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Governo autorizou requerimentos de mineração ilegal em terras indígenas da Amazônia

Por O GLOBO

A Agência Nacional de Mineração (ANM) aprovou pelo menos 58 requerimentos de pesquisa ou lavra de minério em terras indígenas da Amazônia, apesar de a atividade ser proibida. O dado é de um levantamento realizado pelo projeto Amazônia Minada, do InfoAmazonia, que considerou os requerimentos válidos no dia 10 de novembro.

De acordo com a análise, mais de 3 mil requerimentos minerários que estão sobrepostos a terras indígenas da região da Amazônia Legal tramitam no sistema da agência do governo. A equipe do projeto investigou por dois meses os dados para chegar aos 58 requerimentos que foram concedidos. Os estados com mais autorizações foram Mato Grosso, com 22, e Pará, com 21. O GLOBO entrou em contato com a Agência Nacional de Mineração (ANM), mas não obteve retorno até o momento.

O levantamento mostrou ainda que a empresa Anglo American Níquel recebeu a maior parte das permissões (27) para pesquisar cobre em áreas sobrepostas a terras indígenas dos dois estados. A TI Sawré Muybu (Pimental), no sudeste do Pará, na qual vive o povo Munduruku, foi o principal alvo.

A empresa informou, em nota, que desistiu de todos os requerimentos de pesquisa mineral localizados dentro das terras indígenas, mas que diversos desses pedidos ainda constam do cadastro da ANM. “Alguns requerimentos de pesquisa vigentes podem margear terras indígenas, apresentando blocos com pequenas interferências nesses territórios. Em casos assim, é papel da AMN demarcar esses blocos fora dos territórios indígenas.”

A Anglo American afirmou também que revisa periodicamente seu portfólio de requerimentos e não possui atualmente planos de exercer atividades minerárias em terras de povos indígenas no Brasil, e acrescentou que o pedido “tem como base dados geológicos disponíveis”.

Além de grandes mineradoras e cooperativas, a análise também encontrou donos de pedidos autorizados sem nenhuma ligação com o setor de mineração.

Impactos para os povos indígenas

Cláudio Maretti, vice-presidente da Comissão Mundial de Áreas Protegidas e ex-presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), destaca que os impactos da atividade mineradora para os povos indígenas são múltiplos.

— Existem danos aos direitos, porque é ilegal; impactos sociais, com aumento também da prostituição e doenças; e provável degradação da natureza, gerando consequências para as interações das comunidades tanto culturais quanto de sobrevivência, com possível impacto à caça e à pesca — afirma, e acrescenta: — Se a atividade for mal feita, ainda há o risco de contaminação dos rios pelo mercúrio, que afeta principalmente as populações que se alimentam dos peixes.

Maretti, que atuou na Amazônia por aproximadamente 15 anos, explica que a mineração em terras indígenas é ilegal perante a Constituição se não houver uma lei que a regule. Além disso, ela também prevê que as comunidades precisam ser ouvidas.

— Essa necessidade de autorização da comunidade está em vários meios, inclusive em convenções internacionais que o Brasil assina. Isso deve ser feito pelo consentimento livre, prévio e informado, ou pelo protocolo definido pela própria comunidade, quando existir — afirma.

Mineração em terras indígenas

Em novembro do ano passado, o Ministério Público Federal (MPF) apresentou oito ações com pedidos urgentes para que a Justiça Federal cancelasse processos minerários em 48 terras indígenas no Pará. Também foi pedido que a ANM indeferisse todos os processos nessas áreas e os que surgissem antes do cumprimento das exigências legais para a autorização da atividade. Em agosto deste ano, a Justiça Federal acatou o pedido do MPF.

“A Constituição e as leis estabelecem que qualquer medida administrativa que possa levar à autorização da atividade minerária nessas áreas só pode ser tomada depois que houver oitiva constitucional das comunidades sobre o decreto legislativo autorizador, autorização do Congresso Nacional, consulta prévia, livre e informada às comunidades relativa à autorização administrativa, e regulamentação legal”, informou o MPF, na época.

Tramita atualmente no Congresso Nacional um projeto de lei que prevê a regulamentação da mineração em terras indígenas no Brasil, o PL nº 191. De acordo com a Agência Senado, o projeto “define condições específicas em que poderá haver pesquisa e lavra de recursos minerais e de hidrocarbonetos (petróleo, gás natural) em terras indígenas, bem como o aproveitamento hídrico para geração de energia elétrica nessas áreas”. [Capa: Vinícius Mendonça/Ibama/via Agência Senado]

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