Desde antes da chacina contra a família Vidal, na madrugada de quarta-feira (9/6), Lázaro Barbosa de Sousa acumulava sete inquéritos policiais só no Distrito Federal. Ele é acusado de cometer quatro roubos em chácaras — o primeiro em 17 de maio; os quatro assassinatos no Incra 9; e um roubo seguido de estupro, em 26 de abril.
Raphael Seixas, delegado-chefe da 24ª Delegacia de Polícia (Setor O), está à frente das investigações de cinco crimes cometidos por Lázaro: os roubos e o assassinato da família Vidal. “Pode ser que surjam outros delitos”, avalia o investigador. Ele acrescenta que a invasão à chácara de parentes das vítimas da chacina, em 17 de maio, é apurada pela 19ª DP (P Norte). “O registro ocorreu aqui na 24ª, mas, depois de a foto do suspeito ser divulgada pela imprensa, uma vítima reconheceu, veio à delegacia para avisar, e a investigação foi transferida”, detalha.
A chefe da Delegacia de Atendimento à Mulher (Deam 2), Adriana Romana, cuida do inquérito sobre o roubo seguido de estupro, no Sol Nascente. “Temos provas objetivas de que ele é o autor. Quando cometeu o crime, não sabíamos, mas a confirmação veio na semana passada, por meio de identificação civil com impressões digitais”, explica. A vítima estava grávida, e o caso deve ser analisado separadamente dos demais na Justiça.
Os episódios de barbárie cometidos por onde Lázaro passou podem somar mais de 320 anos de pena. É o que calcula o advogado criminalista Alexandre Carvalho. Pelos delitos no DF, o acusado pode ser condenado por violação de domicílio, sequestro, quatro homicídios e por latrocínio — roubo seguido de morte —, a depender da investigação. “É preciso analisar se ele entrou para matar ou roubar. Se houve assassinato após assalto, a violação domiciliar é descartada, mas a pena começa a aumentar”, avalia.
O advogado lembra que o foragido só será julgado no tribunal do júri caso os crimes sejam considerados homicídios. “Vislumbro 320 anos de cadeia. Hoje, a pena pode ser cumprida por até 40 anos em reclusão. Depois disso, ele será solto”, destaca Alexandre.
A imposição de prazo máximo tem relação com o fato de o Brasil ser signatário do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, da Organização das Nações Unidas (ONU). “Na hora de aplicar a pena, o juiz observa se o crime é continuado (praticado em um período de 30 dias após outro) ou não. Se for o caso, ela aumenta”, diz o advogado.
Lázaro também pode ser condenado por tentativa de homicídio, depois de atirar contra um policial e acertá-lo de raspão no rosto, nessa terça-feira (15/6), perto de uma chácara em Edilândia (GO). No momento do tiroteio, ele fazia três pessoas reféns. O militar foi levado ao Hospital de Anápolis (GO) por um helicóptero do Corpo de Bombeiros, mas apresentava quadro estável.
Ocorrências na Bahia
Procurado por matar uma família inteira no Incra 9, em Ceilândia Norte, na quarta-feira (9/6), Lázaro espalhou terror por outras partes do país. Em 2007, aos 19 anos, ele foi preso no município de Barra do Mendes (BA), onde nasceu, após cometer um duplo homicídio. Dez dias depois, o acusado fugiu. Sem terem notícias do paradeiro dele, moradores da cidade ficaram preocupados com um possível retorno.
As vítimas do crime eram dois trabalhadores rurais. Depois de matá-los, Lázaro ficou foragido durante 15 dias, escondido em uma serra em Barra do Mendes. Ele só foi preso após se apresentar na delegacia do município. Desde que fugiu da cadeia, voltou ao status de procurado. “Não dispomos de mais informações relacionadas ao crime. Até o momento, as autoridades locais não registraram nenhuma ocorrência sobre o possível retorno de Lázaro à região”, informou a Polícia Civil da Bahia (PCBA) ao Correio.
A reportagem entrou em contato com moradores de Barra do Mendes que estavam na cidade em 2007. As testemunhas relatam uma situação de “pânico generalizado”. À época, as escolas suspenderam as aulas, e os mercados fechavam mais cedo, às 18h, para evitarem o risco de assaltos. Muitos habitantes preferiram ficar em casa enquanto a polícia fazia as buscas, e as ruas tornaram-se desertas até o dia em que o acusado reapareceu.
Os avós do fugitivo, que moravam na cidade baiana, morreram; já os pais dele mudaram-se para Girassol (GO) depois de se separarem, há cerca de duas décadas. O endereço mais recente de Lázaro, de acordo com a Justiça do Distrito Federal, é uma chácara em Águas Lindas (GO).
Angela Leite, 45, trabalha como pedagoga em Barra do Mendes e relata que, pelas notícias divulgadas em 2007, o modo de agir de Lázaro era semelhante ao de agora. “No depoimento (após o duplo homicídio), ele disse que se cansou de andar e que estava com os pés inchados. Ele ficou escondido na serra, no povoado onde morava, e, depois, desceu. Os policiais haviam passado a noite toda com lanternas procurando por ele”, detalha. Após os crimes recentes de Lázaro, Angela diz que um novo clima de tensão recaiu sobre a cidade. “O povo daqui está apavorado, com medo de ele voltar para a Bahia. Todo mundo fica assombrado.”
Adolescência
Descrito como uma pessoa quieta e pouco sociável pelos habitantes de Barra do Mendes ouvidos pela reportagem, Lázaro morava com a família em Melancia (BA), uma serra na zona rural, a 8 km do município onde nasceu e estudava. Ele frequentou a escola Necy Novais, que recebe alunos até o 5º ano do ensino fundamental — série máxima que completou.
O vice-diretor de uma escola pública em Barra do Mendes, que pediu para não ser identificado, conta que, quando adolescente, Lázaro não costumava sair de casa e ia à cidade só para estudar. “Ele circulava pouco por aqui à época da adolescência”, comenta. O educador confirma que o modo de agir do acusado era parecido com o de agora: “Em 2007, ele matou as pessoas e ficou foragido. Um dia, estava na roça de um; no dia seguinte, na de outro, onde tomava café. Até que se entregou à polícia”, detalha.
Após a notícia da chacina do Incra 9 chegar à região, os barra-mendenses confundiram as informações e ficaram com medo de Lázaro estar de volta à Bahia, segundo o entrevistado. “Algumas pessoas ficaram com medo, porque há um distrito a cerca de 70 km daqui que se chama Cocal. O receio geral é de que ele volte e faça o que tem feito por aí”, completa o vice-diretor.