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Como é o cérebro das pessoas felizes?

Por EL PAÍS

Ilustração de María Hergueta

Há milênios a filosofia e a espiritualidade se ocupam desse terreno nebuloso que é a felicidade humana. Entretanto, foi preciso esperar até a era atual para que a neurociência fornecesse dados sobre o que acontece no cérebro das pessoas felizes. Alguns investigadores o chamam de “o quarteto da felicidade”: dopamina, oxitocina, serotonina e endorfina. Essas aliadas do bem-estar protagonizam El cerebro de la gente feliz (inédito no Brasil), um livro recente, fruto da colaboração entre a neurocientista Sara Teller e o escritor Ferran Cases, cuja história chama a atenção.

Afligido por ataques de pânico desde a adolescência, ele permaneceu vários anos trancado em sua casa, sofrendo inclusive paralisia corporal. Ao completar 20, decidiu explorar todas as possibilidades que tinha à mão: médicos, psicólogos, terapias alternativas, esporte, alimentação… Queria reunir o máximo de informação possível para se curar. Depois de vencer a ansiedade, neste livro ele examina, guiado por uma cientista, como obter o melhor de cada integrante desse quarteto que faz a trilha sonora da nossa felicidade.

As endorfinas mitigam a dor —são analgésicos naturais— e, ao estimularem os centros de prazer, são responsáveis por nossos momentos de bem-estar e inclusive de euforia. Segregamos endorfinas ao praticar exercício, mas também ao fazer atividades agradáveis, como dançar, rir ou nos ocuparmos de um hobby que nos apaixona.

A oxitocina, às vezes chamada de “hormônio do abraço”, permite que nos vinculemos a outras pessoas e desenvolvamos a confiança e o amor. Alguns investigadores a associam com o contato físico e inclusive com o orgasmo. A fórmula para aumentar os níveis deste hormônio: tocar, abraçar e beijar. Meditar de forma regular também parece favorecer sua produção.

A serotonina recebe por direito próprio o apelido de antidepressivo natural. Levando-se em conta que a maior concentração de serotonina está no intestino, frequentemente se subestima o impacto de uma dieta equilibrada. Outro fator importante é a exposição à luz natural.

A dopamina promove o prazer e o relaxamento, além de alimentar a motivação. Este neurotransmissor está muito presente nas pessoas felizes e participa de inúmeros processos cerebrais relacionados com a conduta e a aprendizagem. Para que esteja presente de forma generosa, é essencial dormir uma média de oito horas diárias. Praticar exercícios e comemorar feitos estimula sua produção.

Ferran Cases e Sara Teller explicam em seu livro que podemos obter um cérebro feliz com algumas destas chaves:

1. Viver em modo presente, em lugar de gastar energias se projetando para o passado ou o futuro. Isso incluiria administrar em tempo real o estresse e o medo, sem dramatizar nem nos curvarmos, aceitando que são emoções tão naturais quanto passageiras.

2. Praticar a resiliência, que é a arte de se sobrepor às dificuldades. Há quase dois milênios, Marco Aurélio já recomendava: “Aceite o que você pode controlar, e deixe de lado o que não pode controlar”. Alguns neurocientistas calculam que essa parte incontrolável é a genética (40%), enquanto o que se pode controlar é a neuroplástica (60%).

3. Experimente coisas novas. Um excesso de rotina nos leva a repetir as mesmas sensações e lembranças, o que desata a apatia, o desânimo e os pensamentos negativos recorrentes. Para sair dessa prisão mental, o melhor antídoto é procurar novas experiências que botem nossa neuroplasticidade para funcionar.

4. Ponha humor na sua vida. O prestigioso psicólogo Martin Seligman considera que o bom humor é um fator crucial das pessoas resilientes, além de um indicador da saúde mental. Rir e distanciar-se de nossos dramas cotidianos combate a rigidez mental, que faz disparar a ansiedade, pois aspira ao controle em um mundo caótico. Ao sorrir, mandamos através do nervo vago a mensagem ao cérebro de que tudo está bem, o que fará o quarteto da felicidade começar a tocar.

Francesc Miralles é escritor e jornalista especializado em psicologia.

‘Happy-go-lucky’

— Há pessoas que têm um jeito naturalmente otimista, como se tivessem nascido para ver o lado ensolarado da realidade. A cientista política e escritora Xenia Vives relata em seu livro ‘Tener suerte en la vida depende de ti’ que a cultura anglo-saxã conta com uma expressão para este tipo de pessoas: happy-go-lucky, algo como “a sorte vem para quem é feliz”.

— Pode-se mudar a polaridade, quando se leva muito tempo vivendo no lado sombrio? Segundo Vives, sim, já que se trata basicamente de uma escolha: cada pessoa define sua atitude perante a vida. Podemos ser heróis, protagonistas de nossa aventura, ou vítimas incapazes de fazer nada até sermos resgatadas.

 

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