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Do Seringal Redenção, às margens do Rio Tarauacá, para a eternidade: morre avó do deputado Jenilson Leite

Por TIÃO MAIA, PARA CONTILNET

Dona Maria Batista tinha 98 anos. Foto: Arquivo pessoal

A matriarca acreana Maria Batista Lopes, de 98 anos, mãe do ex-vereador e ex-vice-prefeito Chagas Batista e avó do deputado estadual Jenilson leite (PSB), pré-candidato ao governo do estado em 2022, será sepultada em Tarauacá nesta terça-feira (7). Ela faleceu na madrugada de ontem, após lutar pela sobrevivência durante vários dias. Era mãe de 11 filhos e deixou dezenas de netos e bisnetos.

Vários amigos lamentaram sua partida, entre eles o deputado estadual Edvaldo Magalhães (PCdoB), relembrando sua história, cuja vida se confundia com a evolução de Tarauacá de uma pequena Vila, a Seabra, para se tornar a terceira maior cidade do Acre.

Primeira de uma família de 11 filhos, do Maria nasceu no Seringal Redenção, que está localizado às margens do Rio Tarauacá. “Primeiro, para abrir os seringais, vieram dois irmãos do meu pai. Depois ele chegou, casou com minha mãe e foram morar no Seringal Atenas, propriedade comprada pelo meu avô e onde todos nós fomos criados”, contou dona Maria, em entrevista ao ContilNet, em 2020. Seus pais eram nordestinos, do Ceará.

Vários amigos lamentaram sua partida, entre eles o deputado estadual Edvaldo Magalhães (PCdoB). Foto: Arquivo pessoal

Na entrevista, como uma personagem que atravessou adversidades, ela falou da agudeza do sofrimento, com dificuldades até para aquisição de alimentos. “Os seringueiros que não trabalhavam direito passavam fome e alguns eram chicoteados pelos patrões”, declarou a mulher, que conheceu o lendário Pedro Biló, o comandante das chamadas “correrias”, que incluía a captura de índios para a escravidão no serviço braçal ao redor dos barracões, e as mulheres, para escravas sexuais. “No Seringal Universo, do seringalista Alto Furtado, era o local que judiavam muito com o povo. Amarravam, açoitavam e mandavam matar”, conta dona Maria, sem disfarçar a tristeza que tais lembranças lhe trazem.

Alguns anos depois, Dona Maria e o esposo vieram morar no Seringal Tamandaré, propriedade do hoje pecuarista conhecido por Rames Fernandes Eleamen, local onde teve 11 filhos, dos quais, pelo menos dois, estão deixando frutos na história e na política do Acre. Um, Francisco das Chagas Batista Lopes, o Chagas Batista, ex-vereador e ex-vice-prefeito de Tarauacá. E Nonata Batista Lopes, quem vem a ser mãe do deputado atual estadual Jensilson Leite (PSB).
“Mandamos as mulheres estudarem na cidade, o que causou descontentamento nos meninos. Quer saber, vamos vender tudo e levar todos para estudar”, disse Maria Batista.

Na cidade, a família se instalou na Rua Sansão Gomes, nas proximidades do Centro. Frágil e pequenina, aquela ex-seringueira se tornaria uma grande costureira, senão a maior de Tarauacá. “Fiz muitas roupas para madames e paletós para políticos, inclusive para o Nabor Júnior”, disse a ex-costureira, com seus olhos miúdos e memória gigantesca, referindo-se ao ex-senador e ex-governador, seu conterrâneo.

Primeira de uma família de 11 filhos, do Maria nasceu no Seringal Redenção, que está localizado às margens do Rio Tarauacá. Foto: Arquivo pessoal

Para quem conheceu a Vila Seabra e o Rio das Tronqueiras, o nome original do Tarauacá no dialeto indígena, de beleza exuberante e que acometia os seus visitantes de uma inominável paz espiritual, descrita por poetas e escritores como o lendário Leandro Tocantins, que produziu, inspirado por aquelas paisagens, o romance “O Rio Comanda a Vida”, hoje se assusta com o quem vem acontecendo por ali.

Talvez, por causa de sua posição hidrográfica e por ser cortada pela BR-364, e, principalmente, pela ausência de políticas públicas, o outrora vilarejo bucólico em que se poderia dormir com portas e janelas abertas e com seus moradores conversando nas calçadas e admirando a Lua, transformou-se numa espécie de sucursal do inferno, com assassinos brutais, crimes cometidos por membros de facções nos mesmos moldes, ou bem pior do que ocorre na Capital. Essa é, hoje, uma cidade em que dona Maria Batista, nascida e criada no lugar, já não suportava viver e resignava-se à permanecer no lugar porque, na sua idade, já não tem mesmo muitas opões.

Frágil e pequenina, aquela ex-seringueira se tornaria uma grande costureira, senão a maior de Tarauacá. Foto: Arquivo pessoal

“A pacata cidade já não é mais a mesma. As organizações criminosas impuseram o terror. A violência colossal ocupa a maior parte de nosso noticiário e a população está desprotegida. Todas as esferas do poder público precisam se unir para superarem essa situação sombria”, disse o neto ilustre de dona Maria Batista, o deputado Jenilson Leite (PSB), um dos representantes no município na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac).

Para o deputado, que também é médico, dona Maria Batista não era só a imagem de uma avó bondosa e exemplo de retidão e caráter na política. É, sobretudo, a imagem viva de tempos antigos em que viver era uma luta cotidiana contra as mais diversas vicissitudes. “Ela é uma guerreira verdadeira, uma prova de resistência do povo acreano”, definiu Jenilson Leite.

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