Não é novidade que a pandemia do coronavírus mudou o jeito de nos relacionarmos com o próximo. Por se tratar de uma doença com alto poder de contágio, o isolamento social tem sido a principal estratégia de governo para o controle da contaminação comunitária. Recentemente, o Governo do Acre, pela Resolução nº 03 de julho de 2020, autorizou o funcionamento de setores e atividades comerciais por nível de risco, mas a capital Rio Branco ainda segue na classificação vermelha de emergência.
Apesar do apelo midiático do #ficaemcasa, os surtos de contágio e a superlotação das UTIs ainda é uma realidade que parece não querer se distanciar. Inseguros com a saúde do eleitor e preocupados com uma possível abstenção nas urnas, os parlamentares aprovaram a PEC nº 18/20 que adia a eleições para 15 e 29 de novembro e altera outros marcos do calendário eleitoral.
Mas será que o adiamento das eleições será suficiente para permitir a realização de um processo eleitoral democrático na sua plenitude? O distanciamento social pode prejudicar determinados candidatos? Para respondermos essas questões devemos primeiro entender o que seria “processo eleitoral democrático”.
Por processo eleitoral, podemos definir como o procedimento de escolha de determinados indivíduos para exercer o poder soberano concedido pelo povo através do voto. Nesse sentido, para que o processo eleitoral seja classificado como democrático, é necessário que haja igualdade de condições entre os candidatos. A igualdade de tratamento entre os candidatos equilibra o processo de escolha e aumenta a participação popular, evitando-se que candidato A ou B se privilegie por ocupar espaço de poder ou por ter uma conta bancária mais salgada do que a do adversário.
Mas a preocupação com o contágio do coronavírus pode privilegiar candidatos que buscam a reeleição, ou candidatos do perfil de celebridade virtual. Isso porque, para atender aos protocolos sanitários, os partidos políticos e os candidatos investirão mais na propaganda eleitoral veiculada pela internet. Aquela propaganda eleitoral “face to face”, olho no olho, com um sorriso maroto e aquele abraço apertado, dificilmente estará no script.
A lei eleitoral já estabelece um calendário reduzido de propaganda eleitoral. E neste ano começará apenas a partir do dia 27 de setembro até o dia que antecede as eleições, 14 de novembro. No contexto da pandemia, ficará cada vez mais difícil fazer propaganda eleitoral presencial. E quem perde com tudo isso? Os neófitos na política, pois na dúvida: Em que eu vou votar? Vota-se naquele em que a memória não abandonar.
Aqueles que buscam se eleger pela primeira vez terão que, cada vez mais, ser criativos para produzir conteúdo digital e chamar atenção do eleitor pelas redes sociais. Sem dúvidas, a ausência de atos de campanha presencial pode tornar desigual a disputa eleitoral, e prejudicar a competitividade democrática pelo sufrágio do povo.
Alguns podem dizer que a busca por um processo eleitoral democrático é romântica e utópica, pois a história tem constantemente privilegiado o capital e a familiocracia. Mas eu ainda prefiro acreditar em contos de fada do que em histórias de terror.
Kaio Marcellus
Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/AC
Mestre em Direito pela UnB
Advogado e Professor
Autor de diversas obras jurídicas