Geladeiras, fogões e sofá velhos – além de milhares de garrafas pets, de todos os tamanhos – tudo em forma de lixo industrial, foram uma das causas que impediram que a expedição técnica ao Igarapé São Francisco, que deveria explorá-lo da cabeceira à foz, no Rio Acre, num percurso aproximado de 55 quilômetros, fosse concluída. Os técnicos embarcaram pela manhã no Porto da Gameleira e subiram até a nascente do São Francisco com a intenção de retornar ao Rio Acre, na foz do igarapé, no bairro da Cadeia Velha, mas a poluição impediu o trânsito dos barcos e a expedição teve que ser interrompida para ser retomada nesta terça-feira (14).
Além do lixo industrial, os técnicos, auxiliados por homens do Corpo de Bombeiros, encontraram pelo caminho muitas árvores caídas no leito do igarapé, formando muitos balseiros, quase intransponíveis. Outro fator de dificuldade foi o assoreamento em alguns partes do igarapé, com o desbarrancamento e a terra empurrada para dentro da água, dificultado a navegação. Mesmo assim, a expedição vai continuar nesta terça-feira numa outra parte mais navegável, informou o líder da expedição, o engenheiro civil Sebastião Aguiar Dias da Fonseca, o Tião Fonseca, coordenador coordenador-geral da Comissão Multidisciplinar de Estudos para Despoluição do Rio Acre, dos Igarapés São Francisco e Maternidade e Bacias Hidrográficas (Codesco).
A Comissão foi instituída pelo governador Gladson Cameli no final do ano passado reunindo pelos menos 20 órgãos estaduais, inclusive secretárias de Estado, como as de Meio Ambiente, Pecuária e Agronegócio, Infraestrutura e Educação. Todos esses órgãos deverão produzir, em suas respectivas áreas, levantamentos com informações que possam ser apresentadas em Brasília, no Ministério do Meio Ambiente, para que o órgão comece a liberar os primeiros recursos dos R$ 120 milhões assegurados para o trabalho de revitalização do igarapé.
Os recursos foram assegurados graças ao trabalho parlamentar do senador Márcio Bittar (MDB-AC) ao qual se juntou também a deputada federal Vanda Milani (Solidariedade-AC). “A deputada tem sido importante também neste trabalho e tem ajudado muito o senador Márcio Bittar nesta causa de salvar os nossos mananciais e o nosso rio Acre”, disse Tião Fonseca.
Sobre a expedição, o engenheiro floresta Hugo Fazion de Souza, que fez parte da equipe, disse que foi possível constatar, além do lixo, as áreas de riscos habitadas às margens do igarapé. “São residências que despejam dejetos diretamente no igarapé, através de canos, e que ameaçam desabar a qualquer momento”, disse o engenheiro. “Mas, no geral, esta primeira expedição foi importante para constatarmos que a ação de recuperação do igarapé tem que ser imediata. As áreas habitadas às margens do igarapé estão sendo devastadas, com a derrubada da mata ciliar, o que contribui para o desbarrancamento”, acrescentou.
As informações recolhidas na expedição vão subsidiar um relatório a ser apresentado ao final do mês, ao ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, em Brasília. O relatório será apresentado por Tião Fonseca e a equipe técnica da Codesco. O relatório vai mostrar que o Igarapé é, hoje, um esgoto a céu aberto, sem peixes e sem vida, porque recebe produtos in natura de áreas antropizadas (onde há a presença do homem) desde a penitenciária estadual “Francisco D’Oliveira Conde”, no bairro Barro Vermelho, até sua foz, passando, antes, pelos igarapés Dias Martins, Batista e Fundo, que também recebem os esgotos da Fundação Hospitalar, incluindo dejetos hospitalares. Para se ter ideia do que isso significa, basta se olhar os números da penitenciária e do Hospital: a penitenciária movimenta, entre presos, seguranças e visitantes, algo próximo a quatro mil pessoas por mês; a Fundação Hospitalar, mais de dez mil por mês. Todos defecando e jogando outros dejetos sem tratamento nos esgotos que vão desembocar no São Francisco.
O projeto de revitalização do São Francisco em Rio Branco fará parte de um programa piloto a ser implantado no país pelo governo de Jair Bolsonaro e que pretende chegar ao rio Acre, que é apontado como o maior problema ambiental da Amazônia no Estado por causas das cheias, no período de inverno, e das secas, no período estival. De acordo com Tião Fonseca, o rio Acre e as bacias hidrográficas que o abastecem, de Assis Brasil a Rio Branco, vêm sendo estudadas desde 2016 pelo Sindicato dos Engenheiros em busca de respostas aos dois problemas anuais do rio.
Os primeiros recursos para os estudos iniciais em torno do rio Acre, R$ 5,5 milhões, devem ser liberados nos próximos dias pelo Ministério do Desenvolvimento Regional. Para a despoluição do São Francisco e outras bacias hidrográficas na Capital, os recursos iniciais são da ordem R$ 83 milhões e podem chegar a R$ 120 milhões com o desembolso de agências financiadoras internacionais que trabalham em parceria com o Ministério do Meio Ambiente.