As “Fake News”, a “era da pós-verdade” e seus impactos nas Eleições de 2018

A poucos meses das eleições de 2018 no Brasil, o grande marco para todos os expectadores e coadjuvantes do pleito eleitoral não é um novo sistema digital para o ato de eleger, mas como a tecnologia da comunicação e as redes sociais terão reflexo nas eleições, principalmente devido ao fenômeno social da propagação de notícias falsas, sob a nomenclatura de “Fake News.

O termo “Pós-verdade” foi eleito a Palavra do Ano em 2016, pelo dicionário Oxford. A pós-verdade foi definida como “a ideia de que um fato concreto tem menos significância ou influência do que apelos à emoção e a crenças pessoais.” A pergunta no ar é, uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade?

Paul Joseph Goebbels[1], Ministro da propaganda da Alemanha Nazista, declarou certa vez que “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”. Em alguns casos, personifica-se.

Na era atual, onde a tecnologia e as redes sociais estão inseridas em todos os aspectos do nosso cotidiano, nas eleições também terão reflexo em todo o meio, principalmente sobre as propagandas eleitorais. Eis que, a propagação de conteúdos na rede mundial de computadores é acelerada, e, em sua grande maioria, as informações possuem falta de fundamentação e veracidade, sendo replicadas inúmeras vezes, transformando mentiras em verdades, prejudicando a profusão da informação e do conhecimento.

O impacto do excesso da propagação das “Fakes news” tem acarretado de acordo com o conceito da “pós-verdade”, uma percepção ao receptor dessas “notícias”, a ideia de que é mais importante acreditar que algo é verdade (mesmo não sendo) do que aquilo que de fato é verídico.

Dessa forma, o uso do prefixo “pós” remete a ideia de que o conceito de verdade passa a ter o significado daquilo que é propagado e consegue atingir o maior número de crenças positivas sobre a matéria, e não, a verdade propriamente dita.

Cristopher Mariano é advogado/Foto: cedida

As “Fake News” (notícias falsas ou fabricadas) têm sido proliferadas de forma deliberada nas mídias sociais, rádios, televisões e jornais; são publicadas com a intenção de enganar, causar desinformação, ou ainda obter ganhos financeiros ou políticos; muitas vezes, são realizadas por meio de manchetes “clickbait”[2] sensacionalistas e atraentes com conteúdos exagerados ou evidentemente falsos.

Esse efeito, aliado a descrença do sistema informativo (imprensa) e a descentralização da produção do conteúdo, permitiram que o novo protagonista –  produtor de conteúdo – distribuísse por meio de novas tecnologias e canais de informações sem os cuidados jornalísticos e os processos de apurações de notícias, centenas de dados, na maioria falsos, com alto poder de influência na sociedade. Eis que uma grande quantidade de informações são lançadas nas redes tecnológicas sem a preocupação quanto à qualidade do que é transmitido.

A dificuldade em identificar notícias falsas afeta até países com melhores índices de escolaridade, por isso, o prejuízo das “Fake News” nas Eleições, pode ser incalculável, eis que as “notícias” são consumidas por milhões de pessoas, causando dúvidas aos receptores das mensagens ou propagandas.

Apesar de as “fake news” não serem uma novidade do século XXI, existem diversos episódios mundialmente conhecidos que nasceram de “notícias falsas” espalhadas. Todavia, o termo inglês Fake News foi popularizado pelo presidente dos EUA, Donald Trump, quando recusou uma pergunta em uma conferência de imprensa, durante sua candidatura à presidência dos EUA, acusando um repórter da CNN de produzir notícias falsas sobre ele.

Atualmente, essas notícias quando não são patrocinadas por motivos políticos, são financiadas pela “indústria de cliques”, que são grandes plataformas de propagandas digitais. Vários sites podem ganhar dinheiro baseados em cliques nas propagandas. E, para aumentar as taxas de acessos e frequentadores das páginas, publicações são feitas com manchetes chamativas, muitas vezes, distorcendo o texto publicado ou inserindo mentiras[3]. Por exemplo, não é incomum em sites de fofocas inventarem a morte de alguma celebridade para atrair leitores[4].

Empresas como o Google e Facebook vem sendo acusadas[5], como responsáveis pela facilitação e disseminação de notícias falsas. O Facebook com seus algoritmos de busca e o Google com seu engenho de busca, são hoje, as principais formas dos jovens terem acesso as notícias, no dia a dia.

Assim, os conteúdos falsos podem agir como uma “arma” ilegal contra algo. No âmbito político, por exemplo, as notícias falsas são usadas com o intuito de “manchar” a reputação de determinados candidatos, fazendo com que percam potenciais eleitores.

Quando uma notícia falsa com um título sensacionalista ou com um corpo de texto que careça de fontes concorda com determinadas opiniões pré-estabelecidas, ela tem mais chances de ser compartilhada, porque num momento de intensa polarização ideológica, as pessoas estão em busca cada vez mais de argumentos que justifiquem seus posicionamentos. Em resumo, os produtores de notícias falsas se aproveitam da ingenuidade e da falta de autocrítica e de checagem de informações.

“Fake News” não é uma novidade na sociedade, mas a escala em que pode ser produzida e difundida é que a eleva em nova categoria, poluindo e colocando em xeque todas as demais notícias. Afinal, como descobrir a falsidade de uma notícia?

Em análise das “fake news” é possível identificar ao menos 05 (cinco) tipos de meios utilizados para sua propagação.

  • “Sátira ou paródia” a meu ver a menos lesiva, normalmente são realizadas “sem intenção de fazer mal, mas tem potencial para enganar”;
  • “Falsa conexão” que se dá quando a “manchete” ou “chamada” da notícia trazem visuais que não dão suporte ao conteúdo. Esse tipo de “fake news” é feito devido uma má política de jornalismo ou visando o lucro de determinados sites. Nesse último caso, os títulos apelativos são criados para chamar atenção das pessoas a clicarem no site (clickbait), apenas para que os donos das páginas possam ganhar dinheiro com as visualizações das publicidades que têm nos artigos, por exemplo;
  • “Manipulação de Conteúdo” ou “Conteúdo Impostor” são “notícias” com fontes verdadeiras, mas que são forjadas ou alteradas, apresentando conteúdos falsos, de um modo capaz de manipular o público menos atento. Por exemplo, apresentação de imagens falsas ou adulteradas para “enganar” uma informação genuína;
  • “Falso Contexto” nesse caso, a informação da notícia é totalmente verídica, mas está sendo usada fora do seu contexto original. Um exemplo, é uma notícia antiga sendo utilizada como se fosse recente.
  • “Conteúdo Enganoso” ou “Conteúdo Fabricado se trata de apresentação de um conteúdo 100% falso, projetado com o propósito de causar a desinformação, enganar as pessoas e fazer o mal. Pode ser usado em várias situações, principalmente com caráter partidário, influência política ou estratégia de propaganda.

Como se observa, não é tão fácil descobrir uma notícia falsa, pois há a criação de um novo “mercado” com as empresas que produzem e disseminam “Fake News”, constituindo verdadeiras indústrias que “caçam” cliques a qualquer custo, utilizando de todos os recursos disponíveis para envolver inúmeras pessoas que sequer sabem que estão sendo utilizadas como peças-chaves nessa difusão.

Infelizmente é muito comum o uso das primeiras vítimas como uma espécie de elo para compor uma corrente difusora das “Fake News”. Assim, aquelas pessoas que de boa fé acreditaram estar em contato com uma verdadeira notícia, passaram – ainda que despercebidas – a colaborarem com a disseminação e difusão dessas notícias falsas.

Tudo isso é facilitado pelas redes sociais (Twitter, Facebook, Instagram) e aplicativos de mensagens, como por exemplo o WhatsApp. Tal fato se constitui ainda pela existência de “câmaras de ressonância”, vulgarmente conhecidas como “bolhas”, que se dá pelo fato de as redes sociais prenderem usuários dentro de “bolhas” ou “câmaras” que concentram pessoas com a mesma ideologia de pensamento e gostos similares. Nesse contexto específico, as opiniões presas nas “bolhas” não encontram contrapontos, somente apoios, ou seja, a impressão é de que as opiniões expressadas são o senso comum de toda a nação. Dessa forma, os usuários presos nas informações direcionadas não encontram argumentos contrários.

Além das notícias falsas, existe ainda o perigo dos bots – softwares automatizados para disseminarem, em massa, conteúdos partidários em redes sociais – com o intuito de influenciar discussões políticas sobre determinados temas. Só no Twitter, cerca de 20% de todas as mensagens de apoio a políticos podem ser, na verdade, interações falsas feitas por bots.

Outro ponto preocupante é o fato de o Tribunal Superior Eleitoral TSE, por meio da Resolução 23.551/2017, ter liberado para este ano a possibilidade de campanhas políticas comprarem “impulsionamento” de postagens em redes sociais para divulgação de ideias. As chances desse tipo de postagem paga, deixarem as câmaras de ressonância ainda mais fechadas, são altas.

É interessante também fazer um paralelo com o escândalo da Cambridge Analytica no Facebook, no qual 87 milhões de pessoas tiveram seus dados vazados e utilizados na campanha do atual presidente dos EUA, Donald Trump[6].

Voltando as Eleições dos EUA, que possui o exemplo mais famoso da influência da “fake news”, onde foi descoberto que garotos da cidade de Veles (Macedônia) inundaram a internet de notícias falsas, durante a última campanha presidencial nos Estados Unidos. Um deles confidenciou a uma equipe brasileira de TV, que quando se deu conta que o público simpático a Donald Trump era mais engajado na disseminação desse tipo de conteúdo, passou a publicar apenas textos que supostamente beneficiavam o então candidato do Partido Republicano.

Era a isca para motivar quem buscava exaltar Trump ou apenas atacar seus adversários políticos, mesmo com informações que beiravam um humor absurdo, como o post que relatava o suposto apoio do Papa Francisco ao magnata americano, ou a “revelação” de que Michelle Obama era, na verdade, um homem.

Observa-se que nesse caso específico, os garotos “não” tinham a intenção de manipular o interesse nas eleições dos EUA, todavia, como foi uma forma de ganharem dinheiro através da “fábrica de cliques”, a alta disseminação dessas “fake news” apresentaram alto poder de influenciar uma grande margem de eleitores. Eis que, os garotos perceberam o que público gostaria de escutar e disseminaram diversas notícias que acabaram tendo mais empatia ao candidato Donald Trump.

No caso específico, citando por exemplo, a divulgação do “suposto” apoio do Papa Francisco a outra candidata, Hillary Clinton, também poderia ter divulgado que teria o apoio do papa, e, sim sabemos, que essa notícia falsa não teve capacidade de alterar o resultado das eleições, mas uma alta disseminação de inverdades pode ocasionar sim, influência positiva ou negativa em um processo eleitoral.

Não há indícios comprovados de que algo parecido possa acontecer no Brasil nas Eleições de 2018, mas o impacto que esse vazamento ainda está tendo nos EUA é um exemplo de como o uso de redes sociais em campanhas políticas pode ser problemático. Inclusive, tal fato também aconteceu com nossos vizinhos, na Argentina e Colômbia.

O principal impacto das “fake news” é tumultuar o processo pelo qual as pessoas recebem as informações sobre questões de interesse público, com efeitos de intensidade imprevisível, a propagação de notícias falsas têm um propósito, eis que a unidade básica da tomada de decisão é a informação. Se você está mal informado, você tomará más decisões”.

Em Palestra ministrada pelo Professor e Procurador Regional Eleitoral de São Paulo, Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, o mesmo citou um exemplo sobre uma candidata à prefeitura de um município, que estava com grande aceitação popular, teve seu contracheque publicado, às vésperas da eleição, com um valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), quando na verdade, seu salário era R$ 3.000,00 (três mil reais). Essa notícia foi responsável por apresentar uma imagem negativa à candidata que defendia direitos sociais e manifestava-se como uma pessoa simples. Após a divulgação desse dado, a candidata teve uma queda brusca em sua aceitação e acabou perdendo a disputa eleitoral, e em grande parte, devido a propagação da notícia falsa sobre sua imagem, sem que tivesse tempo ou a possibilidade de rebater a informação falsa divulgada.

Em relação à legislação no Mundo, a Malásia foi o primeiro País a criar uma lei[7]anti-fake news” do mundo[8]. A medida foi aprovada no início de abril 2018, já no final do mês e tinha seu primeiro condenado: um cidadão dinamarquês que teve de passar uma semana na prisão e pagar uma multa no valor de 10 mil ringgit (cerca de R$ 8,8 mil). A legislação, no entanto, é controversa. Críticos afirmam que o país quer conter uma dissidência e a liberdade de expressão antes das eleições gerais.

Em outros lugares do mundo, a situação é parecida. Segundo o jornal inglês The Guardian, países da União Europeia como Suécia, Irlanda e República Checa também estudam aplicar leis contra as notícias falsas. Na França, o presidente Emmanuel Macron prometeu legislação sobre o tema para as campanhas eleitorais. Na Ásia, Cingapura e Filipinas já acenaram com possíveis medidas para controlar o fenômeno. Na Índia, o governo anunciou um decreto que revogaria credenciais de jornalistas que divulgassem notícias consideradas falsas – sem definir como seriam verificadas as publicações. A reação contrária foi tão grande que a proposta foi suspensa no dia seguinte à divulgação inicial.

Em outras nações existem normas mais gerais que também endereçam o problema da desinformação – como a lei contra discurso de ódio online da Alemanha e a lei de cibersegurança da Tailândia que penaliza com prisão de até sete anos os divulgadores de mentiras online.

Segundo especialistas[9], essas legislações têm problemas similares aos projetos de lei brasileiros: não são efetivos e podem ferir a liberdade de expressão, ou seja, “Nenhum dos países conseguiu resolver o problema, não existe uma bala de prata”.

No Brasil, tramita na Câmara dos Deputados aproximadamente 20 projetos que pretendem criminalizar as “Fake News”, desde a alteração do Código Penal até a responsabilização dos provedores de conteúdo nas redes sociais.

Nas eleições de 2018 não existirá NENHUMA lei que penalize as “Fake News”, todavia, haverá um controle do Tribunal Superior Eleitoral a fim de coibir interferências no processo eleitoral, cuja proporção e consequência só saberemos ao final das eleições.

Por fim, acreditamos que o tema deve sofrer debates na Câmara dos Deputados, por ser recente e de grande importância, mas é certo que sofrerá pressão dos meios de comunicação, porquanto defendem a liberdade de expressão. Ainda que, sejam aprovados penalidades e limites, não se poderá estabelecer a censura à liberdade de expressão.

*Cristopher Capper Mariano de Almeida é advogado, sócio do escritório CM ADVOGADOS ASSOCIADOS, especialista em Ciências Penais, atualmente cursando MBA em Gestão Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas – FGV e Pós-Graduando em Direito Eleitoral pela IDDE – Instituto para o Desenvolvimento Democrático.

Referências:

[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Joseph_Goebbels

[2] Clickbait, exatamente como o nome o define, é uma “isca de cliques”. Ou seja, um conteúdo feito para que o máximo de pessoas se sintam atraídas e tenham vontade de clicar nele. É comumente destinado à geração de receita de publicidade on-line.

[3] «Fake News Expert On How False Stories Spread And Why People Believe Them». NPR.org. Consultado em 17 de junho de 2017.

[4] «EGO – NOTÍCIAS – Relembre famosos que foram alvo de boatos sobre a morte». ego.globo.com. Consultado em 17 de junho de 2017.

[5] «Just how partisan is Facebook’s fake news? We tested it». PCWorld (em inglês)

[6] https://www.tecmundo.com.br/mercado/129294-fake-news-influenciar-eleicoes-2018-aponta-estudo.htm

[7] A lei fixa pena máxima de até seis anos de encarceramento e a multa pode chegar ao equivalente de R$ 385 mil.

[8] Punição contra fake news também gera polêmica no exterior. https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,punicao-contra-fake-news-tambem-gera-polemica-no-exterior,70002335229 – Alessandra Monnerat, O Estado de S.Paulo 03 Junho 2018.

[9] Virgilio Almeida, professor associado do Departamento de Ciência da Computação de Harvard.

[1] https://pt.wikipedia.org/wiki/Joseph_Goebbels

[2] Clickbait, exatamente como o nome o define, é uma “isca de cliques”. Ou seja, um conteúdo feito para que o máximo de pessoas se sintam atraídas e tenham vontade de clicar nele. É comumente destinado à geração de receita de publicidade on-line.

[3] «Fake News Expert On How False Stories Spread And Why People Believe Them». NPR.org. Consultado em 17 de junho de 2017.

[4] «EGO – NOTÍCIAS – Relembre famosos que foram alvo de boatos sobre a morte». ego.globo.com. Consultado em 17 de junho de 2017.

[5] «Just how partisan is Facebook’s fake news? We tested it». PCWorld (em inglês)

[6] https://www.tecmundo.com.br/mercado/129294-fake-news-influenciar-eleicoes-2018-aponta-estudo.htm

[7] A lei fixa pena máxima de até seis anos de encarceramento e a multa pode chegar ao equivalente de R$ 385 mil.

[8] Punição contra fake news também gera polêmica no exterior https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,punicao-contra-fake-news-tambem-gera-polemica-no-exterior,70002335229 – Alessandra Monnerat, O Estado de S.Paulo 03 Junho 2018

 

[9] Virgilio Almeida, professor associado do Departamento de Ciência da Computação de Harvard.

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