Fraternidade, voluntariado, amor ao próximo e senso de comunidade são algumas das ações que regem o instituto “Alma Pantaneira”. Todos os anos, desde 2011, em formato de expedição, voluntários levam a moradores isolados no Pantanal serviços médicos, odontológicos, veterinários e sociais. Em 2021, a ação teve saldos positivos:
- Mais de 1 mil km percorridos;
- + de 3 mil procedimentos realizados;
- Milhares de pessoas atendidas.
Neste ano, os 30 voluntários e 6 fuzileiros navais cruzaram o Pantanal de ponta a ponta. O início da expedição foi dado no dia 18 de novembro, na parte do bioma que fica em Mato Grosso. A largada se deu em Cuiabá. Depois de 12 dias, em 29 de novembro, os voluntários chegaram em Corumbá, no Pantanal sul-mato-grossense. Assista ao vídeo acima.
O diretor do instituto, Diogo Albaneze, lembra que a última expedição contou com voluntários de várias cidades de Mato Grosso do Sul e de outros cinco estados diferentes.
“Temos voluntários que vêm de vários estados. Vieram dois caminhões de São Paulo para ajudar na logística e gente do Brasil todo para ajudar no voluntariado. O Pantanal é muito carente de atendimentos básicos, com isso damos o acesso a alguns serviços para os pantaneiros mais isolados”, detalha Albaneze.
Por toda parte do Pantanal, principalmente nas mais isoladas
Entre os objetivos da expedição, levar fraternidade para pantaneiros que vivem em regiões mais isoladas é um dos principais.
Pela quinta vez na expedição, a voluntária e cirurgiã dentista Elisclay Helian Silva, que mora em Rio Verde de Mato Grosso (MS), compartilhou um pouco da experiência que teve com o g1. Para ela, fazer com que os serviços cheguem em locais distantes e inacessíveis é dar sentindo à profissão, e “até mesmo a vida”.
“O Pantanal está tão perto e isolado do mundo, é como se fosse um outro universo, não é só distante é inacessível. No Pantanal dependendo da época do ano é só de avião. A população do Pantanal é pantaneira, eles não saem dali. O bioma é a vida deles. Isso me chamou atenção”, diz Elisclay.
Outro voluntário da expedição foi o biólogo e fotógrafo Luiz Felipe Mendes, que produziu conteúdo audiovisual para a instituição e registrou cada passo durante os mais de 1 mil km percorridos. Mendes relata que já viu inúmeros paisagens diferentes no Pantanal: o com fogo, o exuberante e, mais recente, o bioma do homem pantaneiro.
“Conheci um Pantanal em chamas, conheci um Pantanal que aquelas belezas que eu estava acostumado a retratar elas não estavam lá, estavam sendo perdidas, queimadas. Agora, 60 dias depois que estive pela última vez, tive essa outra oportunidade de ir ao Pantanal, mas para retratar o homem pantaneiro, ele incluso nessa paisagem. Quando soube, fiquei encantado, porque nesse tempo todo que estou no Pantanal o foco sempre foi a natureza, mas dessa vez o foco era o homem pantaneiro, a saúde do homem pantaneiro”, detalha o biólogo e fotógrafo.
Como os voluntários acessam ambientes completamente isolados, pontes que passariam gado, dão espaço aos carros da caravana. O sol escaldante do Pantanal fez parte de cada dia no bioma. Entre as realizações pessoais, alguns perrengues foram registrados.
“O calor é insuportável. A mobilidade é feita toda de carro. Um dia em movimento e outro trabalhando. Às vezes atola, quebra um carro e atrasa tudo. Desta vez um carro quebrou e outro teve que ser puxado por boa parte do trajeto”, lembrou a cirurgiã dentista Elisclay.
A realidade de isolamento de alguns pantaneiros foi sentida na pele pelos voluntários. “Aquelas pessoas realmente estão isoladas, eles não conseguem ter acesso facilmente a médicos, a dentistas e principalmente levar animais ao veterinário, porque o animal faz parte da cultura do homem pantaneiro”, complementa Mendes.
A simplicidade da vida do homem pantaneiro chamou a atenção de Mendes, que participou da expedição pela primeira vez neste ano. “Vamos observar a simplicidade da vida do homem pantaneiro, o Pantanal é muito grande, saímos lá de Mato Grosso, atravessamos a região de Poconé, a região da Nhecolândia, até chegar a cidade de Corumbá. Tinha lugares que não tinha energia elétrica, era só gerador que desligava a noite, tinha lugar que tinha energia solar”.
Entre os contratempos, Elisclay, que utiliza um lenço durante os atendimentos, por causa do calor intenso, destacou um feito na expedição deste ano. A dentista realizou, pela primeira vez durante uma ação, a restauração, extração de dentes, fabricação e implantação de uma prótese dentária.
“Consegui produzir e implantar a prótese. Atendi o paciente, moldei, confecção e instalei. É uma satisfação enorme ver o seu trabalho sendo aplicado onde realmente precisa”, comenta.
Serviços fraternos
Percorrem quilômetros, chegam em um dos locais, montam acampamento, trabalham entre 12 horas por dia, dormem e no outro dia se repete – assim que o fotógrafo que acompanhou os trabalhos descreveu a expedição.
Mendes contou: “às vezes os dentistas ficavam até 22h, porque o lema dessa expedição foi ‘não deixar ninguém para trás, ninguém sem atendimento’. Então eu que estava vendo tudo de uma visão panorâmica, registrando de tudo um pouco, vi que existem pessoas que exercem a profissão por amor, que ajudam o próximo com o amor só de lembrar emociona”.
A cirurgiã dentista Elisclay amplia o significado do trabalho no campo. “O profissional faz o seu trabalho no dia a dia no automático e às vezes esquece o papel social. Esperamos o ano inteiro para isso. Dá significados para vida e profissão”.
Mesmo com inúmeros materiais, os dentistas enchem caminhonetes e carros com os equipamentos e vão em busca dos sorrisos dos pantaneiros. Nesta edição, Elisclay contou que um pecuarista que acompanhou a expedição doou um compressor para facilitar os trabalhos.
“Foram vários doutores, vieram dois de Belo Horizonte e outro do Rio de Janeiro. A parte odontológica é a que mais dá trabalho, a maior tralha, maior quantidade e temos problemas com compressores. Um dos pecuaristas que acompanhou doou um compressor novo para expedição, nos salvou”.
Como começou o projeto
O instituto “Alma Pantaneira” começou de um sonho. Diogo Albaneze relembrou do início da história com as expedições. O piloto de aeronaves e diretor do instituto cresceu no Pantanal, vendo o avô, que era médico, atender a comunidade pantaneira. Conforme foi crescendo, o sonho aumentou e se tornou realidade.
“Meu irmão é médico, sempre tivemos médicos na família, e fomos criados no Pantanal. Uma coisa que meu irmão sempre assistia era a assistência do meu avô ao povo pantaneiro. Meu avô ajudava muitas pessoas, foi um pantaneiro que ajudou muitos outros pantaneiros. Meu irmão captou isso para ele, tinha o sonho de levar o legado. Abraçamos a causa”, explica.
Atualmente, a expedição tem apoio da Marinha do Brasil, além de vários voluntários. Outros patrocinadores ajudam a viabilizar a viagem, bem como do financiamento feito pelos próprios voluntários.
“É um negócio que carrega um amor grande no peito. É o nosso povo, de onde fui criado. É primordial dar ajuda ao povo pantaneiro, proporcionar uma vida digna”, finaliza Diogo.