Mãe reencontra 4ª das 5 filhas que foram doadas pelo pai e luta para achar a caçula há 35 anos

Uma família de Rio das Ostras, no interior do Rio, vive uma história digna de novela. Marlene dos Santos, de 65 anos, vive uma busca dolorosa mas de muita esperança há 35 anos para tentar reunir as cinco filhas que foram doadas pelo ex-marido quando ainda eram crianças.

Após a separação do casal, Marlene precisou trabalhar em uma casa de família e não tinha condições de ficar com as crianças. Então, as meninas ficaram com o pai.

O pai das meninas, Manoel Pereira Gomes, sofria de alcoolismo e morreu após doá-las. Ele não deixava a mãe ter contato com as filhas até que ela descobriu que nenhuma estava mais com o ex.

Marlene já conseguiu encontrar quatro das filhas e ainda tem esperança de reencontrar a filha caçula, Queli Cristina Santos Gomes, que atualmente estaria com 39 anos.

Michele reencontrou a mãe e irmãs biológicas em maio deste ano, depois de 35 anos separadas, e matam as saudades com chamadas de vídeo — Foto: Arquivo pessoal

“Eu tenho muita esperança de encontrar a minha filha. Já encontrei uma com a graça de Deus e agora tô esperando muito ansiosa chegar a outra. Não sei por onde anda, mas sei que Deus tá cuidando dela pra mim. Eu sei que ela vai aparecer”, disse dona Marlene.

A filha mais recente a reencontrar a família foi Michele. Ela mora em Nova Iguaçu e pode dar seu primeiro abraço na mãe e nas irmãs biológicas, depois de tantos anos, em maio deste ano.

“Eu fiquei muito feliz que depois de 35 anos ter encontrado minha filha. Agora tenho esperança de encontrar a outra pra eu tirar essa angústia de dentro de mim dia e noite no meu coração. [Quero] ver elas juntas pra aliviar meu coração”, contou Marlene emocionada.

Agora, por conta da pandemia, elas estão cada uma em sua casa e matam a saudade por chamadas de vídeo.

Michele ficou sabendo da história da própria infância depois que viu uma matéria do G1 publicada em 2015 que contava a busca incansável da mãe pelas duas filhas mais novas que ainda faltavam ser encontradas.

“Desde pequena eu sabia que tinha sido adotada. A minha tia, irmã da minha mãe adotiva, que me pegou pra criar e sempre deixou bem claro. Ela fez de tudo por mim, mas na época não podia me registrar porque não era casada. Ela me passou pra irmã dela, que hoje em dia é minha mãe. Minha mãe já tinha uma filha pequena e correu atrás pra me registrar. Como era muita burocracia, porque não tinha certidão, não tinha nada, ela foi pra Paraíba e conseguiu”, contou Michele.

Michele disse ainda que a história que ela sabia sobre a doação dela era diferente da realidade.

Em 2015, Marlene (de vermelho) ao lado das três filhas e do genro segurando carta com pedido de ajuda para reencontrar Michele e Queli — Foto: Arquivo Pessoal

“Minha tia me contava que minha mãe [biológica] abandonou eu e minhas irmãs em uma casa com nosso avô ou avó e tinha ido embora com um cara de moto. Eu tinha raiva e não queria procurar porque minha mãe tinha dado a gente. Mas toda noite eu orava e pedia pelas minhas irmãs. Eu só lembrava delas, da minha mãe eu não tinha muita memória. Mas com o passar do tempo a raiva foi passando”, disse.

Depois de tantos, o que fez Michele buscar novamente a família foi justamente uma novela que fala sobre a busca de uma mãe para tentar reencontrar o filho que foi tirado dela ainda criança.

Em Amor de Mãe, que estava em exibição na Rede Globo antes da paralisação das atividades devido à pandemia, a personagem Lurdes, vivida por Regina Casé, vive na esperança de reencontrar o filho, interpretado por Chay Suede.

“Eu cheguei da faculdade, em casa à noite, e coloquei a novela pra ver com minhas filhas e do nada me deu um estalo. Eu já tinha feito isso outras vezes mas nunca como fiz da última vez. Pesquisei na internet mais ou menos a minha história: lugar onde foi, em São João de Meriti, no salão e tudo. Aí vi a história que tinha aparecido no G1. Fiquei meio nervosa porque batia o nome, batia o tempo, batia tudo. Mas depois eu achei que não tinha nada a ver e que ninguém parecia comigo e deixei pra lá”, relembrou.

Ela contou que salvou a reportagem e, depois de um tempo, tentou contato com o telefone que estava disponibilizado. O número era do cunhado dela, Maurício, marido da irmã mais velha.

“Fiquei olhando, lendo a história de novo. Tentei ligar e desligava, nervosa. Eu contei pro meu namorado porque ele já sabia e ele pegou o número, ligou e fez contato com o Maurício. Foi onde tudo começou”.

Única foto que família tem de Queli Cristina, ainda criança, que hoje deve estar com 39 anos — Foto: Maurício da Mota/Arquivo pessoal

A separação das caçulas

Durante toda a busca, Marlene acreditava que Michele e Queli Cristina Santos Gomes tinham sido deixadas com uma família em um salão de beleza em São João de Meriti, mas Michele conta que elas foram criadas por famílias diferentes e desde pequenas também foram separadas.

As caçulas foram praticamente

arrancadas dos braços da irmã mais velha, Neidimar, na época com 11 anos. Neidimar já morava com outra família e lembra do último momento que viu as irmãs.

Além da lembrança de Neidimar, sobraram apenas uma foto e a segunda via da Certidão de Nascimento de Queli Cristina.

A filha mais velha conta que a família que a criou intermediou o contato entre o pai dela e outras famílias que não podiam ter filhos.

“Eu não sei como foi a conversa com meu pai. Ele bebia muito. Eu não sei como foi, mas através do meu pai eles conseguiram pegar a Queli e a Michele. Nisso, a gente foi pra São João de Meriti onde tinha um salão montado”, contou.

“No salão, chegaram duas mulheres e tiraram minhas irmãs do meu colo, eu era criança mas lembro muito disso. Minhas irmãs estavam chorando muito e as mulheres disseram que iam comprar doce pra elas. Eu fiquei ali esperando, achando que realmente iam voltar, mas elas não voltaram. Eu nem consegui me despedir”, disse emocionada.

Na adolescência, Neidimar se mudou para Minas Gerais com a família adotiva mas sempre teve a esperança de que conseguiria um dia reencontrar a família biológica. Ela conseguiu voltar para o Rio de Janeiro e encontrar a mãe depois de completar a maioridade.

Depois de serem tiradas do colo da irmã mais velha, Michele, na época com 4 anos, ficou com uma família e Queli, com 2 anos, acabou sendo deixada dentro de uma caixa debaixo de um viaduto em São João de Meriti.

“A gente não sabe se a Queli ficou com o mesmo nome. Eu sei que o ex-marido da minha tia, voltando do trabalho, viu uma menina em uma caixa debaixo do viaduto que parecia muito comigo. Minha tia perguntou porquê ele não pegou a criança que poderia ser a minha irmã. Quando ele voltou, um guarda que morava ali na área disse que ia levar a menina pra cuidar. O ex-marido da minha tia disse que ficou sabendo lá no meio do tumulto que tinha uma carta. Mas a gente não tem certeza se o guarda ficou com ela”, contou Michele.

A família acredita que a menina foi deixada junto com uma carta contando sua história e que isso pode ajudar Queli a tentar encontrar a mãe.

O genro de Marlene, Maurício, se empenhou em ajudar a esposa e a sogra a reunirem a família e conta que ainda tem esperanças de que um dia possam encontrar Queli.

“Esse ano tem sido muito difícil por causa da pandemia e muitas famílias não vão passar as datas comemorativas juntos, mas minha sogra esse ano vai ter algo a comemorar. Todo Dia das Mães, Natal, Ano Novo ela passa sonhando em reencontrar as filhas e agora ela vai ter mais uma filha perto dela. Esperamos que isso chegue até a Queli e ela possa procurar pela família igual a Michele”, disse Maurício.

O reencontro de Michele

Quando ainda buscava pelas caçulas, a família chegou a registrar o caso na polícia, que até investigou, mas não conseguiu encontrar o paradeiro das meninas.

A família também fez buscas nas redes sociais mas não sabia se as meninas ainda tinham os mesmos nomes. Michele foi criada com o mesmo nome, apenas o sobrenome tinha mudado.

Após fazer contato com o cunhado em abril deste ano, Michele e a mãe fizeram um exame de DNA e foi comprovado que ela era, de fato, uma das filhas perdidas de Marlene. O resultado do exame saiu na semana seguinte, no dia 4 de maio.

“Fiquei sabendo por e-mail e liguei pra minha mãe e irmãs. Elas estavam indo buscar o exame, mas eu contei o resultado e foi uma festa! Na semana seguinte eu fui pra lá pra encontrar todo mundo”, disse Michele feliz em relembrar o momento.

“Antes do resultado, nós fizemos um grupo e trocávamos muitas mensagens. Temos tantas coisas em comum que não tinha como falar que não somos irmãs”, brincou Michele.

A família disponibilizou um número de telefone para quem tiver informações que possam levar à Queli Cristina: (22) 99913-9808.

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