Com diferenças no ensino das redes pública e privada, Enem fica mais desigual

A primeira metade da preparação para o Enem 2021, foi marcada por desigualdade no acesso às aulas presenciais entre redes públicas e privadas. As provas do exame estão marcadas para os dias 21 e 28 de novembro.

Em 2021, enquanto 18 redes estaduais tiveram até agora 100% das aulas de forma remota, todas as particulares já foram autorizadas a passar para algum formato híbrido, no qual pelo menos parte das atividades é feita dentro da escola. E apenas duas delas foram vetadas de aulas presenciais por mais de 50% dos dias letivos: Rio Grande do Norte (55%) e Bahia (53%).

O caso mais discrepante é em Alagoas. Lá, todos os 100 dias letivos — metade do ano escolar, até a última sexta — foram feitos de forma remota pela rede pública, e híbrido pela privada. São Paulo, por outro lado, manteve as duas redes autorizadas a funcionar presencialmente, com 35% de alunos em sala, o ano todo — no pico da pandemia, em março, suspendeu as aulas, mas antecipou o recesso escolar.

Pela primeira vez em 2021, as redes privadas de todos os estados estão há 30 dias sem interromper o ensino híbrido. Já as públicas, em geral, são vetadas por não garantirem condições ideais de infraestrutura para abrirem em segurança.

“O impacto dessa diferença vai ser enorme no Enem”, analisa Claudia Costin, diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educacionais da FGV.

Na avaliação de Ademar Batista Pereira, presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), é possível manter as escolas funcionando com protocolos rígidos:

“O país precisa controlar a pandemia, e cada escola precisa adotar medidas com disciplina. Aquelas que têm mais espaço, podem colocar mais alunos em sala. Mas as menores precisam restringir mais”.

Aluna do colégio Mopi, no Itanhangá, Zona Oeste do Rio, Giulia Kim, de 17 anos, já estuda no modelo híbrido desde setembro do ano passado, quando terminou o 2º ano do ensino médio. Em 2021, o modelo foi interrompido apenas quando o estado determinou a antecipação de um feriadão para conter o aumento de casos no RJ.

“Estudo na parte da manhã, de tarde e de noite e tenho aulas presenciais à tarde duas vezes na semana. Tento dormir cedo para render bastante no dia seguinte”, diz a jovem, que se prepara para seu primeiro Enem.

Na cidade do Rio, a prefeitura já liberou que escolas funcionem com apenas um metro de distanciamento entre as carteiras. Com isso, algumas já decidiram que, após as férias de julho, vão acabar com o rodízio e abrigar turmas inteiras.

Déficit acumulado

Enquanto isso, no Pará, Vitória Reis, de 18 anos, fez o 2º ano do ensino médio no ano passado de novembro a fevereiro em um colégio da rede estadual. Neste ano, desde março, todas as aulas são por WhatsApp.

“Estamos tendo muita dificuldade em realizar as atividades sem a presença do professor. Estudamos só pelo celular com os vídeos que eles mandam e os exercícios”, afirma a jovem, que também pretende fazer o Enem pela primeira vez neste ano.

Estudo do Instituto Unibanco e do Insper com base em pesquisas acadêmicas dos últimos dez anos descobriu que, mesmo em condições ideais, o ensino remoto consegue apenas 17% da aprendizagem esperada em Matemática e 38% de Linguagem.

“Mesmo só com aulas remotas, já há diferença entre públicas e privadas, pois estas têm muito mais recursos para aulas síncronas e cujos alunos têm mais acesso à internet e aos livros didáticos”, explica Costin. “E isso só piora com o ensino híbrido desigual neste momento”.

No entanto, diante do nível de transmissão da Covid no país, ainda há não consenso entre especialistas sobre a segurança para o retorno presencial, ainda que em rodízio. Só na última semana, o Brasil registrou marca inédita de mais de 100 mil novas infecções, e a média móvel de novos casos também atingiu o pico desde o início da pandemia, com 77.295 contaminados.

“O retorno às aulas no decorrer do segundo semestre é fundamental com todos os profissionais vacinados com duas doses”, afirma a pneumologista Patricia Canto Ribeiro, da Escola Nacional de Saúde Pública, da Fiocruz.

Até a última sexta-feira, 2,7 milhões de profissionais da educação já haviam tomado ao menos uma dose da vacina. Esse é o número previsto pelo Plano Nacional de Imunização de pessoas desse grupo. No entanto, mais de 74% foram vacinados em junho com a AstraZeneca, cuja segunda dose só é dada em três meses. Todo esse tempo longe da escola coloca em risco a inscrição do aluno no Enem e, em último caso, até a permanência do estudante na escola.

“A perspectiva de fazer um bom Enem segura o jovem matriculado. Essa distância dos professores gera um desengajamento nos alunos e leva à evasão”, afirma Costin.

Ajuda na rede

No vácuo das redes estaduais, surgem cursinhos pré-vestibulares gratuitos para pessoas em situação de vulnerabilidade que, funcionando apenas no formato on-line, conseguem acessar jovens do país inteiro.

Diferentemente das escolas que precisam atender um número muito grande de alunos, eles conseguem fazer um acompanhamento muito próximo dos estudantes.

“Não é uma utopia. No ano passado, dei aula em dois projetos desses e vi que, com um pouquinho de ajuda, eles conseguem.

Então, neste ano resolvi criar mais um”, conta Joanna Cataldo, de 26 anos, jornalista com experiência em correções de redação para o Enem que deu vida ao Cursinho Popular Pelo WhatsApp.

As aulas são feitas pelo celular para conseguir chegar aos estudantes que tenham pelo menos o mínimo de acesso à internet.

No entanto, os 15 professores voluntários, que já reuniram cerca de 70 alunos, conseguem fazer um simulado por mês e correções individuais de redações com os mesmos parâmetros do Enem. Além disso, o Cursinho Popular Pelo WhatsApp também reuniu psicólogos que atendem gratuitamente estudantes que desejam fazer terapia.

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Com diferenças no ensino das redes pública e privada, Enem fica mais desigual