Sanderson Moura: “Gladson não tem visão, nem liderança e Bolsonaro é uma aberração da democracia”

Conhecido por posicionamentos firmes e fundamentados na crítica, o historiador, advogado, professor e filósofo Sanderson Moura, publicou esta semana, em sua página pessoal no FaceBook uma opinião ácida ao governador do Acre, Gladson Cameli. Foi seu primeiro comentário público a respeito da atual conjuntura política estadual. Muito mais do que uma análise política, trata-se de uma análise filosófica contextualizada nas práxis dos atuais governantes.

Sanderson Moura, advogado, historiador, filósofo e professor./Foto: Reprodução

“Por que o governo de Gladson Cameli não tem dado certo? Ou melhor, só tem dado certo para os bajuladores? Primeiro, falta nele preparo intelectual, capacidade para ler o mundo; segundo, liderança sólida; terceiro, consciência pública do lugar que ocupa; quarto, maturidade política; quinto, conhecimentos basilares de gestão e projeto de governo; sexto, vontade de superar todas as limitações acima. Suponhamos que ele tenha vontade de superar as limitações narradas: 10 anos de estudo e prática, pelo estado atual em que ele se encontra, ainda seria pouco para ele chegar a uma nota próxima de 5. Um estadista não se forja no oba-oba de discursos vazios; nem o sobrenome substitui o talento individual.”, escreveu.

Em entrevista ao ContiNet, a análise vai além e se estende ao presidente da República Jair Bolsonaro, a quem Sanderson Moura atribui características de um ser “atávico, bruto, primitivo. Uma aberração da democracia”. O Poder Judiciário e seus privilégios também são contestados por Moura.

Acreano de Tarauacá, morador em Rio Branco há mais de 20 anos, é casado, pai de dois filhos, com atuação marcante no movimento estudantil e sindical, tendo seu nome cotado, mais recentemente, para pré-candidato ao Senado nas eleições de 2018.

Escritor, publicou três livros e só neste ano já leu 36. Fundou a Escola de Atenas em Rio Branco, que funciona em seu próprio escritório, e acredita que as mudanças que o país e o estado anseiam, só se darão pela evolução intelectual da sociedade.

Você acha que o governo Gladson não tem dado certo? Por que?

Um governo precisa ter uma visão de estado, uma visão de governo, projeto para o Estado. Ele não tem nenhum. O que ele quer para o empreendedorismo, o que ele quer para a juventude, para a arte? Então são umas coisas vazias. Falta no governo conteúdo, falta a visão e sem visão não se chega a lugar nenhum. O que eu vejo é que esse governo precisa ter visão do que quer para o Acre. Acabou a eleição, acabou campanha. Agora é governar, administrar, gerir o Estado, ter visão e projetos para a nossa sociedade. Já foram cinco meses e o governo, até agora está perdido. Não tem passado confiança para a população. Um governo não sobrevive só de propaganda, de mensagens de texto curto. O povo quer ver serviço.

Mas não sou um otimista. Não vivo a minha vida com pessimismo. Vejo que é possível ele melhorar essas condições do Estado, mas para isso é preciso visão, conteúdo, aperfeiçoamento, seriedade. E, infelizmente, eu não consigo ver isso a curto prazo. No entanto, estão aí as possibilidades futuras, abertas para que se possa acertar o rumo das coisas no nosso estado.

Você votou em Gladson Cameli?

Não. Eu votei em um professor, filósofo, intelectual. Votei no David Hall. Fui oposição ao governo do estado em 20 anos do PT, mesmo assim não votei nele. Votei no professor David Hall porque vi que ele tinha melhores condições de governar o Estado mesmo não tendo partido, não tendo estrutura, mas por uma questão de consciência eu votei nele.

O que acha que falta para que o estado alavanque?

Falta um líder. Falta um homem de visão. Eu não acredito que as coisas aconteçam sem ter um líder na frente que tenha visão e saiba aglutinar as competências das pessoas e colocá-las no seu devido lugar para gerir um Estado. Isso se chama “master mind”, a pessoa pode não ser boa em tudo, mas ele é bom, pelo menos, em gerir as competências das pessoas da sociedade, colocar as pessoas competentes nas secretarias, pedir resultado, eficiência na administração e ter consciência do lugar que está como governador. Então falta esse líder e isso é ele se aperfeiçoando. É ele com ele mesmo. Deixar de ser só um político e ser mais técnico. Passar a ser mais gestor, administrador. Governador que é só político, o povo padece. Ele tem que ser mais do que isso. Tem que ser um estadista.

Você tem alguma pretensão política, no sentido de concorrer a algum cargo eletivo?

A presença na política á algo que acompanha a minha formação. Sou historiador, fui professor de História, sou advogado e sou formado em Filosofia, tive uma atuação no movimento sindical, então tenho uma inserção na sociedade pelas opiniões que tenho e que publico. Então é natural que eu possa ter alguma pretensão política. Agora não vi o momento adequado ainda, o momento certo. Em alguns momentos já tentei e não deu certo, mas eu tenho uma intuição comigo de que o momento certo vai chegar para que eu possa dar a minha contribuição ao Estado do Acre. Não sei qual é esse momento, mas eu vou estar de prontidão, à espera do momento adequado para que eu possa colocar também a minha visão de administração desse Estado ou da Prefeitura ou de algum outro momento. Eu acredito que vai chegar o momento e que não é muito distante. O “oba, oba” vai passar, quando a população vai realmente se interessar em colocar homens de visão no comando das coisas.

É verdade que você já leu 36 livros no ano de 2019?

Eu gosto de ler. É uma coisa que eu trago desde criança. O hábito de ler. Então esse ano eu li 36 livros e publico a numeração como forma de incentivar as pessoas a lerem também e tem incentivado muitas pessoas a gostarem de ler, a publicarem os livros que leram e isso é uma contribuição da gente incentivando o hábito da leitura e do conhecimento. Eu acredito na transformação de uma sociedade pelo conhecimento, pela competência das pessoas em crescerem intelectualmente, em suas formas de verem o mundo, as suas responsabilidades com o bem estar da humanidade. Eu acredito na Cultura, no livro, no conhecimento, na arte e na capacidade das pessoas de se prepararem para poderem administrar as coisas da sociedade, da política.

Sobre o governo Bolsonaro, como avalia as posturas do presidente?

É um atraso, como o Fernando Henrique já falou. É uma pessoa que eu não diria nem de direita porque é um negócio tão esculhambado, tão vazio. Não tem nada a ver com os liberais da direita, com os democratas que inspiraram muitos outros governos pelo mundo. Na verdade, é um homem vazio. Eu vejo o Bolsonaro falando, eu olho para o cérebro dele esperando que saia alguma coisa útil, alguma visão razoável das coisas, mas o que ele tem são ideias atávicas, primitivas. Ele não expressa ideias, ele expressa atavismo, primitivismo. É uma coisa que você vê que nem os Estados Unidos estão querendo o homem. Ele vai lá e ninguém vai, as autoridades não acompanham, ninguém que estar presente com ele. Por que? Porque são ideias estranhas, esquisitas, que não são compatíveis com o logos, da razoabilidade do homem, do pensamento do homem. Nós vivemos numa sociedade e precisamos respeitar as diferenças, a Homo diversidade, a capacidade que as pessoas tem de serem diferentes pela própria natureza. Temos que respeitar e governar para todas as pessoas, o negro, o branco, homossexual, o índio, todas as pessoas porque vivemos numa sociedade e precisamos de um governo que possa administrar não só para um grupo, uma minoria, mas que possa administrar para o conjunto de uma Nação. Que não administre só por uma Religião, mas que possa contribuir para que aconteça na sociedade a liberdade religiosa. Então é um governo atávico, fruto de uma aberração do processo democrático natural.

Especialmente em relação à Educação Pública, qual sua opinião sobre o governo Bolsonaro?

Tem coisas que são aberração da natureza, o Bolsonaro, eu diria que é uma aberração do processo democrático. Ele não tem opiniões próprias, fica ouvindo pessoas a quem ele atribui uma certa competência. Que visão um pobre coitado como esse tem de Educação? Qual a vivência que ele tem num ambiente de Universidade? Qual a vivência que esse homem tem com a cultura, com os livros, com os intelectuais do país, da Nação, com a produção científica e intelectual da História do Brasil? Nenhuma. Então o que nós vamos esperar de um homem como esse?  De um bruto. Um homem primitivo para as questões da Educação? Agora compete a nós resistirmos. Como diz Isócrates, um sofista e orador grego, que deve ser motivo de vergonha para os homens inteligentes e sensatos se submeterem ao governo dos homens primitivos, tolos. Então a educação não pode se submeter ao governo de um homem tolo e vazio.

Sobre o Judiciário, o que você pensa dos privilégios aos ministros do STF e desembargadores?

Privilégios de Poder tem que acabar. Isso é coisa de um povo incivilizado, coisa de Estado incivilizado. O padrão de espelho, de exemplo, de modelo são as Nações mais desenvolvidas da Europa. É só ver quais os privilégios que lá tem juízes, desembargadores, ministros e deputados e governadores. São os mais básicos, basilares, aqueles que não se pode abrir mão. Agora privilégios estúpidos como auxílio paletó e auxílio moradia, são de um Estado coronelista, ainda muito corporativista comandado por grupos que se acham donos da Nação e isso tem que acabar de uma maneira ou outra, mas primeiro tem que elevar a consciência do povo para que tenha base para que essas mudanças possam acontecer porque se o povo concordar, se o povo não reagir… o povo é maior que o Poder Judiciário, que todas as pessoas, agora tem que se manifestar de forma mais consciente e não atabalhoada e manipulada por demagogos e populistas de Direita ou de Esquerda.

E para finalizar, politicamente, quem te inspira?

Meu grande inspirador é Péricles, um homem que governou Atenas por 40 anos na Grécia Antiga e tornou aquela cidade um exemplo de Cultura, de beleza, de desenvolvimento, de prosperidade e de esplendor. Eu me inspiro na administração e na visão de um estadista como Péricles que transformou a cidade de Atenas numa cidade modelo para o Mundo e até hoje os estudiosos estão se inspirando no desenvolvimento daquele povo do Século V antes de Cristo. Minha inspiração são os gregos e quando se fala do ponto de vista político, é Péricles.

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