Opinião: “Estados e municípios precisam voltar para a reforma da Previdência”

A reforma da Previdência não diz respeito a uma promessa de campanha ou à tentativa de ajustar os números. A questão é mais profunda, diz respeito ao bem-estar social da nossa nação e ao nosso progresso.

Vamos tomar por base o tripé segurança-saúde-educação, papel importante do Estado como prestador de serviços para a sociedade. Sentimo-nos a cada dia mais inseguros, mais mal atendidos no sistema de saúde e distantes de muitas outras economias nos quesitos de educação (inclusive na América Latina). Os reflexos estão na baixa produtividade do capital humano, e reverter essa falha é essencial para impulsionar o crescimento econômico.

Contudo, qual a relação da reforma da Previdência com a produtividade e, consequentemente, com o crescimento? Os investimentos públicos em segurança, saúde e educação, quando eficientes, promovem a melhoria na qualidade de vida do capital humano; logo, atuam diretamente no desempenho das pessoas no mercado de trabalho, aumentando sua produtividade.

Se a maioria dos estados e municípios apresenta déficits financeiros e atuariais, não está cumprindo o artigo 40 da CF.

Claro, é horrível para qualquer geração ter de mudar a estrutura da Previdência quando chega “a sua vez”. Mas a reforma da Previdência prevê uma economia de R$ 350 bilhões, em dez anos, para estados e municípios. O leitor consegue imaginar o que é possível devolver em forma de ativos para a sociedade? Dados da Secretaria do Tesouro Nacional (STN) demonstram que o déficit quase dobrou nos últimos anos. Em 2014, estava na ordem de R$ 42,4 bilhões, passando a ser de R$ 91,87 bilhões em 2017. A receita previdenciária chegou a R$ 117,35 bilhões em 2017; as despesas, a R$ 209,33 bilhões.

A razão de dependência, a relação entre o número de servidores ativos e inativos, deixa mais claro ainda o problema. Os ativos contribuem e os inativos recebem. Segundo estudo da Instituição Fiscal Independente (IFI) publicado em junho, são necessários oito ativos para financiar um inativo; qualquer número inferior a este tende a gerar déficit previdenciário. Em 2017, a média de todos os 27 estados era de 1,13 para 1.

O artigo 40 da Constituição Federal prevê que “o regime previdenciário deve observar critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial”. Se a maioria dos estados e municípios apresenta déficits financeiros e atuariais, não está cumprindo o artigo. Tal deficiência é suprida por aportes do Tesouro. Além disso, a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) estabelece um limite máximo para gastos com pessoal. Entretanto, os dispositivos da LRF não preveem uma regra clara em relação aos gastos mínimos em investimento público. Uma vez que inexistem esforços fiscais no sentido de racionalização da estrutura de gastos com pessoal, que inclui a parcela de despesas com inativos e pensionistas, o investimento passa a desempenhar um papel de variável de ajuste, sempre que os gastos com pessoal ultrapassam aquele limite.

A reforma da Previdência em nível subnacional torna-se um imperativo, uma vez que a falta desse tipo de equacionamento irá gerar um comportamento explosivo dos gastos com pessoal e, consequentemente, do endividamento dos entes federativos, o que, por sua vez, comprometerá a capacidade de investimento do setor público em infraestrutura, saúde, educação e saneamento, variáveis-chave para o crescimento.

Jackson Bittencourt é economista, doutor em Economia Regional e coordenador do curso de Economia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

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