O estudo liderado por Emma Hodcrof, geneticista da Universidade de Basileia (Suíça), mostra como uma variante do coronavírus, identificada pelo acrônimo 20A.EU1, está se espalhando com a segunda onda da Covid-19 na Europa. Nos últimos dois meses, a nova cepa representou cerca de 90% das novas infecções na Espanha, por exempço, de acordo com a pesquisa realizada por sete pesquisadores com o apoio de instituições científicas do setor público suíço e espanhol.
A nova cepa é responsável por 40% a 70% dos novos casos na Suíça, Irlanda e Reino Unido em setembro. Também é prevalente na Noruega, Letônia, Holanda e França. Os cientistas não falaram sobre outros países europeus porque poucas sequências genéticas recentes estão disponíveis.
O estudo, que ainda não foi publicado em periódico revisado por pares, sugere que pessoas que voltaram de férias na Espanha desempenharam um papel fundamental na transmissão do vírus pela Europa. Essa é uma possibilidade que levanta indagações sobre se a segunda onda que está varrendo o continente poderia ter sido reduzida com uma melhor triagem em aeroportos e outros centros de transporte.
— A partir da disseminação da 20A.EU1, parece claro que as medidas (de prevenção contra o coronavírus) em vigor muitas vezes não eram suficientes para interromper a transmissão das variantes introduzidas neste verão — afirmou Emma Hodcroft.
Cada variante do vírus tem sua própria assinatura genética, por isso ela pode ser rastreada até o local de origem. As equipes científicas na Suíça e na Espanha estão examinando o comportamento da nova cepa para determinar se ela pode ser mais letal ou infecciosa do que outras. Mas nenhuma conclusão sobre o tema foi publicada no estudo.
Evolução natural
De acordo com o jornal britânico, Emma Hodcroft enfatizou que não há “nenhuma evidência de que a propagação (rápida) da variante se deva a uma mutação que aumente a transmissão ou impacte o resultado clínico”. Mas ressaltou que a 20A.EU1 era diferente de qualquer versão do Sars-Cov-2 que ela havia encontrado antes. Os cientistas observaram seis diferenças na nova cepa em relação às demais.
— Não vi nenhuma variante com esse tipo de dinâmica desde que comecei a observar sequências genômicas de coronavírus na Europa — disse Hodcroft ao Financial Times.
Os cientistas estão trabalhando com laboratórios de virologia para descobrir se a 20A.EU1 carrega uma mutação específica na proteína spike (espícula), que o vírus usa para entrar nas células humanas, capaz de alterar seu comportamento.
As mutações são mudanças nas “letras” do código genético do vírus, que podem se agrupar em novas variantes e cepas. Já havia sido identificada uma mutação no Sars-Cov-2, chamada D614G, que cientistas acreditam tornar o vírus mais infeccioso.
— Precisamos de mais estudos para encontrar mutações que atingiram alta frequência na população e, em seguida, fazer a engenharia reversa para ver se elas tornam o vírus mais transmissível — disse ao jornal britânico Joseph Fauver, epidemiologista genético da Universidade de Yale que não esteve envolvido na pesquisa.
Para Maurício Lacerda, professor da virologia da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, não há motivos para se preocupar com a descoberta:
— Isso não é nada mais do que a evolução natural de uma epidemia viral. Os vírus são os que mais sofrem mutações, principalmente os de RNA, como os coronavírus.
Para os especialistas, a falta ou a má implementação de medidas de controle provoca muito mais impacto na propagação do vírus do que a genética do microrganismo.
— A Europa está pagando um preço alto pela liberação das fronteiras durante o verão europeu. Nós do Brasil devemos aprender com a experiência da Europa, pois o nosso verão está chegando — alerta Lacerda.