SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “Deixa ele jogar comigo. Logo depois você o verá morto. Cuide do seu filho ou eu vou fazê-lo se matar”, foi a mensagem que a cirurgiã-dentista Camille Vanini, 36, recebeu do perfil que estava conversando com seu filho de 10 anos. Era o “Homem Pateta”.
Desde meados de junho, a Polícia Civil começou a emitir alertas sobre perfis em redes sociais identificados como Jonatan Galindo, mas com fotos que remetem ao personagem da Disney. As contas seriam usadas para enviar jogos e brincadeiras a crianças, com incentivos à mutilação e ao suicídio.
A família brasiliense pode ser uma das primeiras vítimas do crime virtual no Brasil. A troca de mensagens foi na madrugada de segunda-feira (29). O garoto, que não tem rede social, viu pelo celular de Camille notícias sobre o tal “Homem Pateta”. Então, foi atrás de perfis do tipo e acabou sendo respondido por um, em inglês. Por já ter vivido no exterior, ele fala o idioma.
No diálogo, a pessoa por trás da conta falsa dava 10 minutos para que as respostas fossem enviadas e exigia que o menino seguisse na conversa. Ele, no entanto, acabou dormindo e, no dia seguinte pela manhã, a dentista viu a conversa.
“Confesso que não fazia ideia do que era o ‘homem pateta’. Minha primeira reação foi pedir desculpas. Afirmei que o meu filho estava com o celular e que ele não deveria incomodar as pessoas. O problema foi quando ele disse que eu ia ver meu filho morto”, diz Camille sobre a ameaça.
“Eu me tremia de uma ponta a outra. Trabalho em causas sociais para crianças e nunca imaginei que isso estaria acontecendo dentro da minha casa”, conta.
O menino explicou que sua intenção era prender a tal figura, para que ele não pudesse ferir outras crianças. Agora, não dorme à noite e a mãe precisou buscar ajuda psicológica para ele.
“A gente não sabe até que ponto isso é virtual ou é real. Meu filho está com medo”, diz Camille, que denunciou a conta no Instagram, mas recebeu como resposta que o perfil não violava as regras de conduta da rede social.
“Tive expectativa de que fosse tirado do ar, mas não aconteceu. Empresas como o Instagram precisam tomar atitutes em relação a esses psicopatas. Assim como ele falou com o meu filho, e dei sorte de perceber rápido, ele pode estar falando com outras crianças”, afirma.
Uma pesquisa rápida no Facebook e no Instagram revela dezenas de perfis com o nome Jonatan Galindo e a imagem macabra em referência ao personagem da Disney -algumas têm conteúdo em português.
Camille registro um boletim de ocorrência na Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente (DPCA). Ela também fez uma queixa-crime no Ministério Público.
No Brasil, induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou a praticar automutilação é crime e pode gerar uma pena de 6 meses a 6 anos de prisão.
Há dúvidas ainda sobre os primeiros relatos de uma conta do tipo. Até agora, se sabe que as postagens teriam começado em 2017, na Europa ou no México, em espanhol.
“Este perfil faz o desafio para que o interessado envie uma mensagem privada e, em resposta, passa a enviar vídeos, textos, áudios e até a fazer ligação por vídeo ao vivo. Essas mensagens causam desconforto, medo, terror e podem até induzir ao suicídio”, explica a delegada de Polícia Civil Fernanda Lima.
Não é a primeira vez que ameaças do tipo ligam o alerta dos pais. Elas têm padrão semelhante: são espécies de “correntes” sem fonte conhecida, focadas em crianças e adolescentes, e que se multiplicam em vários fakes, que imitariam as ações do suposto agressor.
Em 2017, foi o desafio da “Baleia Azul”, surgido em uma rede social russa, que viralizou entre jovens e foi associado a uma onda de suicídios de crianças e adolescentes.
Por aqui, o jogo era no WhatsApp. Os chamados “administradores” propunham uma série de desafios que envolviam automutilação e atos de violência, com o suicídio sendo a fase final –ameaças à família e entes queridos eram feitas para forçar a realização das tarefas no tempo determinado.
Já no ano passado, a Boneca Momo voltou a assombrar famílias. Supostamente, a imagem perturbadora aparecia em vídeos do Youtube Kids ensinando crianças a se matar. A Folha buscou a tal figura por dois dias na rede, mas não encontrou. Pelo mundo, houve relatos de conteúdos que incitavam à automutilação até armadilhas para roubar dados pessoais e financeiros.
Procurados, o Instagram e o Facebook não responderam até esta publicação sobre porque não tiram as páginas do ar.