Opinião: “Maioridade penal e (des)proteção integral”

Quando se debate o tema da redução da idade da imputabilidade penal, costumam digladiar-se argumentos de política criminal que, em essência, opõem o combate à criminalidade e o princípio constitucional da proteção integral à infância e juventude. Falso dilema: o combate eficaz à criminalidade nada tem de incompatível com a proteção de crianças e adolescentes. Ora, que espécie de celerado seria contra protegê-los, garantindo-lhes pleno e sadio desenvolvimento? O que realmente importa analisar é se a absoluta irresponsabilidade penal de menores delinquentes de fato protege a juventude brasileira.

A jovens sem limites nem rumo ofertam-se garantias superiores às dos criminosos em geral.

Uma contracultura que veste nos jovens a máscara da rebeldia, infundindo-lhes a crença de que, sem necessidade de contrapartida, são credores ilimitados da sociedade, fortalece em suas vulneráveis mentes o espírito de rebanho.

Seduzidos pela lisonja generalizada, nossos jovens anelam a máxima liberdade enquanto entregam-se à tirania dos tipos mais perversos que uma cultura corrompida até a medula pode produzir. Eis o resultado inevitável de um paternalismo desmedido em que as lentes cor-de-rosa de especialistas enxergam, em marmanjos plenamente conscientes da ilicitude de suas condutas criminosas, criancinhas arteiras de 5 anos de idade.

Uma sociedade que sacrifica sua juventude de forma tão abjeta não pode dar mostra mais retumbante da perda do próprio instinto de sobrevivência. Acometidos de um surto de complacência suicida, pretextamos dar a crianças e adolescentes “proteção integral” censurando qualquer tipo de limite eficaz sobre sua conduta, por mais destrutiva que seja. A pusilanimidade que reluta em reconhecer a responsabilidade moral de indivíduos que roubam, traficam drogas, estupram e matam é a fórmula corruptora que, com requintes de flacidez pedagógica, entorpece as almas juvenis com o combustível da presunção e do ressentimento, empenhadas até as últimas consequências na destruição de uma nação que clama, de joelhos, pela própria extinção.

Jung ensinou a observar as consequências para compreender as motivações das decisões humanas. É ilusão crer que a inimputabilidade de jovens de alta periculosidade armados com fuzis, gerentes de boca de fumo e integrantes de facções criminosas tenha algo a ver com a proteção de meninos levados que não sabem o que fazem: é, antes, caudatária de uma política criminal frouxa e ineficaz, serva do bilionário negócio do crime organizado, receita para que a sociedade perca qualquer autoridade sobre os jovens, cujos limites e valores restam a cargo de traficantes, rappers apologistas do crime e coetâneos alucinados. Consolida-se um nicho de mercado que investe pesado em crianças e adolescentes sem perspectivas, por considerá-los mão de obra de grande utilidade e baixo custo.

A jovens sem limites nem rumo ofertam-se garantias superiores às dos criminosos em geral, carta branca para impor seus caprichos a todos, enquanto úteis aos propósitos dos senhores do crime. A supressão do princípio da responsabilidade é aliada dileta da quebra calculada da ordem, ansiada, defendida e festejada pela orquestra formada por bandidos e ativistas em geral, reais destinatários da proteção integral de um sistema que, por motivo de sobrevivência, precisa mudar urgentemente sua mentalidade.

Leonardo Giardin de Souza é promotor de Justiça e co-autor de “Bandidolatria e Democídio: ensaios sobre garantismo penal e a criminalidade no brasil”.

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