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Aos 85 anos, com estrela de ouro no dente, Darli continua durão e ‘cheio de mulheres’

Por WANIA PINHEIRO E TIÃO MAIA, DO CONTILNET

Como na canção de Caetano Veloso, para ser jovem de novo só falta mesmo um dragão tatuado no braço. Porque até a última moda entre os jovens, de tatuar o dente em ouro com símbolos, como uma pequena estrela, isso ele tem. Aos 85 anos, o fazendeiro Darli Alves da Silva, que cumpriu uma condenação de 19 anos e meio de prisão pelo assassinato de Chico Mendes, crime cuja autoria – atribuída a seu filho Darci Alves Pereira – ele continua negando, está mais jovem do que nunca.

A começa pela dentição. Nem de longe sua boca lembra o homem de dezembro de 1991, sentado no banco de réus, em Xapuri, ao lado do filho, que escondia o que restara dos dentes com um lenço que um dia fora branco. Os cabelos, mais esbranquiçados do que há 30 anos, estão alinhados, sob um boné também estiloso como convém a um agora corretor de imóveis, que viaja pelo interior do Acre em busca de comissões com este tipo de negócio.

Foi assim que a reportagem do ContilNet foi encontrá-lo no município de Feió, no final de semana que passou. Atendendo um pedido da repórter Wania Pinheiro, o velho fazendeiro resolveu falar, ainda que atropelando a língua portuguesa. Sobre Chico Mendes, disse que não tem remorsos em dizer que ele queria entregar a Amazônia para os estrangeiros e diz que o ex-presidente Lula, se não tivesse sido preso, teria comunizado o país, assim como o sindicalista assassinado.

O presidente Jair Bolsonaro, na sua visão, é um homem colocado no poder pelas mãos de Deus. Aliás, o nome de Deus é pronunciado com sofreguidão pelo velho fazendeiro. A seguir, os principais trechos de uma entrevista exclusiva:

Darli foi localizado pela reportagem do ContilNet no município de Feijó/Fotos: Wania Pinheiro/ContilNet

Eu quero saber, senhor Darli Alves, já que estou encontrando com o senhor depois de muitos anos, o que tem feito para estar com esta aparência tão boa, para estar até rejuvenescido assim?

Darli Alves – No meu entender é que eu nasci uma pessoa protegida por Deus, porque desde criança eu trabalhava e trabalho até hoje. Para estar como estou no momento acho que é arrebatamento de Deus. Quando eu estava em Brasília, Deus me falou que… Eu estava preso em Brasília, muito triste e perdendo tudo o que tinha, amigos, famílias, terras e o meu gado vi descendo rio abaixo… estava perdendo tudo e ai veio uma voz na minha consciência e falou comigo, como um arrebatamento, que tudo estava acontecendo comigo… tudo que eu estava perdendo, eu ia ter, tudo o que eu gostava eu ia ter de novo e essa palavra foi cumprida. Ultimamente (a mesma voz) falou que, quando eu tivesse 65 anos, ia me dar mais 20 anos. Eu tinha no meu coração que ia viver 65 e quando me falaram que eu ia viver mais 20, eu sabia que era Deus porque um dia meu sogro pegou na minha mão e disse que se eu vivesse até 45, eu ia alcançar 65. Então cheguei aos 45 e eu era perseguido desde criança. O pessoal levantava falso de mim e provava na minha cara. Até meu pai, quando eu estava certo com meus irmãos, meu pai batia era em mim. Eu fui perseguido injustamente. O que aconteceu comigo no Acre aconteceu sem eu querer porque não vim pra cá para fazer mal a ninguém. A sociedade sabe que vim para cá para trabalhar, para plantar café…

O senhor chegou aqui em que ano mesmo?

Eu cheguei em 1974. Eu trouxe 12 famílias. Paguei três caminhões para trazer todo o pessoal que trabalhava para mim. Quem trabalhava para mim, tinha direito à terra. Para todos eles eu dei terra. Eu comprei terra que já tinha nome de Fazenda Paraná. Deixei de comprar seringal porque tinha posseiro e lá (na fazenda) não tinha posseiro. Paguei três vezes o preço a mais para não entrar em conflito com ninguém. A Fazenda Paraná tinha três mil hectares. Fiz 12 casas para botar lá as famílias. Todos que trabalharam comigo, ninguém teve problema comigo. Eu cuidava deles. Levava para o médico, até os vizinhos meus… Eu tinha fama que gostava de mulher, mas nunca tive problemas por mexer com mulher de empregado meu. Toda vida eu respeitei. Infelizmente, eu nasci para ser perseguido. Até hoje pessoas levantam falso de mim. Já guerrearam contra mim e uma voz falou no meu ouvido: estou contigo e em toda guerra que você for, é vencedor, e ainda pediu e ainda para eu olhar na minha mão. E eu faço questão de mostrar minha mão a qualquer um (e mostra a palma da mão direita com centenas de listrinhas).

E o que tem nesta mão, seu Darli? Que mão é essa?

Eu fui clamar com Deus porque eu estava muito perseguido. Fui atacado por pessoas que queriam me roubar lá em Brasília duas vezes e não aconteceu nada comigo. Eu tava com um telefone na mão e resisti, mas eu não sabia que aquele telefone ia virar um revólver – todos os dois correu (sic). Foi coisa de Deus.

Eles pesaram que o telefone era um revólver? Mas tem muitas marcas na sua mão. Muitas listrinhas. O que significa isso?

Significa que Deus mandou eu oiar (sic) na minha mão, eu oiei (sic), fiquei mocionado (sic) porque eu mesmo me admirei de ter muito riscos diferente das mãos de todo mundo. Por isso, fiquei mocionado (sic) e é uma prova de que Deus… tem uma parte na Bíblia, não sei se é em Isaias, que disse assim: eu lhe conheço desde o ventre da tua mãe, mesmo que tu não me conheça. Se tiver dez mil pessoas contra ti, não temereis e se tiver um mar de gente, eu sou o Senhor, teu Deus. Não tem nenhum ser humano que diga que eu já tive medo algum dia. Levantou-se um monte de gente contra mim, querendo invadir (a fazenda), querendo me matar, tirar minha vida, mas Deus me protegeu. Já levei tiroteios diversas vezes. Eu não gloreio (sic) por isso não, gloreio (sic) por Deus, que tá no céu.

O senhor continua morando em Xapuri? Como é sua vida lá?

Eu continuo. Lá em Xapuri eu ando só de chinelo. Eu não tenho nenhum inimigo. A família do Chico Mendes, que eu deveria ter cismas com eles, eu quero o bem para eles. Eu quero que eles se .. (diz algo próximo a estrutura). Quero eles se dê I(sic) bem, que vivam como cidadão.

O senhor se dar bem hoje com a família do Chico Mendes?

Eu nem conheço eles. Se eu chego lá, e se baterem no meu ombro, pode ser qualquer um deles, eu viro para trás e já sei que é amigo meu. Eu não tenho nenhum inimigo. De 2002 para cá… eu olhei para a minha mão e falei assim para Deus, eu jurei: com a minha mão direita, eu não quero tirar sangue de ninguém e nem com a mão esquerda e nem enfiar as mãos no bolso para tirar dinheiro para mandar matar ninguém.

Se começasse tudo de novo hoje, o senhor acha que teria acontecido o que aconteceu entre o senhor e o Chico Mendes?

Lá na Bíblia tá assim: eu cumprirei o desejo do teu coração. No momento em que disse nunca mais quero puxar a cadeia que eu puxei, e eu achava que não aguentaria puxar nem uma semana de cadeia e eu só aguentei porque Deus me proteção.

Aos 85 anos, Darli diz que ainda é muito disputado pelas mulheres/Foto: Wania Pinheiro/ContilNet

O senhor ficou preso quantos anos?

Eu passei na cadeia 18 anos. Como preso, sempre fui muito bem tratado. Nunca apanhei nem de preso nem de polícia. Mas eu só consegui isso porque nunca fui bandido.

Quando o senhor estava preso e na época que o senhor conseguiu aquela fuga, como é que conseguiu aquilo lá?

Aquilo lá aconteceu porque eu tinha amigo que dizia: se você quiser fugir da cadeia, espera que a gente te ajuda. E eu dizia: não, se algum dia eu quiser fugir, eu dou meu jeito. E na hora em que sai da cadeia, ninguém me ajudou. Na hora em que subi no muro e desci, levantei os dois braços para cima e disse: meu Deus, estou solto e vou trabalhar (e desata rir após esta declaração…).

E o senhor foi para onde, seu Darli?

Eu fui para o Pará. Cheguei no Pará e lá eu pensava que não devia nada. Eu andava para baixo e para cima. A polícia até chamava eu para ir à delegacia. Dizia (sic): você parece fazendeiro, ajudar a botar pneu no nosso carro (rindo novamente). O carro da PM parava o carro ao meu lado, mas eu não tinha medo. Não tinha medo de nada, Deus me deu coragem.

E quando o senhor foi descoberto, como foi?

Não… primeiro fiz amizade lá com a polícia lá. Queriam botar eu como subdelegado do interior lá.

Como subdelegado já? Qual era a cidade?

A cidade era de Acilândia (a pronuncia correta da cidade é Medicilândia, distante 904 quilômetros de Belém).

E por que o senhor fugiu para o Pará? Tinha algum conhecido lá?

Fui porque meu filho já estava lá. Eu fui para ficar no Goiás, mas não deu para ficar lá aí eu fui para o Pará.

O senhor é de Umuarama (PR)?

Não, eu só morei 14 anos lá. Lá eu mexia com tudo. Era algodão, era soja, milho…

O senhor nasceu onde mesmo?

Eu sou mineiro de Minas Gerais, de Conselheiro Pena.

Seu Darli, eu vou voltar a um assunto que é sempre muito comentado: as suas famosas garrafadas. O senhor já parou de mexer com isso ou continua tomando alguma coisa. Porque o senhor está muito bem, o senhor tem que tomar alguma coisa…

(rindo…) Quero dizer para você assim: eu me pego muito pela Bíblia. E Deus me disse assim; tudo o que você perdeu, você vai ter. Quando acabou… se Deus cumpre o desejo do coração da gente, se eu gostava de mulher – gostava não; gosto, mesmo com minha idade…

Além disso, do que o senhor gosta?

De tudo isso que está acontecendo comigo. É gado, que tenho, e na minha propriedade eu vi meu gado descendo rio abaixo de pés para cima, mas eu recuperei tudo. Porque eu sou assim: se for de vender uma vaca que está mojando (tempo de prenhez, que o animal leva para parir) para eu comer, eu prefiro ir na mata e pegar um palmito para comer e deixar a vaca lá. Eu sou assim. É por isso que eu tenho as coisas.

O senhor é um homem “seguro”, mão fechada?

Eu sei investir. Deus me deu sabedoria.

E o senhor gosta de quê? Disse que gosta de gado e de que mais?

De gado. Não posso ter inimigos porque eu gosto só de amigos e eu não tenho nenhum inimigo. Quero dizer para a sociedade que eu não tenho nenhum inimigo e que posso a andar na rua sem nenhuma arma de fogo, sem nenhuma malícia. O cara pode chegar nas minhas costas e bater que eu sei que é meu amigo, porque eu não tenho inimigo.

E mulher, o senhor ainda continua gostando de mulher?

(rindo…) Ainda tou meio famoso por causa disso. Tem umas brigando umas com as outras…

Ainda tem mulher brigando por causa do senhor?

Se eu deixar meu telefone na casa de uma, a outra descobre e aí é uma briga.

O senhor tem quantas ainda hoje?

(rindo mais ainda…) Não, eu não vou ser gabola não…

O senhor tem cara de danadinho!

Sou, mas não vou me gloriar por causa disso não. Glória só a Deus…

Quero dizer que o senhor está muito bem. O senhor quer deixar uma mensagem para os acreanos?

Minha mensagem é que estou aqui em Feijó, visitando uma família que é amiga minha. O pai desta família já faleceu, mas a amizade continua porque eu cheguei aqui há uns cinco anos para trás, quando ele ainda estava vivo, e ele falou que eu passasse uma semana aqui que ele ia me carregar no braço. Ele morreu, mas a família dele continua sendo minha amiga e isso para mim é uma honra.

Mas, além disso, o que o senhor veio fazer em Feijó?

Vim atrás de negociar umas terras para uma família de amigos meus que moram em Uberlândia. Estou atrás de pegar uma comissão deles para ganhar algum dinheiro para ajudar a minha família, que é muita gente. Eu tenho bastante filhos.

O senhor tem quantos filhos?

Eu tenho 26 filhos.

E quantos netos?

Neto eu não sei nem contar não. Se e a gente for em Brasiléia ou Xapuri para fazer uma festa, só a minha família enche o clube.

As mulheres brigam pelo senhor. E o senhor não briga com elas?

Não, felizmente não. E até hoje, nunca fiz mal nenhum para mulher. Nunca andei batendo em mulher e as famílias das mulheres com quem me envolvi, tudo são meus amigos. Se eu chegar em Minas Gerais com as famílias das mulheres com quem eu fui envolvido, tudo me dar carro para mim andar. No Paraná, eu tenho filha que mora em Curitiba, que é advogada, tem outra que é professora. Tenho irmão que é advogado. Tem três sobrinhos meus que é (sic) advogado em Xapuri e minha família tudo é pessoa de nive (sic).

O que o senhor pensava sobre o Chico Mendes naquela época e o que o senhor pensa hoje?

Eu pensava que ele era iludido pelo dinheiro. Eu acho que ele pegava lá pelo país estrangeiro para vigiar a Amazonas (sic), mas vigiava não era nada pela natureza. Era para entregar a Amazonas (sic) para estrangeiro e estalar (sic) o comunismo no Brasil. Isso aí eu falo sem remorso porque eu não estou mentindo. Ele queria acabar com a família, botar igualidade (sic). Igualidade (sic) não existe, nem os dedos da mão não são igual. Cada um de nós nasceu com uma missão para cumprir, cada um nas suas capacidades que Deus deixar Eu nasci para ser protegido por Deus desde que eu tava no ventre da minha mãe. Lá na Biblia tá dizendo: eu te conheço desde o ventre da tua mãe. Eu sou aquele que Jesus disse: infeliz daquele que mexa com meu coitadinho. É melhor que ele amarre uma pedra no pescoço e se atire no mar. Eu sou um deles, porque se um inimigo meu me perseguir, eu entrego ele para Deus e ele vai ser destruído. Eu nem peço isso a Deus, eu peço para Deus fazer o melhor para ele. Aí é Deus que vai julgar, porque eu não posso julgar ninguém. Eu acredito em reencarnação. Deus faz nascer, para a pessoa ir para a Igreja, ouvir a palavra e fazer o bem. Mas o diabo também nasce. E o diabo nasceu para matar, roubar e destruir.

Qual o significado desta estrela no seu dente?

( às gargalhadas) Isso aqui eu não sei porque não… É o símbolo da vitória…

Darli está bem conservado e continua trabalhando com terras/Foto/Wania Pinheiro/ContilNet

E essa inscrição no seu chapéu “Quem me viu, não me viu…”?

É para qualquer pessoa que levantar falso de mim, e já levantaram muito. Eu sentei na mesa de réu em Xapuri sem ter culpa nenhuma. Não tem nenhum juízo (sic) que podia botar eu sentado (ali). Fui torturado mentalmente, moralmente… me xingaram de monstro, um homem que trabaia (sic) desde a idade de 17 anos, e o corpo de jurados votaram (sic) tudo contra mim. Lá em Umuarama também votaram tudo contra mim. Mas eu nunca tive medo de cadeia porque sabia que não ficava. Uma noite um diretor me chamou e perguntou: e aquele crime. Eu disse: eu não devo nada. Pegue essa sua patente de diretor de penal e de delgado e vá se… eu não matei ninguém.

O senhor já não deve nada à Justiça?

De 2002 para cá, nada… Dizem que quem está com Deus, nova criatura é.

O que o senhor está achando do governo do Bolsonaro?

No meu entender, é um grande homem. Foi colocado lá por Deus. Você ver que queriam tirar a vida dele por causa da guerra que ele entrou. Ele fez umas quatro operações (cirurgias), foram quaro guerras em que ele entrou. Venceu. E não foi ele que guerreou. Foi Deu que guerreou por ele. Eu digo que ele vai botar o Brasil no rumo certo. E também por causa daquele marechal que ele tem do lado dele (referência ao general Hamilton Mourão, o vice-presidente da República) e os filhos dele, que são muito homem e adoram o pai deles. E o conselho que eu dou para todos os filhos é respeitar o pai e a mãe.

E do governador Gladson Cameli, o que o senhor tem a falar dele?

Do Cameli eu não tenho nenhuma experiência para falar. Eu votei nele e arranjei muito voto para ele e também para o presidente, explicando o que ia acontecer com o Brasil porque se o Lula tivesse no poder ninguém era dono de nada. Eles iam queimar tudo que era cartório, registrar nós tudo de novo e fazer assentamento de três hectares cada um e todo mundo era cativeiro, como em alguns país (sic) do mundo. E nós precisa (sic) da liberdade. Comer do nosso suor. Deus deu a terra para nós trabaiar (sic). Se eu adquiri as coisas foi com muito trabaio (sic). Eu nunca roubei e nunca fiz nada errado com ninguém.

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