Enquanto os consumidores se assustam com os preços do arroz no supermercado e o presidente Jair Bolsonaro anuncia medidas para facilitar importação do grão, a responsabilidade do governo nessa situação é alvo de debate. Enquanto alguns economistas defendem que o Executivo teria pouco a fazer para evitar o problema — que seria causado especialmente pela redução da produção interna e pelo aumento das exportações, impulsionadas pela alta do dólar —, outros afirmam que o governo errou ao manter baixo o estoque público de arroz, que funciona como um regulador dos preços.
A armazenagem de alimentos é uma política pública que funciona como uma espécie de poupança. Quando o preço dos produtos aumenta, o governo tem a opção de vender parte da própria reserva para aumentar a oferta e, como consequência, gerar uma redução do preço. É similar ao que o Banco Central faz para conter a alta do dólar em momentos específicos da economia.
No caso do arroz, nos dois anos do governo do presidente Jair Bolsonaro, os estoques geridos pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) atingiram os níveis mais baixos pelo menos desde 2013. Neste ano, de janeiro a agosto, foram estocados 21,5 mil de toneladas, 500 toneladas a menos do que a quantidade armazenada no mesmo período de 2019. Para se ter uma ideia, nos primeiros oito meses de 2014, eram 568,3 mil toneladas. E, em 2013, era mais de 1 milhão de toneladas.
“Não é verdade que o aumento de preços está ligado a um maior consumo (no mercado interno) de arroz durante a pandemia. O problema é que, com o dólar em alta, e com o aumento da exportação, o governo precisaria ter os estoques reguladores abastecidos para intervir. Sem isso, existe pouca coisa que ele possa fazer”, diz o economista e assessor do Senado Federal Bruno Moretti.
Preços são difíceis de prever
Com uma opinião diferente, o economista e professor da Universidade de Brasília (UnB) Roberto de Góes Ellery Júnior acredita que os estoques públicos não necessariamente resolveriam o problema enfrentado pelos brasileiros atualmente com o arroz. “Como todo seguro, é uma política que tem um custo e é algo que você não sabe quando ou se vai precisar usar”, afirma. De acordo com ele, o preço dos alimentos varia de acordo com muitos fatores, difíceis de prever. “Ano passado, era a carne. Há uns anos, era o tomate. Difícil saber qual vai ser o alimento da vez”, complementa.
Na avaliação de Ellery Júnior, embora alguns governos mantenham esses estoques em alta, é difícil prever quanto seria preciso para arrefecer a demanda atual por arroz. “Esse tipo de demanda que fazem de governo, às vezes sai pela culatra. Eu não considero que essa formação de estoque seria essencial nesse movimento atual. Alguns produtores internacionais dificultaram a exportação, mas também não creio que essa seria uma boa solução”, considera.
O professor acredita que a melhor saída é a redução de tarifas de importação, já anunciada pelo governo. “Tem pouca coisa que o governo possa fazer e uma delas é facilitar a importação de arroz. Essa medida ele já tomou. O produtor está vendendo o produto dele. Preço é isso mesmo, a população pode tentar se adaptar”, opina.
Para Bruno Moretti, no entanto, há no atual governo uma crença de liberdade exacerbada ao mercado. “As gestões que vêm desde 2016 em âmbito federal estão inclinadas a entender que as leis de mercado resolvem tudo. E isso tem um custo.” Segundo o economista, o orçamento do Ministério da Agricultura para formar esses estoques reguladores vêm diminuindo. “O que se sacrifica em função das medidas para reduzir os gastos públicos é a segurança alimentar da população”.