Áudios divulgados nesta terça-feira (19) pelo site da revista “Veja” apontam que no último dia 12, quando ainda estava internado em um hospital em São Paulo, o presidente Jair Bolsonaro trocou pelo menos três mensagens de áudio de WhatsApp com o agora ex-ministro Gustavo Bebianno.
A demissão de Bebianno da Secretaria-Geral da Presidência foi anunciada na noite desta segunda (18), em razão da crise que se originou da suspeita de que o PSL, partido ao qual Bolsonaro e Bebianno são filiados, usou candidatura “laranja” nas eleições do ano passado.
A revelação foi feita pelo jornal “Folha de S.Paulo”. De acordo com a publicação, quando Bebianno presidia o PSL, o partido repassou R$ 400 mil a uma candidata a deputada federal de Pernambuco. Segundo o jornal, o repasse foi feito quatro dias antes das eleições, e ela recebeu 274 votos – Bebbiano nega irregularidades.
Após a reportagem da “Folha”, Bebianno negou em entrevista ao jornal “O Globo” que fosse o pivô de uma crise dentro do governo e acrescentou que, somente naquele dia, havia falado com o presidente por três vezes por mensagens de WhatsApp. Na ocasião, Bolsonaro ainda estava internado em razão de uma cirurgia.
Após a publicação da entrevista, um dos filhos de Bolsonaro, Carlos, usou uma rede social para afirmar que Bebianno mentiu ao dizer que havia falado com o presidente. “”Ontem estive 24h do dia ao lado do meu pai e afirmo: “É uma mentira absoluta de Gustavo Bebbiano que ontem teria falado 3 vezes com Jair Bolsonaro para tratar do assunto citado pelo Globo e retransmitido pelo Antagonista.””, escreveu Carlos Bolsonaro.
Carlos, e depois o próprio Jair Bolsonaro, chegaram a divulgar um áudio no qual, segundo eles, o presidente diz a Bebianno que não podia falar com o então ministro.
Os áudios revelados pela revista “Veja”, porém, mostram que Bolsonaro encaminhou três mensagens de áudio para Bebianno no dia 12, mesma data em que o ex-ministro disse ter falado “três vezes” com o presidente.
Leia abaixo a íntegra das mensagens.
Mensagens do dia 12
Nas mensagens enviadas por Bolsonaro que, segundo a “Veja”, foram trocadas no dia 12, o presidente trata de um encontro marcado por Bebianno no Palácio do Planalto com um representante da TV Globo e de uma viagem que o então ministro organizava para a Amazônia.
Segundo a “Veja”, Bolsonaro encaminhou a Bebianno uma mensagem com a agenda de reuniões do ministro no dia 12, com a previsão de que Bebianno receberia às 16h o vice-presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, Paulo Tonet Camargo. Ao receber a mensagem, segundo a “Veja”, Bebianno respondeu: “Algo contra, capitão?”.
A revista “Veja” diz que, depois de o ex-ministro insistir enviando algumas mensagens por escrito, Bebianno recebeu um áudio do presidente, em que Jair Bolsonaro declara que a Globo é uma inimiga e que, ao fazer contato com a emissora, Bebianno colocaria o presidente em posição delicada com “outras emissoras”.
Leia e ouças as mensagens:
Bolsonaro – “Gustavo, o que eu acho desse cara da Globo dentro do Palácio do Planalto: eu não quero ele aí dentro. Qual a mensagem que vai dar para as outras emissoras? Que nós estamos se aproximando da Globo. Então não dá para ter esse tipo de relacionamento. Agora… Inimigo passivo, sim. Agora… Trazer o inimigo para dentro de casa é outra história. Pô, cê tem que ter essa visão, pelo amor de Deus, cara. Fica complicado a gente ter um relacionamento legal dessa forma porque cê tá trazendo o maior cara que me ferrou – antes, durante, agora e após a campanha – para dentro de casa. Me desculpa. Como presidente da República: cancela, não quero esse cara aí dentro, ponto final. Um abraço aí.”
Bolsonaro – “Ô, Bebianno. Essa missão não vai ser realizada. Conversei com o Ricardo Salles. Ele tava chateado que tinha muita coisa para fazer e está entendendo como missão minha. Conversei com a Damares. A mesma coisa. Agora: eu não quero que vocês viajem porque… Vocês criam a expectativa de uma obra. Daí vai ficar o povo todo me cobrando. Isso pode ser feito quando nós acharmos que vai ter recurso, o orçamento é nosso, vai ser aprovado etc. Então essa viagem não se realizará, tá OK? Um abraço aí, Gustavo!”
Nota do Grupo Globo a respeito das declarações do presidente: “O Grupo Globo considera que não tem nem cultiva inimigos. A própria natureza de sua atividade jamais permitiria qualquer postura em contrário. Hoje, como sempre, sua missão é levar ao público jornalismo independente – dando transparência a tudo o que é relevante para o País – e entretenimento de qualidade. Continuaremos a trabalhar nesta mesma direção. A visita de Paulo Tonet Camargo, Vice Presidente de Relações Institucionais do Grupo Globo, ao então ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência, Gustavo Bebianno, constava da agenda pública do ministro, divulgada na internet. Visitas de diretores do Grupo Globo a autoridades dos diferentes poderes, servidores públicos, executivos de empresas e representantes da sociedade civil são rotineiras. E, nesse aspecto, não nos diferenciamos de qualquer grupo empresarial que pretenda ouvir todas as vozes de uma sociedade livre, de forma transparente e com agenda pública, mantendo relações estritamente institucionais e republicanas”.
Mensagens dos dias seguintes
Nas demais mensagens reveladas pela revista “Veja”, Bolsonaro fala com Bebianno a respeito da notícia da “Folha” sobre os supostos candidatos “laranja” do PSL e diz que “não vai dar certo” a tentativa de “empurrar” para o “colo” dele “essa batata quente”, em referência ao assunto.
Bolsonaro afirma ainda que essa suposta tentativa é uma “desonestidade e falta de caráter”. Na resposta, Bebianno se defende e explica que ele não era o responsável pelas campanhas estaduais do PSL, e sim pela campanha de Bolsonaro.
Na sequência do áudio, o ex-ministro afirma que Bolsonaro “está bem envenenado”, e que, por isso, é melhor que os dois conversem “depois” pessoalmente. “A minha consciência está tranquila, o meu papel foi limpo, continua sendo”, completou.
Bolsonaro diz que Bebianno não falou com ele nenhuma vez no dia 12:
Bolsonaro – “O Carlos incitando a saída é mais uma mentira. Você conhece muito bem a imprensa, melhor do que eu. Agora: você não falou comigo nenhuma vez no dia de ontem. Ele esteve comigo 24 horas por dia. Então não está mentindo, nada, nem está perseguindo ninguém.”
Bebianno afirma que há “várias formas de se falar” e cita as três vezes em que trocou mensagens com Bolsonaro:
Bebianno – “Eu só prego a paz, o tempo inteiro. O tempo inteiro eu peço para a gente parar de bater nas pessoas. O tempo inteiro eu tento estabelecer uma boa relação com todo mundo. Minha relação é maravilhosa com todos os generais. O senhor se lembra que, no início, eu não poderia participar das reuniões de quarta-feira, porque os generais teriam restrições contra mim? Eu não entendia que restrições eram aquelas, se eles nem me conheciam. O senhor hoje pergunte para eles qual o conceito que eles têm a meu respeito, sabe, capitão? Eu sou uma pessoa limpa, correta. Infelizmente não sou eu que faço esse rebuliço, que crio essa crise. Eu não falo nada em público. Muito menos agrido ninguém em público, sabe, capitão? Então quando eu recebo esse tipo de coisa, depois de um post desse, é realmente muito desagradável. Inverta. Imagine se eu chamasse alguém de mentiroso em público. Eu não sou mentiroso. Ontem eu falei com o senhor três vezes, sim. Falamos pelo WhatsApp. O que é que tem demais? Não falamos nada demais. A relevância disso… Tanto assunto grave para a gente tratar. Tantos problemas. Eu tento proteger o senhor o tempo inteiro. Por esse tipo de ataque? Por que esse ódio? O que é que eu fiz de errado, meu Deus?”
Bebianno – “Há várias formas de se falar. Nós trocamos mensagens ontem três vezes ao longo do dia, capitão. Falamos da questão do institucional do Globo. Falamos da questão da viagem. Falamos por escrito, capitão. Qual a relevância disso, capitão? Capitão, as coisas precisam ser analisadas de outra forma. Tira isso do lado pessoal. Ele não pode atacar um ministro dessa forma. Nem a mim nem a ninguém, capitão. Isso está errado. Por que esse ódio? Qual a relevância disso? Vir a público me chamar de mentiroso? Eu só fiz o bem, capitão. Eu só fiz o bem até aqui. Eu só estive do seu lado, você sabe disso. Será que o senhor vai permitir que eu seja agredido dessa forma? Isso não está certo, não, capitão. Desculpe.”
Bebianno relembra o presidente de episódios em que esteve ao lado dele e pergunta o que fez de errado: