19 de abril de 2024

No Dia do Cantor, talentos do AC contam sobre desafio :“A voz é o nosso instrumento”

“A vida sem a música seria um exílio”, dizia o filósofo Friedrich Nietzche. De fato, ele está certo nesta afirmativa. Nesta terça-feira (13), comemora-se o Dia do Cantor. Profissão regularizada através da Lei nº 3.857 de 22 de dezembro de 1960 da Ordem dos Músicos do Brasil, a arte de cantar tornou-se essencial para a cultura da sociedade. No Acre, a situação não é diferente. Visando ganhar destaque e reconhecimento, diversos talentos promovem seus respectivos trabalhos em festas, bares, restaurantes, festivais e até nas redes sociais, a fim de expandirem o trabalho e firmarem nome na música acreana.

Abigail se apresenta em solenidades desde o ensino médio / Foto: Arquivo pessoal

ABIGAIL SUNAMITA

A cantora Abigail Sunamita, de 21 anos, canta desde a infância. Com influências gospel, ela contou que desenvolveu o talento dentro da igreja e que começou a expandir os estilos musicais aos 16 anos, participando de festivais estudantis e militares, onde se consagrou campeã de ambos e que colaborou para que ela fosse cada vez mais notada na cidade.

A partir de então, ela começou a ser convidada para cantar em outros locais, e passou a se inspirar em músicos como Tim Maia, Gal Costa, Caetano Veloso, Maria Bethânia e alguns sambas populares, fazendo covers e resgatando músicas mais antigas para públicos relativamente grandes e de idade da faixa etária dos 30 anos para mais.

“Estou com cinco anos cantando música popular, e quem me incentivou neste ramo artístico foram alguns professores de escola e o produtor e integrante da banda Os Descordantes, Dito Bruzugu, que me disse que eu poderia expandir e conhecer novas coisas. Depois passei a ser convidada a participar de algumas solenidades tanto do município como do estado, e fui fazendo minha carreira de forma bem orgânica e espontânea”.

Duo acreano gravou um Extended Play (EP) que será lançado ainda em 2021 / Foto: Arquivo pessoal

ELLU

O duo local “Ellu” também seguiu trajetos similares. Elisa Cardoso trabalha em conjunto com Luma Gama desde 2019 e contou que começou cantando na igreja por influência do pai, que é pastor, e que, posteriormente, passou a se apresentar em eventos culturais das cidades e em saraus que aconteciam na Universidade Federal do Acre (Ufac).

Com trabalhos e estilo musical influenciados por artistas como Seu Jorge, Duda Beat, e bandas nortistas como Los Porongas e Os Descordantes, Elisa disse que precisaram se adaptar de forma massiva nas redes sociais para que elas não perdessem o público que tinham, e de continuarem cantando. “É absurdo o sentimento de se sentir conectado com alguém pelo simples fato de estar cantando uma canção, ou tocando um instrumento, ou fazendo qualquer tipo de arte”.

Luma também compartilha do mesmo sentimento. Ambas publicam reels, IGTV e stories interativos como uma forma de mostrar a arte e o trabalho delas. “A arte sempre foi uma grande paixão minha, e quando me vi como artista a sensação foi como se eu tivesse encontrado uma parte muito importante de mim mesma”, falou.

João Magás conta que suas referências vêm do samba e MPB / Foto: Arquivo pessoal

JOÃO MAGÁS

O cantor e compositor João Magás também começou cedo, aos 12 anos, acompanhando o pai nas rodas de samba, e aos 16 começou a compor. Mesmo com as dificuldades de ter um espaço pra poder apresentar o trabalho, além do fato de não poder aglomerar, ele conta que costuma se divulgar nas redes e em eventos onde faz uso de voz e violão. “Outro ponto também é poder migrar para um local onde tenha público para seu estilo musical, além da falta de apoio à classe artística”, destaca.

Rodolfo Minari conta que tem consciência de seu potencial curativo e de transformação pessoal na música / Foto: Arquivo pessoal

RODOLFO MINARI

O artista Rodolfo Minari, de 41 anos, também fincou seus passos na música desde cedo, quando começou a tocar Órgão na igreja. Com facilidade para compor, Rodolfo inovou no cenário rio-branquense ao criar um empreendimento chamado “Massemba”, com o objetivo de abrir espaço para que outros artistas locais pudessem expor suas artes. “Foram dezenas de shows realizados em poucos meses de funcionamento, de vários artistas. Só minhas foram mais de 30 apresentações, de 4 shows diferentes”, pontuou.

Minari foi um dos afetados pelos desdobramentos da pandemia. Desde então, o compositor propaga sua arte através de lives no Instagram, e também através de participações em outros festivais e com recursos advindos dos editais da lei emergencial de cultura. “Cerca de 15 atividades programadas foram suspensas, e já se vai mais de um ano praticamente sem nenhuma fonte de renda, o que só veio a ser amenizado com os editais da Lei Aldir Blanc, que permitiu sobrevida ao espaço, onde inclusive moram pessoas”, falou.

Dito passou mais de 1 ano parado devido à pandemia / Foto: Arquivo pessoal

DITO BRUZUGU

O cantor Dito Bruzugú, que começou cantando em karaokês no interior de São Paulo, construiu uma carreira de 10 anos com dois discos lançados, além de clipes e muitos shows com a banda “Os Descordantes”. O grupo, que atualmente está inativo, se reunirá no pós-pandemia para definir o futuro da banda.

Com a pandemia, Dito contou que passou 1 ano e 3 meses sem cantar presencialmente em lugar algum, o que acabou impactando financeiramente também. “Agora com a vacinação avançando, a gente fica na esperança de que as coisas voltem logo, logo”, diz.

LEI ALDIR BLANC

O duo Ellu também foi contemplado com os recursos da Lei Aldir Blanc, da Fundação Elias Mansour (FEM). Por conta disso, elas foram para Minas Gerais gravar um EP, que será lançado em outubro, e que foi produzido pelo padrinho musical delas, João Vasconcelos, com oito músicas que variam entre composições autorais e de outros compositores acreanos.

Esta lei, que homenageia o homônimo vítima de Covid-19, tem por objetivo destinar recursos à classe artística brasileira através da divisão de um recurso de R$3 bilhões aos estados, municípios e Distrito Federal, justamente para que as pessoas que trabalham com arte em geral e que foram duramente impactadas pela pandemia tenham suporte financeiro e consigam desenvolver suas habilidades dentro das limitações impostas pela Covid.

RECONHECIMENTO

Abigail destaca que uma das maiores dificuldades para quem atua neste ramo diz respeito ao reconhecimento e valorização do talento, e que não aceita qualquer coisa para expor a arte do canto. “O que eu percebo é que as pessoas não costumam valorizar os cantores com uma boa remuneração. Só para ter uma ideia, tem artista que canta em vários lugares em uma mesma noite para poder ter uma boa renda. O que atrapalha é a valorização, porque muitos não levam a sério o trabalho do músico, já vão falando coisas do tipo ‘ah, vão morrer de fome’, sendo que a voz é o nosso principal instrumento”.

Dito também pensa da mesma forma. O cantor disse também que o cachê de quem trabalha com música não aumenta há muito tempo. “Defasagem de cachê é um problema sério. Hoje em dia se paga a mesma coisa ou menos do que se pagava há uns 8 anos. É bem complicado isso. A pandemia quebrou muita gente, os bares estão com lotação de 50% (alguns desrespeitam bastante as regras) mas o que mais atrapalha creio que seja o cachê defasado”, pontua.

Elisa também segue a mesma linha de raciocínio, dando enfoque na falta de abertura dos acreanos às músicas regionais. “Uma queixa comum é referente ao acolhimento dos acreanos com seus artistas locais, e por muito tempo ficamos sem incentivo cultural, sem cena para atuar, mas vejo muita mudança acontecendo, e acredito que em breve teremos um cenário musical incrível e muito forte no Acre”, ressalta.

Luma complementa que muitas a indústria musical costuma focar apenas nos eixos Rio-São Paulo e limitam artistas regionais como tal. “Nosso maior esforço é para quebrar essa ideia e reafirmar que somos artistas acreanas e nem por isso deixamos de ser artistas brasileiras, fazemos música brasileira, vinda do meio da Amazônia, do estado do Acre e isso é motivo de orgulho”.

Rodolfo Minari, por sua vez, afirma que questões envolvendo alto custo de deslocamento e de compra de equipamentos e, principalmente, o fato de muitas pessoas acharem que ser músico não é uma profissão, são alguns dos fatos que mais atrapalham para quem quer viver de música. “Existe uma cultura de que a simples divulgação do nosso trabalho compensa o fazermos gratuitamente. Somos das poucas profissões que as pessoas pedem a todo tempo para trabalharmos sem contrapartida financeira. Na minha opinião, o que mais atrapalha um artista é precisar ter outra profissão para sobreviver”, diz.

CANTAR POR AMOR
Mesmo diante dos percalços que circundam a vida de quem investe tempo, dinheiro e dedicação na música, Rodrigo afirma que o amor pela criação é o que lhe move para fazer o que gosta. “No meu caso, também fiz uma promessa de me devotar à arte 14 anos, sem desistir. E, claro, a maior recompensa e incentivo é a reação espontânea de crianças e de pessoas, muitas sequer conhecidas, ao trabalho, e aos relatos que recebo”.

Abigail também compartilha do mesmo sentimento. “Para mim, ser cantora é o que me move e o que me deixa extasiada. Eu faço isso por prazer, por amor. Mesmo diante das dificuldades, a gente se mantém de pé levando para as pessoas o que a gente sabe fazer de melhor. Tem espaço de sobra para todo mundo, mesmo sem muita valorização”, diz.

Luma e Elisa não veem a hora de estar nos palcos como “Ellu”. “Sentimos muita falta de estar no palco, de partilhar essa sensação juntas e com o público e possivelmente tocar pessoas com a nossa arte, mas sigo ansiosa por esse reencontro”, falaram.

João Magás traz o mesmo sentimento de paixão pelo o que faz. “Cada composição que faço é uma parte do que eu vivi ou que eu tenha visto alguém viver, e poder eternizar esse momento através de uma canção é sensacional”, pontuou.

Dito finaliza dizendo que o ofício e o amor por ele, bem como a necessidade de ajudar no sustento da família faz com que ele execute seu talento com primazia. “A música me deu tudo o que tenho, e eu ainda quero conquistar mais”, comentou.

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