Boto-cor-de-rosa ganha mais uma ano de sobrevida

Além da degradação ambiental, e da poluição, barragens para hidrelétricas, pesca incidental em redes, e outros, fizeram com que sua população diminuísse. Mais recentemente o boto passou a ser usado como isca para piracatinga. Esta é uma espécie de bagre necrófago de tamanho máximo de 40 cm, também chamado urubú-d’água, que depois é vendido com o nome fantasia de douradinha, no Brasil, e capaz, na Colômbia.

Segundo o site do governo do Amapá, “até 7 mil botos eram mortos por ano no Amazonas, usados como isca para a pesca da piracatinga, antes da moratória interministerial (2015)  até julho de 2020, pela Secretaria de Aquicultura e Pesca.”

A primeira moratória da pesca de piracatinga, 2015 – 2020

Em razão do excesso da caça ao boto-cor-de-rosa a partir de janeiro de 2015, ainda no governo Dilma, a pesca e a comercialização de piracatinga ficaram proibidas no território brasileiro durante cinco anos.

A moratória venceu com Bolsonaro no poder. Em primeiro julho de 2020 ela foi renovada por apenas mais um ano.

A pesca da piracatinga é grande ameaça ao boto-cor-de-rosa

A pesquisadora Vera Maria Ferreira da Silva, bióloga, mestre em Biologia de Água Doce e Pesca Interior e doutora em Mammalian Ecology and Reproduction pela Universidade de Cambridge (Inglaterra), contou que “a pesca da piracatinga teve seu início no alto Solimões, no final da década de 1990. Os primeiros registros no Brasil só foram feitos a partir de 2000.”

“Inicialmente, toda a produção da piracatinga era exportada para a Colômbia, para substituir outro bagre conhecido nesse país como capaz (Pimelodus grosskopfii), muito apreciado na culinária colombiana e que foi sobre-explorado, levando à sua extinção comercial.”

A pesquisadora explica que este tipo de pesca era pouco comum na Amazônia, mas a partir do decréscimo de outras espécies como pirarucu e o tambaqui, os caboclos passaram a pescá-lo.

imagem de carcaça de boto cor de rosa secando em casa de caboclo
Carcaça de golfinho do rio Amazonas, macho adulto, após uso como isca. Imagem de Verónica Iriarte.

“Pouco tempo depois do início dessa exploração, a piracatinga já estava sendo comercializada nos mercados e feiras de Manaus. E até mesmo em grandes redes de supermercados em outros Estados do Brasil, com o nome fantasia de ‘douradinha’”

A fraude do nome fantasia ‘douradinha’ em supermercados Brasil afora

“Estudos genéticos comprovaram as fraudes na denominação e na comercialização da piracatinga como “douradinha”. Enquanto isso,  “monitoramentos de longo prazo de botos revelavam que em algumas regiões da Amazônia as populações estavam sendo dizimadas.”

Finalmente, explica Vera Maria, “o governo da Colômbia, principal mercado da exportação da piracatinga pelo Brasil, proibiu indefinidamente a entrada desse peixe em seu território alegando alto teor de mercúrio na carne do pescado.”

Mas informa que a pescaria continua no Brasil, e alerta: “Essa pescaria certamente representa a maior exploração desse golfinho pelo homem desde a chegada dos europeus à Amazônia, colocando, pela primeira vez, a espécie em situação direta de ameaça para a sua conservação.”

Vera conta que a pesca incidental é um grande inimigo do boto-cor-de-rosa. Quando ele ronda as redes atrás de peixes ‘são mortos por armas de fogo, com peixes envenenados ou explosivos’.

Infelizmente, a Amazônia não é a única região do Brasil onde ainda matam peixes com bombas.

A nova moratória do Governo Bolsonaro, 2020 – 2021

Vera Maria também considera pouco apenas mais um ano de moratória. ” Os termos estabelecidos, com exceção do tempo de execução, que foi drasticamente reduzido, são similares aos da primeira moratória e propõem:

“I – avaliar os efeitos da moratória para a recuperação das espécies de botos (Inia geoffrensis e Sotalia fluviatilis) e jacarés (Caiman crocodilus e Melanosuchus niger);

II – identificar técnicas e métodos ou alternativas produtivas ambiental, econômico e socialmente viáveis e sustentáveis para o exercício e controle da atividade pesqueira da piracatinga (Calophysus macropterus).”

‘Tempo estabelecido é muito curto’

E conclui: “Certamente, o tempo estabelecido é muito curto para propostas tão ambiciosas, considerando a inexistência de projetos de pesquisas específicos, a definição dos atores e colaboradores. E, principalmente, a falta de apoio financeiro para o desenvolvimento dessas atividades e pesquisas.”

“Este ano de moratória servirá, principalmente, para o estabelecimento e a consolidação das metas e estratégias para os próximos. Se isso não acontecer e não conseguirmos definir as diretrizes, precisaremos de outra moratória para continuarmos discutindo os já conhecidos problemas da pesca da piracatinga e do uso dos botos e jacarés como isca.”

Processo evolutivo demorado

A pesquisadora explica que o processo evolutivo dos botos é longo. As fêmeas só atingem a maturidade sexual aos 10 anos. Só costumam ter um filhote por vez, e o período de gestação dura cerca de 12 meses.

Por estes motivos ela considera que a moratória de cinco anos foi curta. “Fica evidente que um ou cinco anos não é tempo suficiente para reposição de indivíduos em uma população cuja retirada foi maior e mais rápida do que a sua capacidade de reposição.”

Com isso temos dois peixes ameaçados. E você pode usar o poder de consumidor ao menos sobre um deles, evitando a compra de douradinha nos mercados.

Já sobre o boto-cor-de-rosa, prepare-se desde já para pressionar por uma moratória mais longa em 2021.

Imagem de abertura: Projeto Boto.

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