Opinião: “Conservador é a mãe e a avó”

Poucos termos filosófico-políticos são tão surrados no Brasil quanto “conservadorismo” (e, consequentemente, “conservador”). Basta alguém sair a dizer que “não houve golpe em 1964”, ou que “o governo militar foi essencial e excelente para o país”, ou ainda que “as políticas de cotas são péssimas para nossa população” e pronto, com certeza conseguirá o rótulo de “conservador”. Vejam, não se trata de entrar no mérito dos pontos acima, mas de analisar o motivo da sua associação automática a essa filosofia, ou visão de mundo, o conservadorismo.

Atribui-se a Edmund Burke, filósofo escocês do século 18, a “fundação” de um pensamento estruturado ao qual se veio denominar conservadorismo. Burke no seu Reflexões sobre a revolução na França, ao analisar o que ocorria naquele país sob a liderança dos Jacobinos, demonstra o sem-número de aspectos negativos de uma revolução. Dentre muitos pontos, e de maneira impressionante, ele foi capaz de antever a ocorrência do Terror e do surgimento de um “general popular (…), a pessoa que realmente (…) será seu soberano” (Napoleão!).

/Foto: Pixabay

Reações antirrevolucionárias intolerantes no máximo são revanchismo reacionário.

Aqui reside o coração do pensamento conservador: uma revolução dificilmente resulta em grandes ganhos políticos e sociais; e ainda que venha a resultar, os custos (especialmente em termos de sofrimento e vidas humanas) são muito mais altos. Por isso, o conservador é amplamente contrário a revoluções, e se dedica a defender a moderação e, consequentemente, processos de reformas.

Nesse ponto é importante colocar que Aristóteles é considerado o primeiro pensador ocidental a abordar uma visão filosófica de mundo conservadora (em detrimento da utópica e despótica de Platão) ao defender, especialmente em A política e em Ética a Nicômaco, a necessidade de em tudo buscarmos “o caminho do meio”, a “moderação”. Isso traz à tona que, sendo antirrevolucionário, o conservadorismo é embasado num espírito moderado. Ora, reações antirrevolucionárias intolerantes, por mais que possam ser antirrevolucionárias, não são conservadoras. O conservadorismo é tão contrário à intolerância quanto o é à revolução.

Reações antirrevolucionárias intolerantes no máximo são revanchismo reacionário. Um político que, ao ter sua vitória eleitoral definida, faz um breve mas inflamado discurso de vencedor, afirmando que “vamos varrer do mapa bandidos vermelhos” – seus adversários políticos – se demonstra um revanchista, não um conservador, um indivíduo moderado.

Esclarecimentos detalhados sobre o que é o conservadorismo se encontram no livro homônimo do filósofo português João Pereira Coutinho. Nele temos um excelente trabalho de esclarecimento sobre a filosofia conservadora, bem como sobre a história da construção desse pensamento. Em meio às polêmicas sobre “ideologização” nos diferentes aspectos da nossa vida social, importa dizer que, ao não ter um ideal de mundo predefinido, o conservadorismo é a ideologia menos “ideologizada”, pois se funda em um posicionamento: agir de maneira moderada e antiutopista, ou seja, é uma ideologia posicional.

Finalmente, e de forma concisa, o conservadorismo contemporâneo é: esclarecido sobre e, portanto, respeitador da imperfeição humana; entendedor e respeitador dos pluralismos; forte defensor das tradições (justamente porque foram se constituindo de maneira orgânica e não a partir das planilhas de algum “filósofo de gabinete”); austero partidário de reformas (afinal, o que não se pode reformar, também não se pode conservar); e, fervoroso entusiasta e argumentador em prol da sociedade comercial.

O “conservador/conservadorismo” significado pelo senso comum e pela grande mídia é a mãe e a avó. Vida longa ao Conservadorismo! Agradecido, Burke e Aristóteles!

Marcos Pena Jr. é economista e escritor.

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