CNJ vai decidir se audiências de custódia podem ser feitas por meio virtual na pandemia

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) deve decidir nesta terça-feira (24) se as audiências de custódia poderão ser realizadas por videoconferência durante a pandemia do coronavírus. Em 31 de julho, o CNJ aprovou uma resolução que proíbe a realização de audiências de custódia virtuais.

A Associação dos Magistrados do Brasil (AMB) é contra a medida e pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a revogação dessa norma. Agora, tenta reverter a regra diretamente no CNJ.

Se a magistratura pressiona de um lado, de outro, entidades de defesa de minorias defendem a obrigatoriedade das audiências presenciais. Por lei, pessoas presas em flagrante têm o direito de se apresentar em até 24 horas perante um juiz, como medida para prevenir tortura.

Na sessão de terça-feira, será apresentada uma proposta de algumas audiências serem presenciais; com a possibilidade de realização de algumas por meio remoto, a depender de uma série de condições. Segundo integrantes do CNJ, a tendência é que seja liberada a possibilidade das audiências online.

Na manhã desta segunda-feira, 78 entidades enviaram ao presidente do CNJ, Luiz Fux, uma carta defendendo as sessões presenciais. Entre as entidades que subscrevem o pedido estão a Associação Nacional de Defensoras e Defensores Públicos (Anadep), a Associação de Juízes para a Democracia, os Mecanismos Estaduais e Nacional de Prevenção e Combate à Tortura, a Associação para a Prevenção da Tortura e a Pastoral Carcerária Nacional.

As entidades afirmam que “audiência de custódia por videoconferência não é audiência de custódia”. Isso porque o instrumento tem a finalidade de aferir a legalidade da prisão e sua necessidade de manutenção, bem como verificar a ocorrência de tortura e maus-tratos.

A carta assinada pelas 78 entidades cita uma pesquisa da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, que constatou que 77,4% das pessoas presas em flagrante e apresentadas nas audiências, de setembro de 2017 a setembro de 2019, se autodeclararam negras.

A mesma pesquisa mostrou que 38,3% dos presos (quase 4 a cada 10, em média) declararam ter sofrido tortura ou maus-tratos por ocasião da prisão. O texto informa que cerca de 80% das agressões foram contra pessoas negras.

“Isto demonstra estatisticamente que as forças de segurança não apenas levam à prisão mais frequentemente pessoas negras, mas também que dispensam a elas tratamento mais violento – e inconstitucional”, diz a carta.

O texto também informa que 80% das denúncias de tortura que a Defensoria Pública do Rio recebeu de agosto de 2018 a maio de 2019 foram por meio das audiências de custódia. Isso seria um indicativo da importância do instrumento.

Entenda o caso

A AMB pediu ao STF, no dia 4 de agosto deste ano, que o artigo da Resolução 329 do CNJ que proíbe os juízes de realizar audiências de custódia por vídeo seja declarado inconstitucional.

A entidade argumentou que a norma viola o Artigo 67 da Constituição ao estabelecer vedações para atos processuais que, segundo a AMB, só a lei poderia definir.

A AMB também afirmou que o estado de calamidade pública serviria para justificar a suspensão imediata da norma e liberar a realização das audiências de custódia por vídeo.

Por outro lado, entidades de defesa dos direitos humanos argumentam que a audiência de custódia deve ser presencial, em conformidade com o direito das pessoas presas se apresentarem a um juiz nas primeiras 24 horas da prisão. Trata-se de uma medida para prevenir tortura.

Além disso, a realização das audiências por vídeo possibilita que algumas pessoas presas sejam processadas sem nunca terem ficado diante de um juiz. Isso poderia abrir brecha para erros no processo.

As entidades ainda dizem que a eventual autorização para realizar as audiências de custódia por vídeo pode implicar na responsabilização internacional do Brasil. Isso porque fere a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que já se pronunciou contra o vídeo nestes casos. [Capa: ImagemABR]

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