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Amigos se despedem e falam da morte do poeta e jornalista Naylor George

Por TIÃO MAIA, PARA CONTILNET

Pelo menos duas mesas cativas nos bares da Nazira, no chamado Novo Mercado Velho, e da dona Ray, na frente do Varejão Popular, na Cadeia Velha, estarão vazias a partir de hoje. O ocupante delas por mais de três décadas, Naylor George Pires, foi-se “para o andar de cima”, como ele próprio escrevia em sua coluna, no jornal “O Rio Branco”, onde trabalhou por muito tempo, como repórter, redator e editor de cultura.

Mais que um jornalista comprometido com o fazer cultural, este acreano nascido no seringal Iracema, nos arredores de Rio Branco fazia 63 anos, era um poeta, escritor cuidadoso, polêmico por natureza, boêmio comprometido com o diletantismo. “O que eu mis gostava nele é que onde ele estivesse, os amigos estavam sempre por perto. Às vezes, ele acabava brigando com alguns mas logo refazia as amizades. Ele era um homem assim, sem mágoas”, disse Nazira Mamede, a comerciante do Novo Mercado Velho com a qual o poeta se relacionava como cliente desde os anos 80. “Era muito bom pagador”, elogia dona Nazira, que lhe vendia cerveja, como a muitos outros de seus clientes, na base do “caderno”, para pagar depois.

“No dia do pagamento, o primeiro freguês a chegar na Nazira ou lá na dona Ray era ele”, diz o comerciante Antônio Augusto de Melo, dono da “Banca do Pelé”, no centro de Rio Branco, um de seus muitos parceiros de boemia. “Era uma figura, às vezes encrenqueiro, implicando com quem falasse errado o português, e às vezes de coração transbordante, cheio de carinho”, acrescenta Pelé.

“Era um excelente amigo, bom papo, inteligente, culto. Enfim, um intelectual que se preocupava com a arte e com a cultura do nosso Estado”, disse outro de seus amigos e companheiro de mesa e copo, o advogado Ivo Araújo, professor aposentado da Universidade Federal do Acre (Ufac). “Polêmico às vezes, mas uma pessoa que vai nos fazer muita falta”, acrescentou.

Outro Ivo e também seu amigo, o contador de sobrenome Carneiro, que também costumava dividir mesa com ele, lembra de suas polêmicas mas também de sua ternura e de seu bom gosto musical. Fã de Caetano Veloso e da Música Popular Brasileira e dos clássicos internacionais, tinha predição  pelo paraguaio naturalizado brasileiro Taiguara – tanto é que um de seus dois filhos homens, além do jornalista George Naylor, um advogado, leva o nome do artista. Naylor teve outros filhos, muito amores mas pelo menos um casamento longo, com a artista plástica Jacqueline Mesquita, mãe de seus rapazes.

Formado em História pela Ufac, Naylor George foi contemporâneo de figuras públicas como a ex-ministra Marina Silva e o ex-governador Binho Marques, seus colegas de curso, mas era avesso à política. Era amigo do falecido governador Edmundo Pinto, de quem se dizia seguidor mas não tinha filiação partidária e não gostava de conversar sobre política.

Escreveu, entre outras coisas, quatro livros – “Decima Quinta Lembrança”, uma evocação ao Bairro Quinze, onde viveu após vir do Seringal, “Notícias de Jornal”, o “Encontro das Paralelas”, e uma última coleção de versos e pequenos contos. Os lançamentos de seus livros costumavam ser muito prestigiados. Ele era membro da Academia Acreana de Letras.

Um de deus poemas falava exatamente do instante de sua partida, como agora. “A morte, em mim, não mata nada – só o morto; de mim, a morte não leva nada, só o corpo”.

O poeta, um ser humano cheio de defeitos e também de muitas qualidades, passou para o outro lado na madrugada fria desde 18 de dezembro, após vários dias na UTI (Unidade de Tratamento Intensivo) do hospital da Fundação Hospitalar do Acre (Fundacre). Sofria de diabetes e ultimamente apresentava problemas de pulmão. Também havia ficado praticamente cego e estava com seus movimentos limitados. Foi-se reencontrar com os seus. Que de lá de onde estiver cuide dos que aqui ficam e lamentam profundamente sua prematura partida.

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