Por trás do rosto inchado pelos 250ml de silicone industrial aplicados em pontos da face existe uma história como a de muitos travestis e transexuais no Brasil. O drama de Juju Oliveira, gaúcha de Passo Fundo, não está somente no fato de ter virado chacota e ganhado o apelido de Fofão por causa das bochechas parecidas com as do personagem famosos dos anos 80. Desde os 14 anos, ela combate o preconceito, que começou na própria casa.
Dona de uma personalidade forte, ela conseguiu que seu apelo fosse atendido por médicos que se disponibilizaram a ajudá-la na reversão do procedimento que fez no rosto. “Eu só queria uma harmonização e fiz isso. Tive minha culpa também por confiar numa pessoa que fugiu sem deixar pistas, um nome e um endereço. Se eu soubesse quem é de verdade, eu mesma teria denunciado”, diz: “Agora, os médicos me disseram que podem me ajudar a retirar o produto do rosto. Se vou voltar a ser a mesma de antes, não garantem”.
Os seguidores de Juju queriam organizar para ela uma vaquinha. Mas ela recusou. “Não quero dinheiro. quero ajuda. Nunca fiz vídeo para querer dinheiro de alguém. mas para pedir respeito e que as pessoas entendessem minha tristeza e meu incômodo”, justifica.
Expulsa de casa
Ao manifestar os primeiros sinais de que não se enxergava num corpo masculino, Juju diz que foi totalmente incompreendida. Filha do meio entre duas irmãs, a gaúcha de 30 anos foi expulsa de casa pelos pais. “99% dos travestis que estão nas ruas foram expulsos pelas famílias. Aos 14 anos tive que ir para a rua. Só encontrei lugar numa boate, que me acolheu, me dando um lugar para dormir e um prato de comida. Ali fui ficando e comecei a me prostituir”, recorda, mencionando uma prática criminosa de aliciamento de menores: “Hoje em dia, tudo é mais controlado. Mas naquela época, quanto mais novas, melhor para eles. Uma mina de dinheiro. Mas o que podemos fazer? Eu precisava de um teto, um chuveiro para tomar banho, ter o que comer”.
Hoje, Juju mora na casa do pai, que a aceitou de volta. “Depois de alguns anos, eles entenderam tudo e me aceitaram. Hoje estamos bem. Na época eles não entendiam o que estava acontecendo, era tudo muito novo. Tinham medo de que eu fosse sofrer. Eu entendo a preocupação da família”, garante ela que, porém, não largou as ruas. “Embora depois do procedimento tenha ficado mais difícil conseguir meu sustento. Antes eu fazia por dia nove programas, agora, no máximo três. Iso porque tem clientes que não me olham como uma aberração, com preconceito. Sabem que estou inchada. Mas a maior parte não quer saber”.
A hora da verdade
Juju diz que não vê a hora de se livrar do silicone que percorreu seu rosto e desceu para o pescoço. Ela se preocupa com a estética, mas antes de tudo com a saúde, já que não sabe o que a substância causou em seu organismo. Após fazer um vídeo pedindo ajuda e apelando para a empatia das pessoas que debocham dela, a transex ganhou a solidariedade das redes sociais. Mas ela não se engana. “Infelizmente no país que a gente vive, com a homofobia que existe, acho muito difícil atingir o coração das pessoas. Eu posso provar que este não foi apenas um pedido de respeito. Isso é uma demonstração de preconceito puro. Porque além de passar pelo preconceito de ser transexual, por ser travesti, ainda sou alvo do preconceito pela aparência. Por um erro meu. Por ter procurado uma pessoa sem qualificação para mexer no meu rosto”, avalia.
Juju diz que ela só espera se livrar do inchaço: “Não preciso nem ficar bonita. Pedi ao médico para tirar esse inchaço para que nunca mais eu seja chamada de Fofão. E não é pelo personagem, a comparação. Eu só quero viver de novo como uma pessoa normal. Mas digo, quanto mais batem nas minhas costas, mais eu sobrevivo”.