Escondido na Amazônia, há um tesouro que é pequeno em tamanho, mas grande em valor nutricional: o camu-camu. O fruto redondo e de cor vermelha, muito semelhante a uvas e com 20 vezes mais quantidade de vitamina C do que a laranja pode ajudar no combate à obesidade. Em experimento com ratos, cientistas descobriram que o extrato da fruta evita o ganho de peso mesmo com a ingestão diária de açúcar e gordura em excesso. Os resultados do trabalho foram publicados na revista especializada Gut.
O projeto inicial era entender como micronutrientes presentes em frutas e legumes contribuem para prevenir e tratar doenças metabólicas ligadas à obesidade. “Nosso maior interesse estava em uma classe de fitoquímicos chamada polifenóis, ou flavonoides”, diz ao Correio o brasileiro Fernando Anhê, um dos autores do estudo e pesquisador da Universidade Laval, no Canadá. André Marette, professor da Faculdade de Medicina da Université Laval e também autor do estudo, conta que, em trabalhos anteriores, a equipe demonstrou efeitos benéficos para a saúde de frutas ricas em polifenóis. “Tudo isso nos deu a ideia de testar os efeitos do camu-camu na obesidade e nas doenças metabólicas.”
No experimento, a equipe alimentou dois grupos de camundongos com uma dieta rica em açúcar e gordura por oito semanas. Metade das cobaias recebeu também extrato de camu-camu diariamente. No fim do experimento, o ganho de peso em ratos que ingeriram o extrato foi 50% menor do que o detectado nos amimais do outro grupo e semelhante ao das cobaias de controle, que seguiram uma dieta com baixo teor de açúcar e gordura.
Para os pesquisadores, os polifenóis do camu-camu podem ter aumentado o metabolismo de repouso nos roedores. “O estudo demonstra que o consumo contínuo de um extrato rico em dois tipos específicos de polifenóis — elagitaninos e proantocianidinas — previne a obesidade ao acelerar o metabolismo basal do camundongo”, resume Fernando Anhê.
A equipe descobriu que o extrato da fruta também melhorou a tolerância à glicose e a sensibilidade à insulina, além de ter reduzido a concentração de endotoxinas no sangue e a inflamação metabólica. “Todas essas mudanças foram acompanhadas por uma reformulação da microbiota intestinal, incluindo a floração de A. muciniphila e uma redução significativa na bactéria Lactobacillus”, detalha André Marette.
Em uma última etapa, os cientistas realizaram um transplante da microbiota intestinal de ratos alimentados com camu-camu para camundongos sem contato com a fruta. O procedimento causou benefícios metabólicos semelhantes. “Isso sugere que as mudanças na microbiota intestinal acarretadas pelo consumo dessa fruta guardam uma relação de causa com os benefícios dela”, ressalta o cientista brasileiro.
Outras fontes
A próxima etapa do estudo é averiguar os efeitos da fruta em humanos e buscar outras alternativas com efeitos semelhantes. “Podemos também especular que outras fontes de elagitaninos — como romã, framboesa nozes — e de proantocianidinas — como cranberry e mirtilo — são boas candidatas na prevenção e no auxílio no tratamento contra a obesidade”, complementa Fernando Anhê. “Outra perspectiva promissora é a purificação de polifenóis identificados como os mais eficazes contra a obesidade e a posterior utilização deles no combate à síndrome metabólica.”
Juliana Lopes Souza, nutricionista especialista em obesidade e emagrecimento da Clínica Metasense, em Brasília, acredita que o estudo chama atenção pelo fato de ser uma fruta encontrada na floresta brasileira e pelos benefícios detectados. “O efeito antiobesidade merece destaque tanto pela ação dos fitoquímicos presentes no extrato quanto pela melhora da microbiota intestinal, que exerce efeito protetor no processo de perda de peso.”
Segundo a especialista, o estudo entra em sintonia com orientações adotadas na área nutricional. “Para promover uma alimentação mais saudável, o consumo de frutas sempre é encorajado por parte dos profissionais de saúde. Dessa forma, o camu-camu ajudará a fortalecer o sistema imune e prevenir doenças, já que é uma fruta com alto poder antioxidante”, explica.
“Outra perspectiva promissora é a purificação de polifenóis identificados como os mais eficazes contra a obesidade e a posterior utilização deles no combate à síndrome metabólica” Fernando Anhê, pesquisador da Universidade Laval e um dos autores do estudo.