No entanto, uma nova pesquisa sugere que existem algumas culturas que superam esse efeito, ou seja, não possuem tal característica evolutiva, ao passo que as sociedades capitalistas o “aumentam” e o tornam mais extremo.
O efeito dos legados pode ser visto em diferentes exemplos na nossa sociedade, como aquela casa no mercado há anos, que sem dúvida seria vendida se os donos baixassem o preço um pouco. Mas eles sentem que o imóvel vale mais do que qualquer um está disposto a pagar por ele, então não fazem isso.
Esse efeito psicológico parece onipresente em todo o mundo. Uma vez que nós possuímos algo, começamos a valorizá-lo e queremos continuar possuindo-o.
Só que, enquanto os pesquisadores acreditavam que o efeito tinha raízes biológicas, Coren Apicella, da Universidade da Pensilvânia (EUA), percebeu que as experiências sobre ele geralmente eram feitas com estudantes universitários americanos, e que era preciso testar o fenômeno em um grupo diferente de pessoas.
O povo Hadza é formado de modernos caçadores-coletores. Eles vivem no norte da Tanzânia em torno de um lago quase todo seco chamado Lago Eyasi. Alguns grupos de Hadza vivem mais perto de mercados e cidades e têm contato com a economia da Tanzânia, enquanto outros são verdadeiramente nômades e só subsistem de caça e coleta.
Ela deu a membros de diferentes grupos presentes como biscoitos ou isqueiros e, em seguida, realizou um teste padrão do efeito dos legados: perguntou se eles estavam dispostos a negociar (trocar) suas posses.
Nos Estados Unidos, as experiências em geral mostraram que as pessoas são relutantes em trocar o que ganharam. Quando você possui algo, não gosta de abandoná-lo.
Apicella descobriu que os Hadza que tiveram contato com a economia moderna se comportaram exatamente como estudantes universitários americanos, mas os Hadza caçadores-coletores agiram diferente.
Eles não tiveram problemas em abrir mão de suas posses, negociá-las, compartilhá-las. Eles pareciam invulneráveis ao efeito dos legados. A descoberta de Apicella desafia a ideia de que este é um fenômeno puramente biológico: os Hadza mostraram que ele também é moldado pela cultura.
Se você é um caçador e você mata alguma coisa e não compartilha esse alimento com outros membros de sua tribo, amanhã seus companheiros podem não compartilhar a comida deles com você. Em uma sociedade interdependente, atos egoístas são rapidamente punidos.
Já os Hadza que viviam mais perto de uma economia moderna eram mais como nós: eles se “apaixonam” por suas posses, porque a economia moderna permite que as pessoas sejam mais egoístas. Como muitos de nós já sabiam, o capitalismo celebra o egoísmo.
Então, não, não nascemos assim. Na pior das hipóteses, temos maneiras de combater o materialismo – só não queremos usá-las, porque isso significa abrir mão do que temos. [NPR]