Por ÉPOCA
O sistema de saúde de Rondônia está em colapso. Não há leitos disponíveis para pacientes, e faltam médicos e enfermeiros para atender nas unidades de saúde. Especialistas apontam que o Estado vive o período mais difícil desde o início da pandemia e que não há previsão, ao menos por enquanto, de melhora no cenário.
Diante da atual situação, pacientes tiveram de ser transferidos para outros lugares, e o governo de Rondônia pediu ajuda ao Ministério da Saúde para conseguir médicos.
“É o período mais difícil (da pandemia). O sistema de saúde não havia colapsado antes”, explica o infectologista Juan Miguel Villalobos, pesquisador da Fiocruz Rondônia e professor da Universidade Federal de Rondônia. No último fim de semana, havia 42 pacientes à espera de um leito no Estado.
Para pesquisadores e profissionais de saúde ouvidos pela BBC News Brasil, o colapso em Rondônia se deve a alguns fatores: a baixa adesão ao isolamento social desde novembro de 2020, as dificuldades para contratar profissionais de saúde e um possível impacto de uma nova variante do coronavírus, detectada recentemente em Manaus (AM).
Em meio à atual situação do sistema de saúde, o Ministério Público estadual afirma ter encontrado indícios de que o governo de Rondônia divulgou indevidamente, entre dezembro e janeiro, leitos clínicos e de UTI que estavam inativos como se estivessem disponíveis com o objetivo de evitar a adoção de novas medidas de isolamento social.
O caso se tornou alvo de investigação oficial. O governo de Rondônia nega qualquer irregularidade nos dados divulgados sobre a ocupação de leitos.
Os casos e covid-19 passaram a crescer consideravelmente em Rondônia desde o fim do ano passado, segundo especialistas. Logo no início do ano, a situação no Estado passou a ser considerada preocupante por profissionais de saúde da região.
Até quarta-feira (27/01), Rondônia, que tem cerca de 1,7 milhão de habitantes, registrou 121 mil infecções pelo novo coronavírus e 2.167 mortes, segundo o Ministério da Saúde.
Há relatos sobre dificuldades para conseguir vagas em hospitais do Estado há, ao menos, duas semanas. Diante do preocupante aumento de casos, o governo de Rondônia decidiu reabrir leitos do hospital de campanha para receber pacientes infectados pelo novo coronavírus.
Segundo a Secretaria Estadual de Saúde, a unidade de campanha possui 24 leitos de UTI e três para a estabilização de pacientes, além de 71 leitos clínicos.
Em todo o Estado, há leitos que não estão em funcionamento por falta de profissionais de saúde, segundo a Secretaria de Saúde de Rondônia. Em nota à BBC News Brasil, a pasta relata que há, por exemplo, uma unidade com 30 leitos de UTI, “dos quais 25 estão ocupados e os outros estão montados e equipados”, mas inativos por “dificuldades para contratar médicos”.
Conforme a pasta, diversos profissionais de saúde foram convocados por meio de editais de chamamento para início imediato. Porém, segundo a secretaria, o número de médicos que se apresentaram foi insuficiente para suprir a atual demanda do Estado.
No último sábado (23/01), o governo de Rondônia pediu ajuda para transferir pacientes para outros lugares.
Desde segunda-feira (25/01), 13 pacientes foram transferidos para Curitiba (PR), nove para Porto Alegre (RS) e dois para Cuiabá (MT). Entre esses casos há pessoas em situações consideradas moderadas ou graves.
Diante do atual cenário de ocupação de 100% dos leitos de UTI e 79,8% dos clínicos (destinados a pacientes com menos gravidade) no Estado, há previsão de novas transferências de pacientes para outras unidades de saúde pelo país.
Para tentar atrair novos profissionais, o governo de Rondônia publicou, neste mês, uma norma que define uma gratificação de até R$ 5.000 por mês para médicos que atuarem em locais que atendam pacientes com a covid-19. Segundo a medida, assinada pelo governador do Estado, Marcos Rocha, a gratificação começa a partir de R$ 1.250 e aumenta conforme o nível de dificuldade de atendimento da unidade de saúde.
Em nota enviada à BBC News Brasil na quarta-feira (27/01), o Ministério da Saúde afirma que a Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde disponibilizou o banco de dados da pasta para que o Estado de Rondônia contrate médicos para atuarem no enfrentamento à pandemia. Desde segunda-feira, conforme a pasta, foram disponibilizados 59 médicos (38 intensivistas e 21 clínicos gerais) ao Estado, que devem ser contratados por gestores locais.
Presidente do Sindicato Médico de Rondônia, a cirurgiã plástica Flávia Lenzi aponta que muitos profissionais temem trabalhar para o Estado em razão de dificuldades após o fim do pico da pandemia no ano passado, entre maio e julho. “Na época, houve casos de profissionais contratados que foram demitidos antes do fim do contrato. Alguns até hoje não receberam suas verbas rescisórias”, diz a médica à BBC News Brasil.
Lenzi afirma também que outro problema que agrava a situação no Estado é a falta de médicos intensivistas. “Não existe médico especialista em UTI no mundo todo em quantidade suficiente para o atual cenário”, afirma.
Ela defende que sejam contratados médicos de outras áreas que possam ser orientados para trabalhar em Unidade de Terapia Intensiva. “Uma sugestão é chamar um médico que saiba clínica médica, intubar paciente, saiba mexer em um ventilador… E esse profissional trabalharia na UTI e todos os dias haveria um intensivista como tutor, que o orientaria, por meio da telemedicina, como lidar com cada um dos pacientes. Cada tutor ficaria responsável por até 10 pacientes”, diz.