

“Acredito que é possível e necessária a aproximação da filosofia indígena e a abertura para o que é diverso na busca de uma sociedade mais justa. Somos capazes de convivermos com as diferenças. Tudo pode ser pluri e, para que tenha sentido, deve ser inter, de inter-relação entre todos, para que as coisas avancem. O poder também precisa ser compartilhado para se chegar ao pluralismo e consequentemente ao bem viver.

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