Caseiro constrói quartinho de bambu e comove filha que não tinha lugar para estudar

Gisele Cassin tem 21 anos e mora em Petrópolis, na Região Serrana do Rio, com os pais e dois irmãos. Bolsista do sétimo período de Direito, ela também sonha em passar para um concurso público, mas vinha enfrentando dificuldades para se concentrar nos estudos por falta de espaço e privacidade em casa.

Pai construiu quarto de bambu no quintal para filha estudar em Petrópolis, no RJ — Foto: Gisele Cassin/ Arquivo Pessoal

Pai construiu quarto de bambu no quintal para filha estudar em Petrópolis, no RJ/Foto: Gisele Cassin

Vendo a filha se deslocando do quarto, onde divide com dois irmãos; para a varanda, onde faz frio à noite e tem o barulho dos carros na rodovia; ou para a cozinha, onde ela precisava esperar todos irem dormir para estudar; o caseiro Paulo Cassim resolveu construir um quartinho de bambu no quintal.

“Eu percebia a dificuldade que ela tinha, então tive a ideia de limpar aquele espaço, cortei os bambus, amarrei com arame e montei o local. Ali é reservado, ninguém perturba”, contou Paulo ao G1.

Gisele de Petrópolis, RJ, divide o quarto com os irmãos e precisava de um lugar para se concentrar — Foto: Gisele Cassim/ Arquivo Pessoal

Gisele de Petrópolis, RJ, divide o quarto com os irmãos e precisava de um lugar para se concentrar/Foto: Gisele Cassim

O quartinho de bambu foi decorado com canecas, canetas e murais. Com relação ao mobiliário, Gisele revelou que foi tudo reutilizado.

“Por dentro colocamos panos por causa do frio. A mesa branca achamos em um lixo perto de casa. Tudo foi reciclado e o quarto é muito fofinho”, disse a estudante.

Sobre a iniciativa, ela disse: “Foi uma surpresa e um presente que ele me deu. Meu pai sempre me incentivou a estudar. Quando eu fico desanimada, lembro do esforço dele. É muito gratificante e incrível ter o pai que tenho”, disse Gisele.

Jovem passa horas no quartinho feito de bambu pelo pai estudando para concurso público — Foto: Gisele Cassim/ Arquivo Pessoal

Jovem passa horas no quartinho feito de bambu pelo pai estudando para concurso público/Foto: Gisele Cassim

A história do quartinho de bambu ganhou repercussão na internet depois que a jovem fez uma publicação em sua página na rede social, onde coloca a rotina de uma estudante de concurso.

No texto, a jovem relata a reação que teve quando viu o espaço construído pelo pai: “Eu poderia ser ingrata e pensar: não vou estudar aqui, não tem piso (é terra vermelha ainda), é frio, tem muito bicho, é perigoso, tem muita lagartixa, enfim… mas juro que a minha reação foi a maior felicidade que eu poderia ter naquele momento, principalmente pela simplicidade do meu pai, da sua preocupação comigo, e do seu amor por mim, sempre me dando o melhor que ele poderia fazer”.

Pai e filha vão juntos para a faculdade em Petrópolis, no RJ — Foto: Rodrigo Proença/ Universidade Estácio de Sá

Pai e filha vão juntos para a faculdade em Petrópolis, no RJ — Foto: Rodrigo Proença/ Universidade Estácio de Sá

No fim da publicação, ela diz ainda que o texto não foi feito para que as pessoas tenham pena dela, “mas pra te dizer que com amor, cuidado, carinho, a gente pode transformar tudo”.

A estudante disse ao G1 que não imaginava a repercussão que o post teria, mas ficou feliz em saber que está servindo como exemplo e inspiração para outros estudantes.

O caseiro Paulo Cassim no curso de direito em Petrópolis, no RJ — Foto: Rodrigo Proença/ Universidade Estácio de Sá

O caseiro Paulo Cassim no curso de direito em Petrópolis, no RJ — Foto: Rodrigo Proença/ Universidade Estácio de Sá

Sonho da faculdade em dobro

Na família, um ajuda a realizar o sonho do outro. Paulo saiu de Eugenópolis, em Minas Gerais, para oferecer mais oportunidades aos filhos em Petrópolis. Ele sempre teve o sonho de ser advogado, mas tinha abandonado por décadas.

Em 2017, foi Gisele quem o inscreveu no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e só depois contou para ele, que fez sua parte, se dedicando aos estudos nas horas vagas.

Paulo comprou uma apostila na banca de jornal e estudava diariamente depois de fazer as atividades de caseiro. Segundo Gisele, os dois conseguiram bolsa integral na faculdade. Paulo acrescentou que sem o benefício não poderiam estar juntos na universidade.

“Quando eu tinha dez anos falava para minha mãe que ia ser advogado. Naquela época era um sonho fora da realidade. Hoje, estou na universidade e o melhor de tudo é poder compartilhar com a minha filha”, conta.

O caseiro acredita que poder cursar aquilo que tem vontade é fundamental e afirma que os governos devem incentivar mais o acesso à universidade. Para quem tem facilidade em cursar o Ensino Superior, ele diz que a oportunidade deve ser valorizada.

“Meu pai não tinha estudo, mas sempre dizia que tudo que se aprende é bom e não ocupa lugar. Eu digo o mesmo aos meus filhos”, disse Paulo.

Dedicação e exemplo

Segundo Sérgio Eiras, professor e coordenador do curso de Direito do campus Petrópolis da Universidade Estácio de Sá, onde pai e filha estudam, a história da dupla é inspiradora.

“Sobre a Gisele, posso falar com conhecimento de causa e carinho do exemplo de vida e dedicação que ela é para todos que estão ao seu redor. É uma menina guerreira que apresenta um excelente desempenho acadêmico e que cativa os amigos que faz, sendo referência de esforço e superação para diversos colegas de caminhada”, contou.

Com relação ao Paulo, o coordenador afirma que todo o esforço é reconhecido e que: “seu carinho e a dedicação na caminhada para realizar seu sonho e a promoção de sua realidade é, para aqueles com quem convive e conhece, motivo de estímulo e fé”.

Para Sérgio, diante desse exemplo de força de vontade e superação há a certeza de um futuro brilhante e feliz para pai e filha.

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