O sistema tributário brasileiro precisa ser revisado. No atual momento de eleições, vários partidos políticos, por meio de seus principais economistas, defendem uma reforma tributária. Não foi diferente para Paulo Guedes, economista do candidato à Presidência Jair Bolsonaro (PSL). Recentemente, ele defendeu recriar um imposto sobre movimentação financeira nos moldes da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e uma alíquota única de Imposto de Renda de 20% para pessoas físicas e jurídicas, que incidiria também sobre a distribuição de lucros e dividendos. Para discutir essas propostas, precisamos entender melhor a composição do orçamento público.
A situação fiscal nacional é preocupante. A carga tributária total representa 33% do PIB, sendo que ela não é suficiente para pagar todas as obrigações do Estado. Com um déficit público na ordem de 7% do PIB, o governo absorve 40% da riqueza nacional. Uma das formas de reduzir o rombo fiscal é aumentar a carga tributária, visto que vários países desenvolvidos apresentam uma arrecadação em porcentagem do PIB maior que a brasileira. Para se ter uma ideia, a média da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 35% do PIB.
Uma outra característica de natureza econômica do sistema tributário brasileiro é a elevada concentração da carga tributária em impostos sobre bens e serviços, respondendo por cerca de 49% da arrecadação total, ou seja, 16% do PIB. A média dos países da OCDE é de 11%. E, se o Brasil pretende ampliar sua competitividade internacional, os impostos indiretos devem sofrer reduções.
Se o Brasil pretende ampliar sua competitividade internacional, os impostos indiretos devem sofrer reduções.
Os impostos sobre bens e serviços são tributos indiretos, cuja natureza econômica incide na formação de preços dos principais produtos consumidos pelas famílias brasileiras e fere o princípio da equidade. Por exemplo, em um determinado produto é cobrado um adicional de R$ 10 no preço final em virtude da carga dos tributos indiretos. Nesse caso, todos os consumidores, independentemente de sua renda, irão pagar no preço final do bem o valor adicional. Entretanto, para as famílias mais vulneráveis e com uma renda menor, o valor de R$ 10 representa, em termos porcentuais, uma carga tributária maior. Nesse sentido, impostos dessa natureza são considerados regressivos, gerando maior desigualdade social.
Uma das grandes preocupações de Guedes é a criação de um imposto sobre movimentação financeira com foco na contribuição previdenciária. Seu destino seria financiar o rombo do INSS, isto é, um imposto com destino certo. Lembrando que a CPMF foi criada em 1997 com o objetivo de destinar seus recursos para o Fundo Nacional de Saúde e, com o tempo e a aprovação de uma nova emenda constitucional, o imposto financiou também a Previdência Social e a erradicação da pobreza. Portanto, é muito difícil o governo manter, por um longo período de tempo, o carimbo do destino dos recursos oriundos dos impostos. É preciso pensar o sistema tributário brasileiro como um todo e não focado em apenas em uma conta específica.
Ademais, a CPMF é um imposto com essa característica de regressividade, afetando proporcionalmente a população de renda menor. Os impostos diretos, e que buscam se ajustar à proporção da renda, lucro e ganho de capital no Brasil, representam 6% do PIB. É um valor proporcionalmente baixo se compararmos com referências internacionais. A média na OCDE chega a 12% do PIB.
É preciso pensar em um sistema tributário que caiba no bolso do brasileiro e, nesse caso, deve-se alterar a composição da carga tributária nacional. O foco deve ser maior na arrecadação proporcional da renda, lucros, ganhos de capital e propriedade – e menos nos impostos cumulativos sobre bens, serviços e transações financeiras. Dito de outra forma: a base da arrecadação de um Estado deve caber, proporcionalmente, no bolso dos contribuintes.
Lucas Lautert Dezordi é doutor em Economia, sócio da Valuup Consultoria e professor titular da Universidade Positivo.