Fechadas as urnas, em 2016, o PT despontava como o grande derrotado —havia perdido quase 400 prefeituras pelo país afora e conquistara apenas 4% dos municípios com mais de 150 mil eleitores. Do outro lado, o PSDB era o grande vitorioso —havia acrescentado mais de 100 prefeituras à sua contabilidade (o maior crescimento percentual entre os partidos de expressão nacional) e se preparava para governar 21,3% dos maiores municípios brasileiros, entre eles São Paulo. Dois anos depois, a forte trajetória ascendente de Fernando Haddad nas pesquisas permite dizer que sua presença no segundo turno está assegurada enquanto Geraldo Alckmin amarga um longínquo quarto lugar e encontra-se a espera de um milagre para sobreviver na eleição. O contraste impressiona. Entre 1994 e 2014, o PSDB manteve uma média de 40,5% da votação nacional para a Presidência. Agora, a dez dias da eleição, patina entre em torno de 8%. O que aconteceu?
O PSDB começou a criar a situação em que se encontra ao tramar e participar ativamente do movimento pela interrupção do mandato de Dilma Rousseff. Para além de evidenciar um baixo grau de compromisso normativo com a democracia – com o não reconhecimento da derrota eleitoral —a estratégia traçada após a eleição de 2014 terminou sendo pródiga em efeitos não esperados e negativos para o partido : (a) abreviou o calvário pelo qual passaria Dilma tendo que governar sem base no Congresso e em um quadro de aguda recessão; (b) permitiu ao PT passar a um terreno que conhece bem —o da oposição; e (c) levou os tucanos a participar do impopular governo Temer. Desse modo, enquanto o PT se recompunha, reorganizava suas forças junto à sociedade civil e encontrava um discurso político eficaz, o PSDB, na condição de sócio menor de Temer, assistia e pagava o ônus da lenta decomposição do governo.
Nesse percurso, o partido acabou sendo pego na Lava Jato. E ainda que várias de suas lideranças tenham sido envolvidas no festival de denúncias de corrupção que assolou o país, o (ainda) senador por Minas Gerais merece destaque. Tendo insistido, na campanha de 2014, que o PT precisava ser removido do cenário porque seria a razão de todos os males nacionais e, logo depois, afirmado (“por molecagem”) que havia sido derrotado por uma “organização criminosa”, Aécio Neves parecia reunir as credenciais para se posicionar na vanguarda do antipetismo. O problema é que a estratégia se viu frustrada após a divulgação das conversas com Joesley Batista e as denúncias que se seguiram. Depois de “arar o terreno”, Aécio teve que abandonar a batalha —o que ajuda a entender a facilidade com que Jair Bolsonaro emergiu e roubou a cena.
Estava delineado o desafio de Geraldo Alckmin: recuperar o protagonismo perdido por seu partido em uma campanha atípica: mais curta, marcada por uma profusão de candidatos no campo da centro-direita e pelo atentado a Bolsonaro. Acrescente-se a isso a dificuldade em adequar o perfil do candidato ao alto nível de polarização assumido pela disputa desde o seu início. Muito se especulou (e me incluo entre os que assim o fizeram) sobre qual seria o efeito, na campanha, do enorme tempo de propaganda no rádio e na TV do candidato tucano. Até agora, pode-se dizer que foi nulo. Descontada a margem de erro das pesquisas, Alckmin encontra-se onde sempre esteve. Seus cinco minutos, dia sim, dia não, ainda não foram ouvidos em meio ao clamor da batalha principal.
A esta altura do campeonato, não é impossível que o PSDB chegue ao segundo turno, mas é muito pouco provável. Uma vez que a trajetória de Haddad é irreversível, resta tentar convencer os eleitores de Bolsonaro, em poucos dias, que apenas Alckmin pode derrotar o PT no segundo turno. Dado o que se sabe sobre esse eleitorado, a tarefa não é das mais fáceis.
Ficar fora da disputa depois de 24 anos não apenas deixará o PSDB na incômoda posição de escolher entre seu tradicional adversário e a extrema direita: fará com que o partido seja deslocado da posição que manteve na liderança da oposição desde 2002, seja qual for o vitorioso nesta eleição. Por essa razão, e independentemente do que ocorrer nas disputas estaduais, 2018 poderá ficará marcado como o ano que o PSDB entrou em um período de forte incerteza sobre seu futuro.
Carlos Ranulfo Melo é professor Titular do Departamento de Ciência Política da UFMG.