O não-comparecimento da ex-prefeita de Brasiléia e ex-deputada estadual Leila Galvão às festas pelos 40 de fundação do PT em Brasiléia, no último final de semana, não foi uma ausência qualquer. Afinal, o município do interior do Acre, na fronteira com a Bolívia, tem, para a história do PT (Partido dos Trabalhadores), que completa 40 anos de fundação nesta segunda-feira (10), a mesma simbologia de São Bernardo do Campo, no interior de São Paulo.
Uma festa petista no município, portanto, não é qualquer evento. Mas, quem dela participou, no sábado (8), notou que a petista ilustre Leila Galvão, que exerceu dois mandatos de prefeita e um de deputado estadual pela sigla e é a primeira-suplente petista à Assembleia Legislativa, mesmo previamente convidada, deixou de comparecer ao evento.
O presidente regional do PT, o ativista Cesário Braga, minimizou a ausência e também disse não saber os motivos que levaram a ex-prefeita a não comparecer. “Sei lá”, disse Cesário sobre os motivos. “Não paramos para avaliar a ausência de ninguém. Ficamos tão felizes coma presença de tantos companheiros e companheiras que só posso é agradecer”, disse o dirigente.
A ausência de Leila Galvão não foi justificada nem por ela própria, que não tem atende a telefonemas (número de final 13) e também desapareceu da cidade. O sumiço da ex-prefeita e sua ausência à festa petista só serviram para aumentar ainda às especulações de que ela está de saída do PT e estaria de volta ao MDB, partido pelo qual surgiu para a política exercendo mandatos de vereadora, nos anos 90. Estaria de volta ao MDB pelas mãos de seu mentor político, o ex-prefeito Aldemir Lopes. Naquele sábado festivo para os petistas, uma caravana do MDB, composta pelo senador Márcio Bittar, deputada Jéssica Sales e pelo deputado estadual Roberto Duarte, além de Aldemir Lopes e dos ex-deputados Chagas Romão, João Correia e Vagner Sales, também percorriam o Alto Acre e chegou a Brasileia. Todos tinham a expectativa de que, ao faltar à festa petista, ela pudesse comparecer aos comes-e-bebes do MDB, na Pousada Moreira (cujo dono, por sinal, é um cunhado da ex-prefeita), para assinar ficha de filiação, voltar às origens na política e disputar o cargo de prefeita contra sua ex-assessora e ex-pupila Fernanda Hassem, petista candidata à reeleição e apontada como a executiva municipal mais bem avaliada do Estado e com amplas chances de reeleição.
Há quem diga que o sumiço da deputada não é por caso. Ela estaria disposta a se filiar ao MDB, tanto que, inclusive, se reuniu na manhã deste domingo (9) com importantes lideranças do partido de Ulisses Guimarães. Está mesmo na hora da onça beber água.
Brasiléia é emblemática para a historiando petismo porque foi ali que um metalúrgico, então presidente da categoria no município do grande ABC paulista, um certo Luís Inácio da Silva que ainda não havia registrado o apelido “Lula” como sobrenome, fundou, pessoalmente, aquele que seria o maior partido da América Latina.
Assim como o PT de Brasiléia se expandiu para todo o Estado ao ponto de conquistar cinco mandatos de governadores consecutivos em 20 anos, o de São Bernardo do Campo, 20 anos depois, não só se tornaria o maior Partido da América Latina com quatro mandatos na presidência da República (ainda que um tenha sido interrompido na metade).
Frase que levou Lula à cadeia pela 1ª vez foi dita em Brasiléia
Foi em Brasiléia que, em 28 de julho de 1980, Luís Inácio, agora já com o “Lula” no sobrenome e se preparando para disputar o Governo de São Paulo nas eleições seguintes, disse a frase emblemática “está na hora da onça beber água” e por tal razão acabaria preso por ordem da ditadura militar pela acusação de incitamento à luta armada, com base na então vigente Lei de Segurança Nacional (LSN).
A frase foi dita durante um ato público preparatório para a missa de 7º Dia em memória do sindicalista Wilson Pinheiro, assassinado uma semana antes, na sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Brasileia, na rua Geny Assis, centro da cidade na qual, à época, viviam menos de duas mil almas. Pinheiro, cujo nome batiza a fundação de altos estudos do PT em nível nacional, foi abatido dentro da sede do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) por um atirador que se aproveitou da energia elétrica claudicante e da luz fraca da rua que o protegia na semiescuridão para acertar três tiros no corpo do sindicalista – uma das balas varou aquele corpanzil de quase 2 metros de altura e foi alojar-se numa tábua da sede do sindicato a qual é exibida até hoje como prova de uma noite que, 40 anos depois, ainda não acabou. O atirador misterioso, mesmo após quatro décadas, nunca foi descoberto.
Sobre um caminhão improvisado como palanque, um Lula de cabelos esgrouvinhados e balançando ao vento, com a barba longa enegrecida, rosto franzido, carrancudo, a típica cara de poucos amigos, era a imagem da tensão que impregnava o ar daqueles dias nem tão distantes. Ao lado de Lula, sindicalistas como Chico Mendes, Jacob Bittar. João Maia e outros que também seriam presos por causa daquela frase. Afinal, mal acabado o ato público e com Lula já embarcado num avião monomotor de volta a Rio Branco para retornar depois a São Paulo, morria um homem, crivado de balas, com mais de 50 tiros. Era Nilo Sérgio de Oliveira, o “Nilão”, então gerente da “Fazenda Nova Promissão”, apontado como o principal interessado ou mandante da morte de Wilson Pinheiro e de outros sindicalistas que participavam das lutas pela posse da terra na região.
No entendimento das autoridades que apuraram a morte de “Nilão”, encorajados pela frase emblemática de Lula, que também disse estar cansado de andar o país “enterrando companheiros” e que, portanto, estava na hora de a onça beber água, os trabalhadores que assistiam ao discurso do líder decidiram vingar-se e lincharam o capataz de fazenda. Desde então, Brasileia entrou na agenda nacional do PT e marcou a biografia de Lula como uma espécie de sinal na pele.