Com os assassinatos da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes prestes a completar mil dias, na terça-feira, novas pistas surgem na montagem do intrincado quebra-cabeças em que se transformou o caso. Uma das novas peças pode levar ao responsável pela clonagem do Cobalt usado na emboscada às vítimas. Os investigadores descobriram que Eduardo Almeida Nunes de Siqueira, morador da Muzema, favela dominada pela milícia, clonou um veículo do mesmo modelo, entre janeiro e fevereiro de 2018, portanto, próximo a março, quando o crime foi cometido. Coincidência ou não, o advogado Bruno Castro, que defende Siqueira, é o mesmo que atua para o sargento reformado da Polícia Militar Ronnie Lessa, acusado de executar Marielle e Anderson.
‘Absoluta coincidência’
Siqueira admitiu que já clonou vários veículos, inclusive um Cobalt, prata, ano 2014, semelhante ao carro usado pelos assassinos, em depoimento prestado à Delegacia de Homicídios (DH) da Capital, em 3 de julho de 2018. Entretanto, o assunto ficou esquecido nas milhares de páginas do processo. Ao revisitar as folhas iniciais do caso, o Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio teve sua atenção voltada para as informações prestadas pelo acusado e o fato de ele e Lessa terem o mesmo defensor.
Siqueira contou, à época, que foi preso na porta de casa, na Rua Engenheiro Souza Filho, principal via da Muzema, com um Polo cinza que teria adquirido de ladrões de carro no Morro do Borel, na Tijuca, por R$ 1 mil. Ele adulterou o chassi, mandou fazer placas novas e falsificou a numeração dos vidros. Os dados e as características do carro a ser clonado foram pesquisados na internet. Ele responde à Justiça por isso.
O Cobalt teria sido trocado por um Fiat Palio, numa negociação com um miliciano conhecido como Pepa, da área de Curicica. Ao ser perguntado pelos investigadores, em 2018, se o carro foi usado na morte de Marielle e Anderson, Siqueira respondeu “não saber informar”. Contudo, ao ver as imagens pela TV do Cobalt usado no crime, Siqueira disse que “viu grande semelhança com o veículo que esteve em suas mãos” e que, posteriormente, passou para uma pessoa de nome Rafael. Disse, no entanto, que não lembrava das placas do Cobalt que clonou. Siqueira está preso desde julho de 2018.
Procurado, Bruno Castro confirmou que defende Siqueira no caso.
— Sou advogado dele por absoluta coincidência da vida. Um amigo me indicou. Já imaginava que fariam essa ligação. Siqueira está sendo investigado porque não quis assumir a posição de clonador do Cobalt do Caso Marielle, como a polícia queria. Este depoimento foi forjado — afirmou, embora o depoimento tenha sido assinado por seu cliente.
Ex-vereador é suspeito
Além da nova pista, a polícia segue outras linhas de investigação. Uma delas é que a ordem para matar Marielle partiu do ex-bombeiro, ex-vereador e miliciano Cristiano Girão. O objetivo seria se vingar do deputado federal Marcelo Freixo (PSOL). Girão era um dos nomes da lista da CPI das Milícias, em 2008, presidida pelo parlamentar na Assembleia Legislativa. Marielle trabalhou durante anos com Freixo. O ex-vereador ficou preso até 2017, um ano antes do crime. Ele nega participação e, como álibi, disse à polícia que, no dia do assassinato, foi a uma churrascaria, na Barra, onde ficou até meia-noite.
O Gaeco também aguarda o julgamento de três recursos no Supremo Tribunal de Justiça (STF). O Google recorreu da decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que determinou o fornecimento de informações envolvendo o crime às autoridades fluminenses. Um dos pedidos diz respeito à entrega da lista de pessoas que pesquisaram na ferramenta de buscas o nome “Marielle Franco”, entre 10 e 14 de março de 2018. O MPRJ também quer que a empresa informe o trajeto do carro usado pelos assassinos em diferentes dias.