O cronista esportivo acreano Manoel Façanha, 51 anos, é dono de um acervo milionário de imagens inéditas que retratam boa parte da história do esporte acreano. Com mais de 25 anos de carreira, o jornalista e historiador é um desses apaixonados pela profissão que exerce e até criou uma espécie de minimuseu no escritório da casa dele.
Em uma conversa longa e descontraída com o ge, Manoel Façanha contou detalhes de sua trajetória na crônica esportiva e elegeu as 10 fotografias preferidas, seja pela plasticidade e técnica envolvida, ou pela representatividade do momento.
O gosto pelo esporte surgiu quando ainda era criança. O primeiro contato pelo futebol foi por meio do rádio e álbuns de figurinhas.
– Com sete anos já escutava jogos de futebol. Com oito anos colecionava álbuns da Copa do Mundo de 78. O pessoal já me perguntava para onde os jogadores iam e isso foi ficando dentro de mim – lembra.
Na adolescência, o acreano passou a organizar eventos e competições amadoras ao lado de amigos. Manoel Façanha chegou a estagiar como chargista no jornal impresso Folha do Acre, mas a mãe dele não deixou que exercesse a função. Os estudos eram prioridades.
No início da década de 90, tornou-se diretor de esportes, cultura e lazer do Sindicato dos Bancários do Acre. O então presidente João Roberto Braña o incentivou a começar escrever página esportiva para o tabloide da entidade, chamado “Manifesto Bancário”.
– Eu já fazia história e lia bastante, isso facilitava – conta.
Manoel Façanha entrou definitivamente na crônica esportiva acreana em 1996, no jornal impresso O Rio Branco. Ele foi convidado pelo radialista e jornalista Raimundo Fernandes.
– Pra mim foi maravilhoso porque eu fazia esporte e tinha espaço pra fazer geral, tinha boa amizade com todos. O Narciso Mendes (proprietário), nunca ingeriu na minha página, sempre foi muito democrático. Tinha total liberdade para escrever o que eu queria – destaca.
O cronista esportivo acreano deixou o jornal impresso O Rio Branco em 2015 e atualmente trabalha no também jornal impresso Opinião. Ele também tem um site próprio de notícias esportivas.
Acervo milionário
Manoel Façanha tem um cômodo da casa dele dedicado exclusivamente a preservação de memórias do esporte acreano. As paredes são decoradas com jornais e quadros de clubes de futebol do Estado que marcaram épocas. É como uma viagem no tempo.
Com a modernidade dos equipamentos, Manoel Façanha trocou os antigos CDs e DVDs por armazenamentos em HDs. Contando todas as imagens – impressas e digitais –, são mais de 1 milhão de fotografias inéditas de diversas modalidades esportivas, mas boa parte de futebol.
As imagens são momentos tanto de competições oficiais como não oficiais. Também há registros de treinamentos de clubes de futebol e do cotidiano de outras modalidades como vôlei, handebol, basquete e atletismo, por exemplo.
Como escritor, o cronista esportivo tem quatro livros publicados, três deles em parceria com os jornalistas Augusto Diniz e Francisco Dandão. Manoel Façanha prepara mais um livro com 100 crônicas esportivas já publicadas. A obra está quase pronta e será lançada em 2022.
Manoel Façanha viu muita coisa mudar no esporte acreano ao longo do tempo, mas nem tudo foi positivo. O cronista esportivo conta que os dirigentes dos clubes de futebol precisam ser mais profissionais em suas respectivas gestões.
– Na década de 70 e 80 as personalidades da politica e empresários, quem tinha poder aquisitivo, se aproximavam muito dos clubes, davam suporte. As pessoas que tinha importância na sociedade acreana estavam muito presentes dentro dos clubes. Hoje em dia os empresários e políticos estão pouco presentes dentro dos clubes. Os políticos abrem as portas, principalmente aqueles que tem compromisso pelo esporte, conseguem abrir portas para investimentos. Futebol requer essa estrutura, da presença de políticos e empresários dentro dos clubes para buscar parceria, projetos positivos e botar em si dinheiro, porque o futebol não vive sem recurso – opina.
Veja o Top10 das fotos mais marcantes
1. Goleiro Weverton (2004-2019)
– Pela história de vida do Weverton. É um goleiro da periferia da nossa cidade, que cresceu no meio futebolístico, teve oportunidade, agarrou com unhas e dentes, e conseguiu prosperar. Mostra justamente isso. É uma montagem que até ele me solicitou essa foto, mostrando o início até à Seleção Brasileira que é o auge de qualquer profissional da bola.
– Essa foto talvez tenha sido a tarde/noite mais triste do futebol acreano, se levamos em conta as últimas décadas. O Rio Branco-AC entrava em campo na Série C de 2007, embalado por uma boa campanha. Dentro da Arena da Floresta era imbatível. O Rio Branco sempre conquistava bons resultados. O ABC era um time de qualidade e estava classificado para a próxima fase, veio para o Acre com o time praticamente misto ou reserva, e o torcedor se empolgou que naquela tarde teria tudo para fazer um resultado satisfatório e eliminar o Bahia, que jogava no mesmo dia. O Rio Branco começou em cima do time potiguar, quase consegue marcar os gols e, inclusive, teve o pênalti que o Testinha desperdiça. A bola bate na trave em uma infelicidade. Nesse jogo tínhamos mais de 16 mil pagantes, o maior público do futebol acreano, o jogo termina 0 a 0 e o Bahia faz um gol nos acréscimos e se classifica. O Rio Branco fica fora. Todo mundo fica com a sensação de “Maracanazo”, em referência a derrota do Brasil para o Uruguai na decisão da Copa do Mundo de 50.
– O presidente José Humberto tinha dificuldades de conseguir parceiros para tocar o clube e nesse momento de buscar recursos teve a ideia de vender parte do patrimônio do clube para uma igreja evangélica e aquilo não foi visto com bons olhos pelo torcedor, parte da diretoria, conselheiros e a imprensa também. Houve uma grande articulação no dia para se fazer uma manifestação pra chamar a atenção da sociedade do que estava sendo feito no Atlético-AC. Surtiu efeito positivo. A igreja evangélica que tinha comprado a terra e já estava construindo, desistiu de fazer e devolveu a terra.
– Eu passei por ela nesse dia e ela sorriu e eu disse: “Hoje vou pegar uma foto bacana sua”, disse mais ou menos isso e ela sorriu de novo. O jogo correndo e em certo momento tive a felicidade de pegar uma foto de forma estilosa, várias sequências e peguei ela tipo flutuando, levitando e a foto ficou bastante legal, bastante plástica. É valorizar e incentivar a presença mulher na arbitragem acreana.
– A foto ilustra vários aspectos. A Copa do Brasil, o torneio mais democrático do país e a oportunidade do futebol periférico, que nunca teve oportunidade em ir em um grande estádio de futebol, assistir um craque da atualidade. A foto tem o Cuca, considerado um dos melhores técnicos do país e o Botafogo. Era um treino recreativo e estavam batendo aquela bolinha. Era Botafogo e Rio Branco.
– Essa foto mistura vários aspectos e um dos aspectos era a amizade que tinha com o coordenador dessa competição que era o saudoso Hermano Filho, de Sena Madureira. Ele tinha uma grande sacada, era um político inteligente e fez essa competição para os ribeirinhos. Vinham times de várias localidades. Era uma grande festa, dois ou três dias de torneio até conhecer o campeão. Essa foto é uma decisão por pênaltis, o futebol raiz mesmo com o jogador descalço, no estilo mais força do que qualidade e a torcida atrás do gol vibrando. Era um espetáculo.
– Ela se preparava para Copa Amazônica de Natação e as Olimpíadas Colegiais. A foto tem uma beleza plástica, que e a questão das cores, água, a cor morena dela, a cor da piscina, a água transparente e o olhar dela. Um olhar quem está com rosto não dentro da agua, mas fora com a boca aberta. Tem a questão da plasticidade da foto.
– O que mais gostei é a plasticidade. O goleiro parece que está voando. Ele dá um salto tentado pegar a bola. Existe alguns elementos que caracterizam o goleiro, que é a luva. Um jogador de linha não vai dar um salto desses. Existe a questão da percepção, treinamento e elasticidade para dar um salto desse.
– É mostrar a paixão brasileira pelo futebol e à Seleção Brasileira. Essa paixão é de pai para filho. O pai beirando os 40 anos e o filho com menos de 10 anos de idade. Ambos bem vestidos pra participar da festa de uma partida da Copa do Mundo. Ao fundo existe à Seleção Brasileira e torcedores de Brasil e México. Era a solenidade de abertura.
– Ia jogar a escola acreana, acho que era Divina Providência de Xapuri, contra uma equipe paulista, que tinha jogadora que parecia o Falcão, a menina jogava muito. Esse jogo era preliminar, um jogo muito pegado, muito equilibrado entre Bahia e Rio de Janeiro. Essa é uma goleira baiana. O Rio de Janeiro estava pressionando para empatar o jogo e a goleira muito boa, tinha estilo. A jogadora mete o chute e ela encaixa a bola no ar, como uma performance de um goleiro de grande estilo. O grau de dificuldade pra homem já é difícil fazer uma pose dessa no ar, quanto mais para uma mulher.