Perigos dos coágulos que a vacina da AstraZeneca pode causar

Após semanas de especulação sobre se a vacina da Oxford-AstraZeneca – que está sendo usada no Brasil – pode estar ligada a dezenas de casos de coágulos sanguíneos relatados na Europa, as autoridades europeias anunciaram que há, sim, uma possível ligação.

A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) não mudou sua orientação sobre o uso da vacina, sustentando que os benefícios gerais ainda superam os riscos, mas alguns países europeus estão restringindo o uso a pessoas mais velhas.

No mesmo dia, as autoridades do Reino Unido também confirmaram a ligação e enfatizaram que os benefícios da vacina AstraZeneca superavam o risco geral, mas adotaram uma ação diferente ao estimular que pessoas com menos de 30 anos recebessem vacinas diferentes, se disponíveis.

Os reguladores esclareceram algumas questões sobre o imunizante da AstraZeneca, mas também levantaram outras dúvidas. Aqui estão as respostas para algumas delas.

Quais são os riscos de tomar a vacina AstraZeneca?

A EMA concluiu na quarta-feira que a vacina causou uma combinação incomum de coágulos sanguíneos em dezenas de pessoas com contagens baixas de plaquetas. O órgão de saúde europeu analisou 62 casos de trombose do seio venoso cerebral (CVST), que são coágulos nos seios da face que drenam o sangue do cérebro, e 24 casos de trombose da veia esplâncnica, ou coagulação no abdômen. Foram estudadas apenas pessoas que receberam a injeção em 22 de março.

Desses casos escolhidos para estudo, 18 foram fatais em uma área onde cerca de 25 milhões de pessoas haviam recebido a vacina AstraZeneca naquele momento.

A EMA disse que esses eventos graves de coagulação sanguínea foram relatados a uma taxa de cerca de 1 em 100 mil. Sem dados de idade e sexo, não se sabe se o risco é maior ou menor para grupos específicos. A taxa geral também pode mudar para cima ou para baixo à medida que mais pessoas são vacinadas e mais dados aparecem.

No Reino Unido, houve relatos de 79 coágulos sanguíneos graves em pacientes com contagens baixas de plaquetas no sangue. Dezenove dessas pessoas morreram em 31 de março, disse a Agência Reguladora de Medicamentos e Produtos de Saúde (MHRA). Algumas dessas mortes podem já ter sido calculadas na análise anterior da EMA.

Geralmente, os casos de coagulação do sangue em pacientes com baixa contagem de plaquetas têm um risco geral de aproximadamente 1 em 250 mil, considerando que cerca de 20 milhões de pessoas receberam a vacina AstraZeneca no Reino Unido.

Outra informação relevante é que os coágulos parecem estar aparecendo em maior número em pessoas mais jovens e mulheres. Por isso, é possível que o risco seja maior nesse grupo, mas ainda não há conclusões certeiras.

Os coágulos são mais comuns nas mulheres?

O número de coágulos sanguíneos relatados é relativamente pequeno, e os dados sobre eles são limitados, por isso é difícil tirar qualquer conclusão sobre quem tem maior probabilidade de sofrer os efeitos colaterais.

A presidente do comitê de segurança da EMA, Sabine Straus, disse que, até agora, a maioria dos casos ocorreu entre mulheres com menos de 60 anos, mas advertiu que a agência não tinha dados suficientes com base em idade e sexo para ter certeza sobre qual o perfil de específico de risco.

A agência não pode ter certeza, por exemplo, se o maior caso de mulheres enfrentando esses eventos de coagulação pode estar acontecendo simplesmente porque mais mulheres estão sendo vacinadas. Mas a agência também não descartou a possibilidade de que elas corram maior risco.

Os reguladores do Reino Unido disseram algo semelhante. Dos 79 casos documentados, 51 eram de mulheres e 28 de homens. Porém, mais mulheres foram vacinadas. As autoridades não apresentaram dados na quarta-feira sobre o que acham que pode ser a incidência de coagulação nas mulheres.

Quando diz que os benefícios superam os riscos, a EMA analisa o quadro geral, agrupando todos, independentemente da idade ou do sexo.

Straus admitiu, quando questionada por jornalistas na quarta-feira, que a EMA não tinha dados para entender até que ponto os benefícios ainda poderiam superar os riscos para grupos específicos, como para mulheres ou grupos de pessoas jovens.

As mulheres são mais predispostas a certos eventos de coagulação, como CVST, do que os homens, portanto, uma questão para análise posterior é se as mulheres em particular estão experimentando esses eventos de coagulação com uma incidência maior do que o normal.

Pessoas mais jovens têm maior probabilidade de desenvolver esses coágulos?

As autoridades de saúde do Reino Unido têm dados mais claros sobre a idade do que sobre o sexo. Disseram, na quarta-feira (7/04) que houve uma incidência ligeiramente maior desses eventos de coagulação do sangue em adultos jovens em comparação com os mais velhos. E quando você considera que a Covid-19 tem menos probabilidade de afetar seriamente os jovens, em alguns cenários, os riscos realmente superam os benefícios.

É por isso que a Grã-Bretanha decidiu dar às pessoas com menos de 30 anos alternativas à vacina AstraZeneca.

Uma análise do Centro Winton para Comunicação de Riscos e Evidências da Universidade de Cambridge, compartilhada na entrevista coletiva do governo do Reino Unido, na quarta-feira (7/04), apontou que a vacina em questão oferece mais chances de causar danos graves em pessoas de 20 a 29 anos do que evitar que elas precisem de tratamento intensivo caso contraiam o vírus.

Aproximadamente, a cada três pessoas que a vacina ajuda a prevenir a necessidade de tratamento intensivo, outras quatro sofrerão danos graves com a injeção, mesmo em uma situação de baixa exposição ao vírus.

À medida que a exposição ao vírus aumenta, como acontecerá quando as restrições de circulação começaram a baixar, a situação se inverte. Pessoas nessa faixa etária têm duas vezes mais chances de se beneficiarem com a vacina quando a necessidade é evitar a cuidados intensivos do que de serem seriamente prejudicadas por ela. E em uma situação de alta exposição – digamos, se as coisas voltassem ao normal – esses benefícios seriam mais de seis vezes maiores do que esses riscos.

Os potenciais efeitos colaterais da coagulação sanguínea parecem se tornar menos prováveis ??em grupos de idade avançada, contrastando com os perigos crescentes do Covid-19 entre os idosos, de acordo com especialistas do Reino Unido.

Seus dados sugeriram que para aqueles na faixa dos 60 anos, 0,2 pessoa por 100 mil sofreria danos graves devido à vacina, cerca de 2 pessoas em um milhão.

Mas para cada um desses casos, haveria 70 pessoas na casa dos 60 anos admitidas em unidades de terapia intensiva (UTI) no mês passado, quando o risco de Covid-19 era relativamente baixo.

Durante o pico da segunda onda do Reino Unido, esse número chegou a cerca de 640 internações em UTI para cada pessoa na faixa dos 60 anos que sofre complicações com a vacina, de acordo com esses dados.

À medida que os bloqueios diminuem, a ameaça de complicações relacionadas à Covid provavelmente aumentará devido ao aumento da transmissão – enquanto a ameaça de efeitos colaterais de vacinas perigosas deve permanecer em nível baixo.

E se eu já tiver maior risco de coágulos sanguíneos?

Os coágulos sanguíneos são comuns, e uma parte significativa da população já está mais predisposta a desenvolvê-los como resultado de doenças subjacentes relacionadas a genética, estilo de vida ou uso de outros medicamentos.

Estudos estimam que algo entre 3% e 15% das pessoas na Europa têm Fator V de Leiden, uma doença genética transmitida por gerações que aumenta o risco de coágulos sanguíneos. Nos Estados Unidos, entre 5% e 8% das pessoas têm um dos vários fatores de risco genéticos, de acordo com os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC).

Mas os coágulos sanguíneos em questão, apontados como incomuns pelas autoridades de saúde, são graves e bem específicos, se formam ao redor do cérebro e do abdômen e estão acompanhados por contagens baixas de plaquetas sanguíneas.

Esta é uma combinação incomum, porque as plaquetas normalmente ajudam a coagulação do sangue do corpo de uma maneira boa para parar sangramentos, por exemplo. Normalmente, altas contagens de plaquetas e coagulação severa caminham juntas.

No Reino Unido, os reguladores disseram que, como precaução, as pessoas “de qualquer idade que apresentam maior risco de coágulos sanguíneos devido à sua condição médica” devem receber a vacina “apenas se os benefícios da proteção da infecção por Covid-19 superarem os riscos potenciais.”

É aconselhável, portanto, que as pessoas conversem com médico ou farmacêutico antes de tomar a vacina AstraZeneca se tiverem problemas de sangramento ou hematomas, ou se estiverem tomando medicamentos para afinar o sangue.

Se eu tomei a primeira dose, devo tomar a segunda?

A menos que você tenha experimentado coágulo sanguíneo após a sua primeira dose de vacina da AstraZeneca, você ainda deve tomar a segunda. É o que recomendam as autoridades do Reino Unido, com exceção de pessoas com doenças adjacentes que foram desaconselhadas pelos seus médicos.

“Qualquer pessoa que não tenha esses efeitos colaterais deve pedir sua segunda dose quando for chamada”, disse a MHRA.

A maioria dos casos de coagulação sanguínea ocorreu dentro de duas semanas após uma pessoa receber sua primeira dose, disse a EMA. No Reino Unido, até o momento, nenhum relato seguiu uma segunda dose, mas pode estar relacionado ao fato de que poucas segundas doses já foram administradas com relação às primeiras.

Ainda assim, ambas as agências afirmam que os benefícios da vacina superam em muito os riscos. Portanto, o conselho tem sido seguir em frente com a vacinação da AstraZeneca, a menos que seja dito o contrário pelo médico.

A EMA também alerta que ainda não há dados suficientes sobre a troca de vacinas para sua segunda dose. Alguns estudos em andamento estão investigando o efeito de tomar duas vacinas diferentes.

Como posso identificar um coágulo sanguíneo?

Os reguladores aconselharam que os pacientes sejam informados sobre os possíveis efeitos colaterais da vacina AstraZeneca, como fariam com quaisquer medicamentos ou vacinas que apresentem riscos potenciais.

É importante lembrar que os efeitos colaterais leves ou moderados são relativamente comuns nas horas e dias após tomar de qualquer uma das vacinas Covid-19 aprovadas.

Para as imunizações via AstraZeneca, isso pode incluir sensibilidade no local da injeção, fadiga, dores de cabeça, náuseas, calafrios ou uma sensação geral de mal-estar, diz a EMA. Um ou mais desses sintomas são muito comuns e eles afetam mais de uma em cada 10 pessoas, diz a MHRA.

É menos comum que os efeitos colaterais durem mais do que alguns dias e a EMA aconselha os pacientes a procurarem atendimento médico urgente se nas semanas após a vacinação apresentarem sintomas como falta de ar, dor no peito, inchaço nas pernas, dor persistente no estômago, sintomas neurológicos, como fortes dores de cabeça ou visão turva, ou pequenas manchas de sangue sob a pele. Eles podem ser sinais de um coágulo sanguíneo ou outra reação adversa.

A vacina ainda é segura?

Relatos de coágulos sanguíneos foram acrescentados às informações que os países têm sobre a vacina AstraZeneca, mas não mudaram a conclusão geral de que a injeção está salvando mais vidas do que colocando em risco.

Conforme mencionado, no Reino Unido, a taxa de pessoas que desenvolveram esses coágulos sanguíneos incomuns com baixa contagem de plaquetas é de aproximadamente 1 em 250 mil, ou 4 em um milhão.

“A combinação relatada de coágulos sanguíneos e plaquetas sanguíneas baixas é muito rara, e os benefícios gerais da vacina na prevenção de Covid-19 superam os riscos de efeitos colaterais”, concluiu a EMA.

É possível dizer ainda, que, diante das novas informações, a idade é um fator que vale a pena considerar. Porém, os mais jovens também podem querer considerar seu papel na transmissão do vírus para pessoas mais velhas, que têm maior risco de adoecer gravemente, na hora da vacinação.

Dados do mundo real mostram que a vacina está reduzindo hospitalizações e mortes por Covid-19. Uma análise da Public Health England estima que 6.100 mortes foram evitadas em pessoas com 70 anos ou mais na Inglaterra até o final de fevereiro, após as primeiras semanas de vacinação no Reino Unido.

E uma única dose da injeção reduziu o risco de hospitalização por Covid-19 em mais de 80% em pessoas com mais de 80 anos, e deu até 73% de proteção contra doenças sintomáticas, disse a Public Health England no mês passado.

(Texto traduzido. Leia o original, em inglês)

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