Foi apenas um sonho de verão, como escreveu Shakspeare, até porque aqui não é o país dele, mas uma terra em que boa parte da classe política pretende manter sob seu jugo, eternamente, como se fôssemos uma republiqueta de bananas. Quando se imagina que daremos alguns passos à frente, vem um caminhão sem freios, descendo ladeira abaixo, destruindo tudo que encontra pelo caminho. Foi o que ocorreu novamente na Câmara Federal, que aprovou a retrógrada volta das coligações partidárias nas eleições, para deputados federais, estaduais e vereadores.
Tudo como era antes, no quartel do Abrantes. Ou seja, não se elegerão os parlamentares que conseguirem mais votos da população, mas manteremos a excrescência de que candidatos praticamente desconhecidos, consigam assumir cadeiras nos três níveis dos parlamentos (Congresso, Assembleias Legislativas e Câmaras e Vereadores). Mantém-se os balcões de negócios com os nanicos vendendo seus espaços e, pior que tudo, acaba a cláusula de barreira, permitindo que qualquer um crie um partido e abra, ele próprio, seu balcão, para futuro faturamento. A ideia do Distritão, derrotada fragorosamente, já se imaginava que iria naufragar mesmo.
Principalmente os nanicos não iriam correr o risco de ficarem fora do poder, caso a população optasse em eleger apenas pessoas da sua região, conhecidas delas, de quem pudessem cobrar. Não se pode culpar apenas o PSOL, por ter feito o destaque que acabou com o Distritão e abriu a volta das coligações, do cociente eleitoral e outros atrasos que caracterizam as eleições, agora ainda sob suspeita, por causa das denúncias de invasão das urnas eletrônicas, ignoradas, infelizmente, pelo TSE e pelo parlamento. Mais de 420 deputados, a ampla maioria, votou por esse atraso. Aliás, atraso é uma boa palavra para caracterizar a essência do parlamento brasileiro.
A decisão de mudar as regras do jogo é contumaz no Congresso, mas jamais de olhos voltados para os grandes interesses nacionais, mas, sempre para agradar os próprios umbigos. Dessa vez a diferença é que a decisão foi surpreendente, porque o assunto em pauta era o Distritão. A criatividade dos parlamentares era imensa. Então, por um acordo de lideranças, surgiu a malandragem de, ao invés do projeto que estava na pauta, se reinventou a causa das coligações. Elas tinham sido extintas em outra minirreforma política, a de 2017.
Ou seja, as tais “reformas” não são para se colocar os olhos no futuro, mas sim, usufruir do que já era ruim no passado e, certamente, pode ainda ser piorado, como já se sabe que é comum acontecer neste Brasil. A aprovação na Câmara, felizmente, não é o último passo. Haverá ainda votação no Senado, onde, ao menos pelas conversas dos bastidores em Brasília, não há interesse na votação da aberração proposta na Câmara. Mas é o nosso Congresso. Dali pode sempre se esperar o pior, como, aliás, já se viu nessa semana, quando o caso das urnas foi derrotado. Lamentável!
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