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Amarelas: ‘O homem está acuado diante do avanço feminino’

Por VEJA

Em seu consultório em Higienópolis, bairro nobre de São Paulo, a psicanalista Malvina E. Muszkat atende homens com dúvidas que há poucos anos não fariam nenhum sentido. Se vai convidar uma mulher para sair, deve levá-la para jantar? Deve buscá-la em casa e abrir a porta do carro? Pior do que isso: paga a conta ou divide? O receio de ofender uma mulher com gentilezas é novo, decorrente da forte onda feminista que tem redefinido as relações entre homens e mulheres e os deixado perdidos, “abobados”, como diz Malvina. “Hoje, os homens não têm mais uma regra social clara a seguir e nunca sabem como uma mulher vai reagir”, diz a psicanalista, que está lançando um livro, seu quarto título solo, sobre a situação masculina diante desse verdadeiro levante feminino. O Homem Subjugado – O Dilema das Masculinidades no Mundo Contemporâneo (Summus) reúne sua experiência clínica de trinta anos, catorze deles dedicados a ouvir e transformar agressores domésticos, além da sua atuação como pesquisadora convidada do Núcleo de Estudos de População da Unicamp. Para a autora, o diagnóstico é claro: o homem está sofrendo. E o remédio, uma vez que a ascensão feminina é legítima, é derrubar de vez as barreiras entre os gêneros, criando meninos da mesma forma como se educam meninas.

A psicanalista Malvina Muszkat/Foto: Felipe Cotrim/VEJA.com

O título O Homem Subjugado remete ao outro lado do forte momento feminista atual. Era essa a ideia? Sim, foi isso mesmo o que eu quis fazer: um outro lado. Hoje, as mulheres estão à frente do debate público, ferozes. Elas cresceram muito e os homens ficaram parados. A verdade é que estão confusos, perdidos. Vivemos um momento de transição e momentos de transição são assustadores, porque é muito importante para o ser humano ter referências claras. Os homens estão deixando a posição de autoridade absoluta, de gerar e gerir a família, de cuidar dos bens e do comportamento, mas qual o lugar deles hoje? Eles não sabem.

O homem está sofrendo? Sim. E calado, porque tem dificuldade de falar sobre os seus sentimentos e conflitos internos. Isso faz com que se exponha mais a doenças psíquicas, como a depressão. Os meninos são ansiosos, têm de corresponder o tempo todo às expectativas sociais. Por outro lado, as mulheres começam a ser exigidas, também, e agora sofrem de doenças que eram consideradas masculinas, como as cardíacas.

Em alguns círculos sociais, é visível uma nova divisão de tarefas domésticas. A senhora já constatou essa mudança? A tendência ainda é a de reproduzir modelos tradicionais, mas vejo de fato um maior equilíbrio entre os casais jovens em que os dois têm diploma e trabalham. Ambos têm carreira fora de casa, um precisa da colaboração do outro nas tarefas domésticas. Os homens participam mais da criação dos filhos, a parentalidade está mudando. É um grupo em que a gente não encontra quase violência. Está mais na linha da igualdade. Para esse grupo, a auto-imposição perdeu o sentido. Mandar na mulher já não deixa o homem seguro. É uma transformação que parece irreversível. Vejo que rumamos para um mundo em que cada um vai escolher o seu jeito de se vestir, de se comportar, de se relacionar. A sexualidade está mais livre. As amarras do masculino e do feminino tendem a se flexibilizar cada vez mais.

A senhora diz que as mudanças ainda são restritas a alguns estratos. Que grupos sociais são mais refratários a elas? A nossa sociedade menos educada é extremamente rígida. Os religiosos estão entre os mais refratários. As mulheres são submissas por vontade própria, não ousam. Os homens são autoritários. As mudanças estão em curso, não são feitas do dia para a noite, mas há um grupo, nessa nova geração, que deve levá-las adiante. Claro que vai ser uma elite que vai conduzir essa mudança, por causa da sem-vergonhice desse país e porque, em qualquer revolução, o povo briga, mas quem traz a novidade é a elite.

O homem agressivo também sofre? Quando se fala de violência contra a mulher, na verdade se está falando de violência dentro da família. Todos são violentados, os filhos, o próprio homem que agride. Eu atendi muitos que nem sabiam por que batiam. Ouvi coisas como “Ela não sabe fazer coxinha”. Quando você começa a conversar com os homens sobre o que eles sentem no momento da violência e depois dela, entende que se sentem mal com a agressão. Tentam se justificar, “Eu estava bêbado”, “Ela abusou”, e deixam claro que o problema tem raízes culturais que não podemos ignorar.

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