Dezembro deixou de ser, desses 2010, um mês de alegria e confraternização para a dona de casa Albertina Margarida Ferreira da Silva, de 80 anos, viúva e mãe de sete filhos – duas adotivas, natural de Epitaciolândia, interior do Acre, e que hoje vive em Rio Branco, no bairro João Eduardo. Ela vem a ser mãe do radialista, cantor, compositor e empresário Francisco Ferreira da Silva, o “Franco Silva”, assassinado aos 49 anos, na madrugada do dia 12 de dezembro de 2010, um domingo, durante um assalto dentro de sua casa. Para defender a família, Franco Silva enfrentou os bandidos, chegou a balear um deles, mas morreu com um tiro fatal, no peito, na frente dos filhos e da esposa – ele tinha quatro filhos.
O coração de dona Albertina, que já sangra a cada dezembro, deve viver novas e fortes emoções neste sábado (21) durante mais uma edição do “Projeto Conheça Seu Artista”, uma iniciativa da Escola de Música do Acre, criado em setembro deste ano com uma homenagem ao falecido cantor e compositor acreano Jorge Cardoso e que agora vai homenagear o pranteado Franco Silva. Dona Albertina, acompanhada do que lhe resta de família, estará lá, na Avenida Central, 581, no Conjunto Tucumã 2 (sede da Escola de Música), a partir das 19 horas, para as homenagens ao seu filho mais velho. Ela já conhece bem a dor da perda, porque, além do marido, Cícero da Silva, perdeu outro filho, há mais de 25 anos. O verbo perder, neste caso, é literal: seu filho Edimar Ferreira, um jovem especial que costumava vagar pelas ruas da cidade, desapareceu, literalmente, sem deixar pistas ou informações que possam apontar se ele foi morto ou simplesmente pegou a estrada e partiu, como sempre ameaçava. “A esperança dela é que um dia ele aparecesse. Mas acho que depois da morte do Franco, ela se convenceu de que o Edi também pode ter sido morto”, conta a técnica de enfermagem Edna Ferreira, uma das filhas de dona Albertina.
A homenagem da Escola de Música a Franco Silva, apesar das dores que tais lembranças devem causar a sua mãe e ao restante da família, será uma oportunidade para as gerações mais novas do Acre e que gostam de música possam conhecer um pouco deste artista talentoso. Ele começou a cantar ainda criança, na Rádio Educadora 3 de Julho, de Brasiléia, participando de concursos cujos prêmios, em dinheiro ou em mercadorias, ajudavam no sustento de uma família pobre entre os mais pobres do lugar – mesmo que dona Albertina fosse uma das filhas do fazendeiro português Manuel Ferreira, que foi um dos homens mais ricos da região do Alto Acre, cujo patrimônio se acabou com o retorno do velho a Portugal, na vira dos anos 60 para 70. Mas isso é outra história.
O fato é que Franco Silva revelou talento para a música ainda muito cedo. Quem tinha o privilégio de ser vizinhos de sua casa modesta, na chamada ladeira da Avenida Santo Dumont na vilazinha que seria transformada no município de Epitaciolândia, tinha o privilégio de ouvi-lo catar, praticamente o dia todo, em ensaios que incluíam instrumentos e palcos improvisados. Mas a voz era afinada e compensava a miséria dos instrumentos musicais.
Uma vez em Rio Branco, ele deu prosseguimento à carreira artística, gravando discos com músicas, no estilo que fiaria famoso anos depois, como forró-brega, que tocavam muito país a fora. Duas delas, “Sedução” e “Amor Temperado”, eram especiais. Além de gravar e fazer shows, era locutor na Rádio Difusora Acreana e também se tornou empresário e dono de um clube de forró no Bairro João Eduardo, o “Rabo de Saia”.
Muito movimentado, o clube era um dos poucos salões de dança de forró da região da Baixada e, claro, rendia um bom dinheiro a cada final de semana, o que chamou a atenção dos bandidos. Na madrugada daquele fatídico 12 de dezembro de 2010, ele voltava para casa, após fechar o clube, com o dinheiro da renda. Como sempre acontecia, estava acompanhado de dois seguranças, que ficaram do lado de fora, no carro, esperando que ele entrasse em casa. Era lá que á estavam os bandidos à espreita e anunciaram o assalto. Silva reagiu, mas foi vencido porque os bandidos ameaçaram matar um de seus filhos. Ele colocou-se à frente da arma cuja bala poderia matar a criança. Os dois bandidos foram identificados, condenados e presos, mas isso está longe de ser refrigério aos corações de seus amigos e familiares, principalmente de dona Albertina, a mulher que sagra a cada dezembro.