O final de semana prolongado foi de muito trabalho para a equipe do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC). Os profissionais participaram da reintrodução de dez peixes-boi em um dos principais rios da Amazônia, o Purus. Está é considerada a maior soltura desses animais no Brasil, desde que o Programa de Reintrodução de Peixes-Boi do Inpa foi criado, há dez anos, com apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza.
A ação encerra nesta terça-feira (3). Os dez mamíferos aquáticos serão soltos na Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) Piagaçu-Purus, próximo a Beruri, a 173 km de Manaus. São eles: Aboré, Rudá, Gurupá, Manicoré e Itacoati (machos); e as fêmeas Anori, Adana, Baré, Piracauera e Naiá.
“Desses dez animais, cinco receberão os cintos transmissores para monitoramento pós-soltura”, destaca o biólogo Diogo Souza, responsável pelo programa de reintrodução. Ele acrescenta que os outros cinco serão soltos diretamente na natureza e não serão monitorados, em razão do sucesso das outras solturas.
Até o momento, o Inpa já reintroduziu 12 peixes-boi aos rios na Amazônia. Desde 2016, eles são soltos na RDS Piagaçu-Purus, onde as comunidades da unidade de conservação do estado do Amazonas são parceiras do programa. “Nossa ideia é levar, de maneira inédita, dez animais de uma só vez. Normalmente, o Inpa tem reintroduzido de quatro a cinco peixes-boi por ano, mas o sucesso das solturas passadas com os animais se readaptando muito bem à natureza nos permitiu acelerar o processo”, explica Diogo. A última soltura foi feita em abril de 2017, quando cinco animais foram reintroduzidos – três machos e duas fêmeas.
Após a reintrodução, o biólogo Diogo Souza e uma pesquisadora do Japão continuarão na Reserva durante mais dez dias para acompanhar os primeiros deslocamentos dos animais e entender como estão se adaptando. O trabalho de monitoramento em tempo integral é feito por quatro assistentes de campo (comunitários da reserva, ex-caçadores de peixe-boi) que acompanham os animais diariamente com os equipamentos de telemetria fixados na cauda do peixe-boi. O equipamento emite sinais pelos quais o assistente consegue encontrar o animal e saber os movimentos diários e sazonais, bem como a área que ele está ocupando na reserva.
Para que a adaptação dos peixes-boi seja bem-sucedida, antes da soltura definitiva, eles passam por um período de preparação de, pelo menos, um ano no semicativeiro, num lago privado de piscicultura, em Manacapuru. “Com a retirada desses dez animais, ficarão no local outros 14 e, em Manaus, estão outros 53 peixes-boi nos tanques do cativeiro do Bosque da Ciência, do Inpa”, explica Vera. “Nessa etapa de semicativeiro, o lago é um ambiente propício para o animal herbívoro se readaptar, gradualmente, às condições naturais, podendo se alimentar sozinho de pelo menos 13 espécies de plantas aquáticas, como mureru, capim-membeca e capim-navalha, além de ter contato com outros peixes-boi e demais animais aquáticos, como peixes e quelônios”, finaliza.
O peixe-boi-amazônico é a menor espécie existente. Mede entre 2,8 a 3,0 metros e pesa até 450 quilos. Mesmo assim o tamanho impressiona e, por causa disso, ele passa uma imagem de poucos amigos.
Mas é dócil e bastante lento em seus movimentos. Talvez seja em razão destas características que este mamífero, conhecido também por manati ou manatim, hoje seja uma espécie vulnerável. E a razão para o risco de extinção também se apoia em alguns fatores como a caça deliberada (apesar de o peixe-boi ser protegido por lei desde 1967), a morte acidental em redes de pesca, o encalhe de filhotes órfãos e, claro, a degradação ambiental.
Como característica física, tem o corpo cinzento e uma grande mancha esbranquiçada no peito. Esta diferenciação, mais a ausência de unhas nas nadadeiras peitorais, é o que o distingue do peixe-boi-marinho e do peixe-boi-africano. Ele é também o único a viver exclusivamente em água doce. Herbívoro, o peixe-boi-da-amazônia se alimenta de capins flutuantes e tem papel fundamental na cadeia alimentar e no ecossistema aquático da região onde vive. Ele controla não só o crescimento dessas plantas, como também, com suas fezes e a própria urina, fertiliza o solo das águas, contribuindo para a manutenção do ambiente.