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Danos neurológicos afetam infectados por Covid-19 e interferem até em atividades corriqueiras

Por O GLOBO

Abotoar uma camisa, segurar um copo, realizar uma conta, assistir a um filme. Para alguns infectados pelo coronavírus, tarefas diárias como estas se tornaram grandes desafios. Enquanto estudos vêm tentando mapear (e sanar) os danos cognitivos e motores que o Sars-Cov-2 pode causar, vários brasileiros tentam se adaptar a a este “novo normal” cheio de novos obstáculos.

É o caso do webdesigner Wladimir Neto, de 44 anos, que recebeu o diagnóstico de Covid-19 de forma inesperada. Passava da meia-noite de 5 de dezembro quando, no instante em que ia abrir uma cerveja, o abridor que segurava foi ao chão. Ao tentar pegá-lo, percebeu que havia perdido movimento e sensibilidade da mão esquerda e correu para um pronto-socorro de Salvador, onde mora, certo de que sofrera um AVC.

Passou por encaminhamentos neurológicos rotineiros e, em tempos de pandemia, foi testado para o coronavírus. Em poucas horas, passou da UTI neurológica para a UTI Covid.

— Eu estava infectado, mas não senti absolutamente nenhum sintoma da Covid — lembra Neto.

Neto tem feito fisioterapia quatro vezes por semana. Também está tomando um remédio para fortalecer os tendões. De dezembro até hoje, readquiriu apenas parte do movimento da mão esquerda, mas a expectativa é recuperar os movimentos em seis meses. O trabalho de webdesigner, com longas jornadas de mouse e teclado, está suspenso por enquanto.

— Chegou a ficar impossível vestir uma camisa, pegar algo no bolso ou um copo de água. Ainda não está 100%. Mas estou melhorando dia após dia — conta Neto.

‘Dá uma aflição’

Diferente de Neto, a técnica de segurança do trabalho Luiza Ribeiro Soares Pereira, de 39 anos, passou a apresentar distúrbios cognitivos após a luta contra a Covid-19. Desde meados de maio, quando foi diagnosticada, tem dificuldades de exercer tarefas simples. Tomar o remédio matinal para uma disfunção na tireoide, algo que faz há 15 anos, se tornou um problema: ou ela esquece dele ou acaba tomando duas vezes. Logicamente preocupada, precisou adotar uma estratégia para não prejudicar o tratamento.

— Precisei comprar um recipiente com divisão de dias para olhar se naquele dia já tomei, ou não. Já deixo todos os comprimidos separados — conta Luiza.

Os relatórios que estava acostumada a produzir no hospital em que trabalha também se tornaram complexos depois do coronavírus. Luiza demorava, em média, uma hora para finalizar um documento. Hoje, acaba levando cerca de um dia e meio. A dificuldade cognitiva, lembra, foi percebida quando uma colega perguntou a data do aniversário do seu filho Ryan, de 20 anos, e ela não soube responder.

— Foi quando comecei a prestar atenção em coisas que eu estava esquecendo e coisas que eu fazia em questão de horas e hoje não faço mais. No trabalho, são documentos de copiar ou colar, como pedidos de aposentadoria que só preciso lançar no sistema. Tem hora que o documento já está aberto e abro de novo. Ou fecho sem salvar. Se eu atendo um telefone, já me esqueço do que estava fazendo — lamenta Luiza. — Dá uma aflição, porque você nunca sabe se vai ficar assim, ou se vai voltar. Fiz um curso há poucos dias, até fiz anotações, mas se você me perguntar sobre o que era, eu nem sei dizer.

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