25 de abril de 2024

Edson Jaminawa relata sua história de superação e representatividade indígena

O jovem indígena Edson Aldete Roberto Jaminawa, de 36 anos, é um nome conhecido entre os não índios nos municípios de Sena Madureira, Assis Brasil e várias regiões do Acre. Desde criança, ele transita entre o seu local de nascimento (Vila Betel, localizada no Rio Iaco) e as cidades de Sena Madureira e Assis Brasil, onde residiu por mais tempo para alcançar o sonho de estudar e trabalhar.

“LUGAR DE ÍNDIO É NA ALDEIA”

Ao perder a mãe com 11 anos de idade, Edson ficou sob os cuidados do pai, juntamente com outros três irmãos consanguíneos. O pai, segundo contou Edson à equipe da ContilNet, teve mais 27 filhos, o que lhe conscientizou e despertou uma busca pela independência. “Se eu tinha um sonho, deveria ir em busca da realização dele”, comenta o indígena, que ao se estabelecer em áreas urbanas, já na adolescência, iniciou a atividade de vendedor de picolé e deu continuidade aos estudos no ensino fundamental.

Jaminawa decidiu permanecer na cidade e nela realizar seus sonhos, onde logo se profissionalizou. Imagem: Arquivo pessoal

Foi dentro da escola e de outros ambientes urbanos que Edson enfrentou muitas dificuldades, principalmente no que diz respeito à aceitação dos demais estudantes brancos. “Tive muitos problemas na escola, pois quando eu lá chegava, meus colegas me criticavam muito e perguntavam o que eu estava fazendo ali, e por que não tinha voltado para a aldeia. Me diziam que ‘lugar de índio é na aldeia’, e que eu nunca ia vencer na minha vida. Esses episódios infelizmente aconteceram durante toda minha vida escolar, mas sempre busquei meus sonhos e nunca desisti de nada”, relata.

O jovem Jaminawa estudava no período noturno e lembra que ficava exausto do trabalho diário com a venda de picolés durante o dia. Do cansaço exacerbado, chegava a dormir na sala de aula, o que lhe causava constrangimento de conversar com os professores. “Um dia, em um determinado momento, tive que conversar com minha professora. Ela me disse que não era vergonhoso, e que minha atividade era um trabalho digno. Na formatura da minha turma, ela usou minha história como exemplo de perseverança, e eu vi que aquela era uma grande vitória”, lembra ele, que decidiu permanecer na cidade e nela realizar seus sonhos.

PROFISSIONALIZAÇÃO

Na busca de ampliar suas relações de trabalho, Edson aprendeu a cortar cabelo e tornou-se profissional na área. Também aprendeu a fazer fotografias e a produzir vídeos, trabalhando, assim, em uma variedade de ramos. Casado com a jovem Iara Shanenawa, que trabalha na produção de artesanato de bijouterias, eles constituíram família com três filhos (9, 8 e 4 anos de idade). O casal se estabeleceu na cidade, mas nem por isso, segundo Edson, houve distanciamento do relacionamento deles com os “parentes” na aldeia.

“Minha vinda para Rio Branco foi mais difícil ainda, pois o mundo de ‘vocês’ é muito diferente do meu. Os estudos de vocês são muito diferentes, e nosso conhecimento vem de dentro da aldeia e da natureza. Conhecemos o que a natureza nos oferece, a medicina da mata, os princípios e valores da floresta”, afirma.

REPRESENTATIVIDADE PARA OS POVOS INDÍGENA

Atualmente, Edson mora com a família no município de Tarauacá. Lá, ele pretende ser candidato a deputado estadual, já que foi candidato a vereador em Sena Madureira nas eleições de 2016 pelo Partido Republicano Brasileiro (PRB), na coligação Unidos Por Sena.

Edson já candidato a vereador em Sena Madureira nas eleições de 2016 pelo Partido Republicano Brasileiro (PRB). Imagem: Arquivo pessoal

Conhecedor dos movimentos indígenas, ele conta que começou a integrar o movimento indígena em 2013 como um dos representantes Sul da Amazônia. Desde então, permaneceu na luta pelas causas de seu povo. “Fui pra Sena Madureira e assumi uma assessoria indígena composta basicamente pela etnia Jaminawa. Mas, mesmo assim, encontrávamos muitas portas fechadas de secretarias. Entre as alegações, estavam ‘por que você não procura a Funai?’ ou ‘Por que você não procura a Sesai?’”, relata Edson.

Segundo Edson Jaminawa, todos sabem que a Sesai é responsável pela área de saúde indígena, mas muitas pessoas usam o argumento de que as verbas são voltadas para a aldeia, negligenciando, no processo, o indígena que precisa de atendimento de saúde na cidade.

A Funai trabalha como departamento judicial, lidando com assuntos como a demarcação das terras indígenas, ou seja, cuida para que os invasores não ultrapassarem esses territórios. Ele ressalta que, nos outros setores, os indígenas são negligenciados na cidade pela ignorância do funcionalismo público. Mesmo nesses órgãos diretamente ligados aos indígenas, são encontradas várias portas fechadas.

“Tive a oportunidade de viajar para Londres, México, China, Equador, Lima, e outros países com o objetivo de expandir o diálogo e a visibilidade da cultura indígena. Pretendo fazer mais e cursar Direito, fazer advocacia. Hoje, minha esposa também pretende cursar Administração pela Universidade de Brasília”, revela ele à ContilNet.

DIREITO A CIDADANIA E RESPEITO AOS POVOS NATIVOS

Para ele, o fato dos habitantes indígenas estarem contabilizados no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), não apenas em zonas rurais, mas em zonas urbanas, aumenta o direito de reivindicação por seus direitos, o que implica em cidadania oferecida às etnias desaldeiadas por parte das instituições públicas.

“Quando nós, indígenas, queremos alguma coisa, nós lutamos por isso porque somos um povo de coragem”, afirmou. Imagem: Arquivo pessoal

“É por isso que queremos alguém para lutar pelos indígenas e pelos menos favorecidos, independente se eles moram na aldeia ou na cidade, se são instruídos ou não. Hoje, é possível ver que o país está em um momento de turbulência em praticamente todos os setores: educação, saúde, segurança pública, e o Acre não é exceção. Quando me deparei com a dificuldade dos meus parentes em Sena Madureira, percebi que precisava fazer algo. Nós temos a nossa cultura, temos a nossa aldeia, e isso nunca se perde – mesmo quando migramos para os centros urbanos, para o ‘mundo do branco’. Ver este cenário me motivou a querer fazer a diferença. Quando nós, indígenas, queremos alguma coisa, nós lutamos por isso porque somos um povo de coragem”, garante o indígena Jaminawa.

UNIDADE DO POVO

Ao contrário do que se especula entre os brancos acerca da cultura, costumes e tradição indígenas, Edson Jaminawa afirma que não existem divergências entre as etnias, e que partidos políticos como o Partido dos Trabalhadores (PT) manobram e incentivam a divisão entre as etnias para domínio político e social.

“Isso não existe. Os indígenas são um povo só, e somos unidos. O que nos difere é a linguagem. Por exemplo: os Huni Kuin, que é o mesmo Kaxinawa; Shaminawa, que é o Povo do Pássado; os Manchineri; os Jaminawa. Existe essa visão no mundo dos brancos de que as etnias não se dão bem. Dentro do Purus, são três etnias: Kulina, Kaxinawa e Kaminawa, mas não existe divergência. Cada um vive dentro de sua cultura, mas quando precisamos lutar por nossos direitos, todos vamos à luta. Nós não temos divergência alguma. Eu, Jaminawa, sou casado com uma mulher Shanenawa, e temos três filhos”, afirma.

INDÍGENAS NA POLÍTICA: POR QUE NÃO?

Sobre a representatividade indígena na política acreana, Edson afirma que os indígenas têm uma enorme dificuldade em organizar reuniões sobre diversos temas. Por isso, o Jaminawa pretende trabalhar, junto a outros “parentes”, em prol de todas as etnias como pré-candidato a deputado estadual, em favor das terras indígenas.

Jaminawa pretende trabalhar em prol de todas as etnias. Imagem: Arquivo pessoal

De acordo com ele, a maioria das terras indígenas são acessadas via ramais, e são necessários investimentos não apenas em saúde, educação e segurança, mas em infraestrutura destes acessos, permitindo assim aos indígenas escoarem produtos que garantam geração de emprego e renda. “Precisamos fazer toda essa trajetória, levando informação e conhecimento para combater essa alienação política dentro e fora das aldeias”, disse ele.

“O que fazemos? Vamos de porta em porta nesses ditos ‘amigos’ para conseguir auxílio. Acredito eu que, com um representante na Assembleia Legislativa, vamos acabar com essa cultura. Por exemplo: se tivéssemos um deputado estadual, os interesses do povo indígena seriam levados em consideração. Em todos os segmentos, todos têm sua representação. Então, por que um indígena não pode estar inserido na cultura política para fazer a diferença? E não apenas para a comunidade indígena, mas para todas as pessoas humildes, mais necessitadas porque somos cidadãos, independente de estarmos na aldeia ou na cidade”, concluiu ele.

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