Traficante confessa que matou Matheusa: “Ficou agonizando por meia hora”

Na madrugada de 29 de abril de 2018, o traficante Manuel Avelino de Sousa Junior, conhecido como Peida Voa, dava plantão numa boca de fumo no Morro do Dezoito, em Água Santa, Zona Norte do Rio. Por volta das 3h, ele viu a estudante Matheusa Passarelli, nua e desorientada, andando pela favela e a abordou. Num depoimento gravado em vídeo, obtido com exclusividade pelo EXTRA, Manuel repassa aquela madrugada em detalhes: confessa que deu dois tiros em Matheusa e revela que, após o homicídio, o corpo da estudante foi esquartejado e queimado num tonel no alto da favela.

“Ele tava andando na rua pelado. Fui lá interrogar ele. Não conseguia falar o nome, endereço, lugar onde morava nem nada. Eu falei que ia arrumar ajuda para ele. Só que ele não aguardou e reagiu tentando tirar o fuzil de mim, botando a mão no meu pescoço e me empurrando. Peguei a pistola e dei tiro nele. Um tiro de pistola e um tiro de fuzil”, contou Manuel, se referindo à Matheusa pelo gênero masculino. A estudante se identificava como não-binária — termo usado por pessoas cuja identidade de gênero não é nem masculina nem feminina.

O relato foi dado na manhã do dia 28 de maio dentro da Delegacia de Descoberta de Paradeiros (DDPA), para onde Manuel foi levado após ser preso. O homem foi capturado num prédio em Piedade, Zona Norte do Rio, onde passou a trabalhar como porteiro após abandonar o tráfico.

Manuel ainda disse que Matheusa “ficou agonizando por meia hora” após os disparos. Aos investigadores, o traficante afirmou que queria tentar socorrer Matheusa e levá-la para fora da favela, mas recebeu uma ordem superior de um gerente do tráfico para queimar o corpo.

“Tive que amarrar com um fio e saí puxando até chegar no galão, cortar e queimar”, disse o traficante, que contou com a ajuda de mais dois homens para esquartejar o cadáver com um facão. Segundo o homem, após Matheusa, vários outros corpos já foram queimados no mesmo local.

Maheusa foi morta por traficantes/Foto: reprodução

‘Não me senti bem’

Além do depoimento em vídeo, que faz parte do processo que corre contra Manuel pelo homicídio e ocultação do cadáver de Matheus na 1ª Vara Criminal da capital, investigadores também gravaram áudios de conversas reservadas com o traficante. Num deles, ele afirma que ficou com remorso por ter matado a estudante, que cursava Artes Visuais na Uerj à época.

“Não me senti bem fazendo aquilo”, disse o homem numa conversa reservada com os investigadores gravada em áudio.

O criminoso disse que foi repreendido por chefes do tráfico da favela depois do homicídio, mas nega ter sido expulso do tráfico e da favela: segundo Manuel, ele mesmo optou por deixar a facção três meses depois do assassinato porque estava insatisfeito com a baixa remuneração e os riscos da vida do crime. “Vieram me chamar atenção, mas se eu perco o fuzil você vai chegar, querer me cobrar e me matar. Não queria matar o cara”, disse Manuel.

De acordo com o relatório final do inquérito, na madrugada em que desapareceu, Matheusa havia ido a uma festa na Rua Cruz e Souza, no Encantado, para fazer uma tatuagem na aniversariante. Logo depois, quando foi levada pela aniversariante à porta da casa para ir embora, a abraçou e saiu correndo em direção à rua, deixando sua bolsa e seu celular.

Na época, segundo depoimentos de amigos à polícia, a estudante passava por dificuldades financeiras e precisava do dinheiro que ganharia pela tatuagem. Durante a festa, no entanto, a amiga desistiu de ser tatuada, o que decepcionou Matheusa, que passou a “demonstrar intenso descontrole emocional”, segundo o relatório.

Após deixar a casa da festa, a estudante percorreu uma distância de 1,6km até chegar ao Clube da Várzea, próximo ao acesso do Morro do Dezoito. Todo o trajeto foi refeito pela DDPA, que coletou imagens de câmeras de segurança que mostram Matheusa correndo, nua, pelas vias. Além disso, agentes da especializada ouviram moradores do local, que contam ter visto a estudante entrando desorientada na favela.

Além de Manuel, outros dois traficantes respondem pelo assassinato de Matheusa: Genilson Madson Dias Pereira, o GG, e Messias Gomes Teixeira. Segundo a investigação eles ordenaram a ocultação do cadáver. Só GG segue foragido.

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