Como seria se a Amazônia acabasse? Afetaria mais sua vida do que pensa

A Amazônia, maior floresta tropical do mundo, voltou a ser sendo alvo considerável de desmatamento. Em 2019, 9.762 km² da floresta vieram abaixo —foi o maior número desde 2008, quando uma área de 12.911 km² foi desmatada. Com esse fato em mente, fomos atrás de possíveis respostas para uma pergunta: como seria se a Amazônia, um dia, deixasse de existir?

A resposta mais imediata para essa questão seria dizer que, caso isso ocorresse, as consequências seriam catastróficas. É claro que nós, brasileiros, as sofreríamos de maneira mais rápida, mas o impacto do desaparecimento da floresta seria sentido em todo o mundo.

Torneira sem água, bolso sem dinheiro
A chamada Amazônia Legal brasileira —a floresta se estende por outros oito países— teria perdido 19,9% de sua área total até 2019, segundo o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o que corresponde a 796 mil km², ou mais de três vezes o tamanho do estado de São Paulo.

A umidade da floresta influencia as chuvas em boa parte da América do Sul. Menos umidade significa menos chuvas que, por sua vez, tendem a gerar crises de abastecimento de água mais frequentes e graves.
A redução da umidade não seria sentida só na torneira ou na conta de luz: o agronegócio seria diretamente afetado, o que significaria comida mais cara e um impacto imediato na economia do Brasil e no resto da América do Sul.

Saudades do que ainda não vimos
O fim da Amazônia não significaria apenas o desaparecimento de uma enorme quantidade de árvores: iria embora também a maior biodiversidade do mundo.

Considerando apenas o que já foi catalogado, há na região 40 mil espécies de vegetais e mais de 100 mil espécies de animais, incluindo vertebrados e invertebrados. Mas, isso não representa nem 5% das estimadas 30 milhões de espécies de animais que vivem na floresta.

Cientistas calculam que estamos em um ritmo de extinção que elimina entre 0,01% e 0,1% das espécies de seres vivos do planeta a cada ano. Levando em conta o percentual maior e as estimadas 30 milhões de espécies da Amazônia, todo ano 30 mil delas deixam de existir. E a maioria sem sequer terem sido conhecidas.

Soluções que desaparecem
Além da trágica extinção de espécies, com elas podem acabar a solução para diversos problemas que a humanidade enfrenta hoje. Mais de 10 mil espécies da floresta têm compostos que são usados para fins medicinais, cosméticos e para controle biológico de pragas.

No caso de espécies não catalogadas e extintas, é possível imaginar o tamanho do prejuízo que a destruição da floresta poderia representar para o futuro da humanidade.

Pulmão do mundo? Não, termostato
Você provavelmente já ouviu a expressão “a Amazônia é o pulmão do mundo”. Na verdade, a maior parte do oxigênio produzido pela fotossíntese da vegetação acaba sendo consumido pelas próprias plantas e pela fauna local.
Ainda assim, a floresta funciona como uma grande “prisão” de carbono, e assim, atua como um “termostato” para todo o planeta. Em sua fase de crescimento, as árvores demandam uma grande quantidade de carbono que pode ser considerada a matéria-prima da vida. Elas tiram a substância do dióxido de carbono (CO2) presente na atmosfera.

A partir daí a conta é simples: quanto menos gás carbônico na atmosfera, menos efeito estufa e controle do aquecimento global. Por isso, “plantar árvores” é considerado um dos principais antídotos para reduzir as alterações climáticas causadas pelo homem.

Com a floresta no chão, a conta se inverte: cada árvore derrubada significa mais carbono liberado na atmosfera, aumento do efeito estufa e efeitos ainda mais perceptíveis das mudanças climáticas.

Planeta em fúria
Costuma-se associar o aquecimento global única e exclusivamente ao aumento de temperatura. Mas a tendência é que fenômenos climáticos, como chuvas torrenciais, ondas de calor, nevascas, furacões etc. fiquem mais extremos conforme essas mudanças climáticas aumentem.

Sem contar o derretimento acentuado de geleiras, cuja consequência mais direta é o aumento do nível dos oceanos —o que pode inviabilizar a existência de várias áreas costeiras hoje ocupadas por cidades.

Ah, e não apenas o nível do mar iria subir: o pH da sua água ficaria mais ácido, ameaçando a vida das algas —estas sim, são o “pulmão do mundo”. Menos oxigênio e mais gás carbônico no ar geram um cenário extremamente prejudicial à saúde dos seres vivos —o que, claro, inclui os humanos.

O ciclo do desastre
A relação entre a floresta e a temperatura do planeta é tão íntima que qualquer alteração nociva acaba gerando uma espécie de ciclo do desastre. O desmatamento contribui para o aquecimento global que, por sua vez, acelera a destruição da floresta. Afinal, o clima mais quente e seco torna a área propensa a incêndios. É um processo destrutivo que alimenta a si próprio.

Fácil de destruir, difícil de recuperar
Ao contrário do que a exuberância da floresta pode dar a entender, o solo da Amazônia é arenoso e pobre em nutrientes. O que mantém a floresta em pé é o ciclo de reposição de nutrientes promovido por folhas e outras matérias orgânicas mortas decompostas.

Sem esse cenário, é bastante provável que a área, com o tempo, caminhe para um processo de desertificação, com consequências desastrosas para o clima do mundo. Para piorar, esse tipo de solo torna o processo de reflorestamento da área mais complicado —e muito mais demorado do que o desmatamento.

Fontes: Ana Bonassa, bióloga e doutora em ciências pelo Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP)
Wagner Costa Ribeiro, professor do Departamento de Geografia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP)

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