‘A Bolívia recuperou a democracia’, diz Luis Arce, que promete governo de união

Apontado pelas pesquisas de boca de urna como presidente eleito da Bolívia, Luis Arce, de 57 anos, comemorou a vitória no primeiro turno, dizendo que o país “recuperou a democracia” e prometendo um governo de união. Embora a apuração oficial deva levar alguns dias, a vitória do candidato apoiado pelo ex-presidente Evo Morales (2006-2019) foi reconhecida pelo governo interino do país e pelo seu principal adversário na disputa, Carlos Mesa.

— Vamos governar para todos os bolivianos, vamos construir um governo de unidade nacional, vamos construir a unidade de nosso país — disse Arce, ex-ministro da Economia de Morales, numa breve entrevista coletiva, ao lado de seu candidato à Vice-Presidência, David Choquehuanca. — Vamos reconduzir nosso processo de mudança, sem ódio, aprendendo e superando nossos erros.

Pelo Twitter, Arce voltou a comemorar na manhã desta segunda-feira (19):

“[Estamos] muito agradecidos pelo apoio e pela confiança do povo boliviano. Recuperamos a democracia e retomaremos a estabilidade e a paz social. Unidos, com dignidade e soberania”, disse.

De acordo com a pesquisa de boca de urna apurada pela Cesmori, a maior empresa de pesquisas do país, Arce, do Movimento ao Socialismo (MAS), obteve 52,4% dos votos, contra 31,5% dados ao ex-presidente Carlos Mesa, do centrista Comunidade Cidadã (CC).

Com 33,62% das atas computadas pela contagem oficial, Arce aparece com 41,40% dos votos, contra 37,50% de Mesa — o MAS, no entanto, tem uma forte base eleitoral concentrada nas áreas rurais, últimas a terem os votos computados devido à distância dos centros urbanos. Em terceiro, o líder regional de extrema direita Luis Fernando Camacho, que ainda não reconheceu a vitória do MAS e disse que vai esperar o resultado final para se posicionar oficialmente, aparece com 19,07%.

Pelas leis bolivianas, para vencer no primeiro turno o candidato precisa ter 50% dos votos mais um ou 40% e pelo menos dez pontos percentuais de vantagem sobre o segundo colocado. Se o resultado da boca de urna se confirmar, Arce terá obtido mais de cinco pontos do que obteve Morales nos resultados oficiais da eleição de 2019, que acabou anulada. Na época, o então presidente, que concorria a um quarto mandato, chegou a ser declarado vencedor com 47,07% dos votos, contra 36,51% de Mesa.

Foi a contestação pela oposição do resultado da eleição de 2019, com protestos maciços, que acabou levando à renúncia de Morales em 10 de novembro passado, em meio a um motim da polícia e depois de um ultimato dos militares. Na época, o relatório de uma auditoria encomendada pelo próprio governo Morales à Organização dos Estados Americanos (OEA) apontou possível fraude no pleito. O relatório, posteriormente, foi contestado por diferentes especialistas em estatísticas eleitorais.

Ainda de madrugada, logo após a divulgação da boca de urna, a presidente interina Jeanine Áñez, ferrenha opositora de Morales, reconheceu a vitória de Arce e o parabenizou, apaziguando especulações sobre a aceitação do resultado pelos adversários do MAS:

“Ainda não temos o resultado oficial, mas, pelos dados com os quais contamos, os senhor Arce e o senhor Choquehuanca (vice na chapa vitoriosa) ganharam a eleição. Felicito os ganhadores e peço que governem pensando na Bolívia e na democracia”, escreveu Áñez na rede.

Exilado na Argentina, o ex-presidente comemorou o resultado e disse que “cedo ou tarde” retornará ao país:

— Lucho (apelido de Arce) será nosso presidente. Ele devolvera a nossa pátria ao caminho do crescimento econômico — disse Morales que, em seu Twitter, parabenizou Arce e Choquehuanca e afirmou que a chapa irá “devolver a dignidade e a liberdade ao povo”.

O presidente argentino, Alberto Fernández, foi um dos primeiros mandatários regionais a parabenizar Arce pela vitória. Em sua conta do Twitter, o presidente disse que a “vitória do MAS na Bolívia não é apenas uma boa notícia para aqueles que defendem a democracia na América Latina. É, além disso, um ato de justiça diante da agressão que sofreu o povo boliviano”. O presidente venezuelano, Nicolás Maduro, se pronunciou ainda durante a madrugada, tuitando que o povo boliviano “derrotou com votos o golpe de Estado que deram em nosso irmão Evo”.

Os presidentes de Chile, Sebastián Piñera, e Peru, Martín Vizcarra, ambos de direita, também felicitaram Arce e o povo boliviano, assim como o governo de Donald Trump.

“Parabenizamos o presidente eleito da Bolívia, Luis Arce, e o vice-presidente eleito, David Choquehuanca. O presidente Trump e os Estados Unidos esperam trabalhar com o governo eleito boliviano nos interesses compartilhados dos nossos cidadãos”, disse em uma rede social o chefe da diplomacia americana para a América Latina, Michael Kozak.

Até às 19h desta segunda-feira, não houve manifestação do governo brasileiro. Procurado, o Itamaraty não respondeu se irá se pronunciar.

Pai do ‘milagre econômico’

Nascido em 1963 em La Paz e filho de uma família de professores, Arce é economista e foi ministro da Economia entre 2006 e 2019, se afastando por 18 meses entre 2017 e 2018 para tratar de um câncer renal. Formado pela Universidade Mayor de San Andrés, ele fez mestrado no Reino Unido e ministrou diversos cursos em universidades de prestígio, como Harvard e Columbia.

Defensor do fortalecimento do Estado e estudioso da macroeconomia, ele foi considerado o pai do chamado “milagre econômico” boliviano. Com perfil mais técnico que político, o então ministro deu início a um processo de “nacionalização” de empresas estratégicas privatizadas ou capitalizadas por governos anteriores, e implementou políticas de distribuição de renda e medidas de incentivo ao mercado interno.

Não foi à toa que a economia se converteu no grande trunfo eleitoral do futuro presidente, mesmo que seus adversários atribuíssem o sucesso de sua política econômica a condições favoráveis internacionais. No período, o PIB saltou de US$ 9,5 bilhões para US$ 40,8 bilhões e a pobreza caiu de 60% para 37% da população, segundo dados oficiais.

Arce foi escolhido candidato em janeiro, durante uma cúpula partidária em Buenos Aires. Boa parte de sua vida profissional, entre 1987 e 2006, foi trabalhando no Banco Central da Bolívia, onde ocupou diversos cargos. Além disso, o pai de três filhos foi professor de graduação e pós-graduação em universidades públicas e privadas do país. [Foto de capa: Ronaldo Schemidt/Reuters]

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