O primeiro passo para a privatização da empresa de Correios e Telégrafos do país, uma das mais antigas instituições brasileiras, foi dado na tarde desta quinta-feira (05), com a aprovação, pela Câmara dos Deputados, do texto base que prevê, até junho de 2022, a completa transferência para a inciativa privada, através de leilão. Dos oito deputados da bancada do Acre, só três deputados (Perpétua Almeida, do PCdoB, Leo de Brito, do PT, e Jesus Sérgio, do PDT), votaram contra. O texto-base foi aprovado por 286 votos a favor, 173 contra e duas abstenções.
Os deputados ainda analisarão destaques, pedidos pontuais de mudança ao texto aprovado. Finalizada essa etapa, o projeto segue para análise dos senadores.
O relator da proposta é o deputado Gil Cutrin (Republicanos-MA), cujo parecer incluiu que a empresa que comprar os Correios terá exclusividade mínima de cinco anos sobre os serviços postais – ou seja, carta, cartão postal, telegrama e demais correspondências.
De acordo com o relator, a medida é necessária para que “não haja atropelos na política de transição do antigo para o novo modelo de serviços postais”. O contrato de concessão do serviço, a ser assinado após a privatização, poderá estipular um prazo superior a cinco anos.
O relator também incluiu em seu texto um dispositivo que prevê a estabilidade por 18 meses para funcionários da estatal após privatização da empresa. Eles só poderão ser demitidos neste período por justa causa.
A empresa que a comprar os Correios terá, ainda, que disponibilizar aos funcionários um Plano de Demissão Voluntária (PDV), com período de adesão de 180 dias a contar da privatização. Os funcionários que vierem a aderir ao PDV terão direito a indenização equivalente a 12 vezes a remuneração, manutenção do plano de saúde por 12 meses e plano de requalificação profissional.
O texto autoriza, ainda, a transferência dos empregados dos Correios para qualquer órgão da administração pública que solicitar o funcionário. No projeto da privatização Eletrobras, os parlamentares incluíram dispositivo similar, que foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro sob o argumento de inconstitucionalidade.
As medidas voltadas aos funcionários foram incluídas no texto para diminuir a resistência à privatização da estatal, considerada uma das “joias da coroa” do governo federal. Até maio, os Correios tinham 90.875 funcionários.
A privatização, no entanto, deverá ser judicializada. A Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap) afirma que o projeto é inconstitucional, além de trazer “graves riscos para os cidadãos e empresas brasileiras, que podem se ver mais à frente reféns de um modelo de serviço postal mais oneroso e menos presente que o atual”. A entidade recorreu ao STF (Supremo tribunal federal) com ação contra a medida. O caso está em análise. O procurador-geral da República, Augusto Aras, se manifestou no processo contra a privatização dos serviços postais e correio aéreo. O governo diz que não há inconstitucionalidade na privatização.
O Partido dos Trabalhadores (PT) também apresentou uma questão de ordem em plenário para interromper a tramitação, mas foi indeferida pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). “O projeto não tem nenhum vínculo com inconstitucionalidade. O projeto é constitucional e segue na tramitação”, declarou Lira, em sessão transmitida pela TV Câmara.
O projeto abre caminho para a privatização dos Correios ao criar um marco legal para o setor postal. O modelo escolhido pelo governo para a privatização e previsto no projeto foi a venda de 100% da estatal.
O leilão está previsto para o primeiro semestre de 2022. O governo chegou a cogitar dividir a empresa por regiões e tipos de serviço, mas desistiu, diante da inviabilidade econômica. Também desistiu de abrir capital e de manter participação na empresa privatizada.
O nome dos Correios privatizado terá de ser “Correios do Brasil”, conforme previsto no projeto aprovado. Já a prestação dos serviços postais será concedida à empresa que comprar os Correios. A concessão é necessária porque a prestação desse serviço é hoje um dever e monopólio da União, previsto na Constituição Federal.
A Constituição também prevê a universalização dos serviços postais – ou seja, a obrigação de entregar cartas a todo o país, dever que foi mantido para os Correios privatizado.
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que será transformada em Agência Nacional de Telecomunicações e Serviços Postais, será a responsável por regular e fiscalizar o setor postal (cartas, telegramas e demais correspondências).
O texto aprovado prevê ainda que, a cada cinco anos, o governo vai promover a revisão do escopo do serviço postal universal, com base em relatório do órgão regulador que vai verificar a essencialidade de cada atividade.
Sobre o preço do serviço postal, o relator incluiu no texto a previsão de uma “tarifa social” para atendimento dos usuários que não tenham condições econômicas de pagar pelo serviço de cartas e telegramas. Cutrim previu, ainda, que o reajuste das tarifas do serviço postal terá periodicidade e índice de reajuste previstos no contrato de concessão, podendo incluir “fator desconto”.
As tarifas estabelecidas podem levar em consideração o custo do serviço, a demanda e a renda dos usuários. Atualmente, há um preço único para as cartas. As tarifas serão reguladas pela Anatel, que também ficará responsável pelo estabelecimento de critérios de qualidade do serviço.
Cutrim vedou o fechamento das agências que garantam a prestação do serviço postal universal em áreas remotas do país. Já a entrega de encomendas, outra atividade desenvolvida pelos Correios, funcionará em regime privado. Com isso, a empresa que adquirir terá liberdade para definir preço e demais condições para o serviço de entrega de encomendas. Outras atividades que vierem a ser desempenhadas pelos Correios privatizados e que não tenham relação com o serviço postal também funcionarão sob o regime privado.